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Estado de Minas

Motivo de prisão de Tiradentes ainda é um dos pontos obscuros da Inconfidência

Ainda há muito a esclarecer sobre Tiradentes e os outros integrantes da Inconfidência Mineira, dizem pesquisadores Motivo de prisão do alferes é um dos


21/04/2019 06:00 - atualizado 21/04/2019 07:42

Marcos Paulo de Souza Miranda, integrante do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais (IHGMG), promotor de Justiça
Marcos Paulo de Souza Miranda, integrante do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais (IHGMG), promotor de Justiça (foto: Túlio Santos/EM/D.A Press - 27/5/17 )


A história de Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, (1746-1792) e dos demais integrantes da Inconfidência Mineira ainda é uma “obra aberta”, e os estudiosos concordam que há muito para ser pesquisado e descoberto sobre o movimento que chega aos 230 anos, com solenidade cívica hoje em Ouro Preto, na Região Central. Integrante do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais (IHGMG), o promotor de Justiça Marcos Paulo de Souza Miranda destaca um fato “ainda pouco esclarecido” referente à prisão de Tiradentes, na Vila de Bom Sucesso das Minas Novas do Fanado, hoje Minas Novas, no Vale do Jequitinhonha. “Pelo que se depreende dos Autos de Devassa”, informa Souza Miranda, “de fato Tiradentes esteve naquela localidade em data anterior a 1775 (quando ingressou na carreira militar), exercendo atividade de comerciante ambulante, ou mascate”.

Criada em 1729 e integrante da Comarca do Serro Frio, a Vila de Minas Novas era “uma das mais importantes povoações da região Nordeste de Minas e local estratégico, sobretudo sob a ótica comercial, pois estava na rota que fazia a ligação com a Capitania da Bahia”. Embora o senso comum não a vincule ao movimento da Inconfidência, “ali residiram personagens com notório envolvimento na conjura, a exemplo do tenente-coronel do Regimento de Cavalaria de Minas Novas, Domingos de Abreu Vieira; o capitão de Ordenança em Minas Novas, Vicente Vieira da Mota; o sargento-mor de Minas Novas, cartógrafo e estatístico José Joaquim da Rocha; o advogado formado em Coimbra, conhecido como o Doutor das Minas Novas, José Pereira Freire de Moura; o comerciante, cunhado do Dr. José Pereira e irmão do Padre Rolim, Alberto da Silva e Oliveira Rolim; e o alferes do Regimento de Cavalaria, amigo de Tiradentes e proprietário rural em Minas Novas, José Gomes Oliveira Meireles.

Em seu trabalho, Souza Miranda explica que todos são citados nas investigações “levadas a efeito pelo governo português, como se pode verificar nos Autos de Devassa da Inconfidência”. E lembra que Domingos de Abreu Vieira e Vicente Vieira da Mota foram condenados como inconfidentes e degredados para a África. E mais: “O número de pessoas ali envolvidas com o movimento insurrecto é tão expressivo que se pode afirmar que, em Minas Novas, estava uma das principais células de sustentação do movimento rebelde. De lá se esperava, tão logo estourada a sublevação, segundo se extrai dos Autos de Devassa, o envio de salitre para a fabricação de pólvora, bem como de centenas de homens armados para auxiliar a tomada do poder em Vila Rica.”

MOTIVOS DA PRISÃO 


Sobre a prisão de Tiradentes, Souza Miranda se vale dos depoimentos: “Com efeito, o escravo Alexandre, do padre José da Silva e Oliveira Rolim, ao ser ouvido na devassa em 23 de novembro de 1789, declarou que ‘sendo ele ainda cativo de Manuel Soares Cardoso, residente em Minas Novas, aí conheceu aquele Joaquim José (da Silva Xavier) ainda paisano, o qual vivia de sua agência’”.

Já Alberto da Silva e Oliveira Rolim, também ao ser ouvido como testemunha, afirmou que conhecia “o Alf. Joaquim José da Silva (Xavier), por alcunha o Tiradentes, que conheceu ainda do tempo em que andava mascateando por Minas Novas, ao qual desde antes de sentar praça não tornou a falar até agora. “Dessa forma, há provas nos Autos de Devassa sobre a presença de Joaquim José da Silva Xavier na Vila de Minas Novas em data anterior ao seu ingresso na carreira militar, ocasião em que ali vivia de mascatear. Segundo as informações, Tiradentes chegou a ser preso e teria deixado Minas Novas praticamente sem dinheiro”.

Mas qual teria sido o motivo da prisão? Para essa indagação, diz o integrante do IHGMG, não há esclarecimentos ou provas documentais nos Autos de Devassa. “Em obra publicada sobre a Inconfidência Mineira no final do século 19, Eduardo Machado de Castro, com base em narrativas populares, afirma que a prisão de Tiradentes em Minas Novas teria decorrido do fato de ele ter se compadecido de um pobre escravo que estava sendo barbaramente castigado por seu senhor, com quem Xavier teria entrado em luta corporal a fim de paralisar os atos de covardia. Por se meter em assuntos de propriedade alheia e ter ferido o agressor do negro, Tiradentes teria sido recolhido à cadeia local”.

Essa afirmação sem lastro documental, acrescenta Souza Miranda, vem sendo repetida pelos principais biógrafos de Tiradentes ao longo dos anos, inclusive sendo o suposto fato considerado como a primeira demonstração pública de rebeldia de Tiradentes contra o governo de Portugal.

O MOTIVO 

Oiliam José, em sua obra sobre o Alferes da Liberdade (alferes em um posto de comando), assim registra o fato: “De fato, foi no rude quotidiano das viagens que adquiriu ele a maior parte dos conhecimentos e inclinações que o singularizariam dali por diante, em não poucas ocasiões, e que fariam dele o conjurado de 1789. A ninguém é lícito, por exemplo, negar a influência decisiva que sobre ele e suas inclinações revolucionárias exerceu o incidente ocorrido na Vila de Nossa Senhora do Bom Sucesso de Minas Novas. O tropeiro atingira a Vila, onde, em senhorial prédio, residia o seu futuro compadre, o tenente-coronel Domingos de Abreu Vieira”. E mais: “Num dia de sua estada ali, encontrou um português possuidor de escravos chicoteando, barbaramente, um infeliz negro. Esse, amarrado e urrando de dor, pedia clemência. Não se conteve Joaquim José. Entrou em luta corporal com o opressor do negro ferido, fez escorrer sangue no malvado e acabou preso por um miliciano, recolhido a infecta prisão e despojado dos haveres que portava consigo. Libertado ao fim de alguns dias, passou a votar incontida ojeriza ao nome português e aos desmandos que muitos lusos praticavam nas Minas, por se julgarem senhores da terra e do povo que a habitava.”

Apesar da riqueza de detalhes quanto ao episódio, não se sabe, com certeza, qual teria sido o verdadeiro motivo da prisão de Tiradentes em Minas Novas, diz Souza Miranda. O historiador Alexandre Miranda Delgado, que se debruçou sobre o tema, registrou e teve a oportunidade de conversar com um integrante do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, que teria estado com o processo criminal de Tiradentes em mãos, na cidade de Minas Novas, e teria afirmado que Joaquim José foi preso em razão de “sedição e porte de armas”.

Teriam tais supostos fatos (sedição e porte de armas) conexão com a aventada agressão do escravo por seu senhor, registrada pela tradição oral como a causa da prisão de Tiradentes?, pergunta Souza Miranda. “Somente a localização e análise do processo, que, pelo que consta, encontra-se desaparecido há décadas, poderá desvendar esse episódio importante, mas ainda obscuro, da biografia de Joaquim José da Silva Xavier”, conclui o pesquisador.



"Tiradentes não gostava de covardia,
era um homem muito caridoso. Ainda muito jovem, trabalhando como tropeiro, foi preso em Minas Novas ao defender um escravo então barbaramente castigado por seu senhor”


.Marcos Paulo de Souza Miranda, integrante do Instituto Histórico
e Geográfico de Minas Gerais (IHGMG), promotor de Justiça

 

 

Detalhes da história
» Forca
O dia 21 de abril se refere à morte de Tiradentes, que foi enforcado no Rio de Janeiro em 1792. A Inconfidência ou Conjuração Mineira se deu entre aproximadamente 1788 e 1789

» Significado
A palavra inconfidente tinha um sentido pejorativo e, aos olhos e ouvidos da Coroa portuguesa, significava traidor. Conjuração quer dizer conspiração e é mais apropriado aos ideais dos mineiros do século 18

» Liberdade
A bandeira da república dos inconfidentes, tinha no centro do pano branco um triângulo vermelho simbolizando a Santíssima Trindade e a inscrição retirada do poeta Virgílio: Libertas quae sera tamem – Liberdade ainda que tardia

» Senha
A senha dos conspiradores era: “hoje é o dia do batizado”, numa referência à data da derrama. Isso foi combinado durante o batizado da filha de Alvarenga Peixoto

» Movimentos
Em Minas, na segunda metade do século 18, outros movimentos receberam o nome de inconfidência: em Curvelo, Sabará e Mariana. Nesses casos, não houve repercussão como a de 1789

» Sedição
Em Minas, outra revolta memorável contra a cobrança exorbitante de impostos foi a Sedição de Vila Rica, em 1720, que teve à frente Felipe dos Santos



enquanto isso...

...EXPOSIÇÃO EM Belo Horizonte





Os 230 anos da Inconfidência Mineira são lembrados pelo Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais com uma exposição, em cartaz até sexta-feira, no saguão da sede localizada na Rua dos Guajajaras, 1.268, no Bairro Barro Preto, na Região Centro-Sul. A mostra Inconfidências: Pinturas e Poemas de Márcio Sampaio, tem curadoria do artista plástico Márcio Sampaio e pode ser visitada de segunda a sexta-feira, das 14 às 17h. Informações: (31) 3212-4656 e www.ihgmg.org.br. A iniciativa é da Comissão Cultural Permanente de Geografia e Ciências Afins do instituto.

 


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