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Estado de Minas

Vira-lata Xerife morre, mas deixa herdeiros do 'romance' que viveu com Olívia Palito

Um ano depois do amor entre o cão de rua e a cadela no Prado, história ainda desperta curiosidade e vira tema de redação em escola. Vira-lata morreu, mas ninhada foi adotada


postado em 07/05/2016 07:00 / atualizado em 09/05/2016 08:36

Cleuza, moradora do Prado, cuida hoje de Olívia e três filhotes da cadela com Xerife(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
Cleuza, moradora do Prado, cuida hoje de Olívia e três filhotes da cadela com Xerife (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)

Os irmãos Batman, Charlotte, Clarice, Ringo, Leão, Tigrão, Pincel, Glóin, Manu e Júlio completam segunda-feira um ano de idade e de uma história que comoveu os belo-horizontinos e moradores de outras cidades mineiras. A turma de reluzente pelo preto e branco é filha de Xerife, o vira-lata que, no ano passado, latiu de paixão por Olívia Palito, pertencente a uma família do Bairro Prado, na Região Oeste da capital, e rosnou feio para o rival Kurt Cobain, animal de estimação da casa e também enamorado da cadelinha. “Até hoje vem gente aqui na porta perguntar por eles. Se pego um táxi, o motorista quer notícias”, conta a dentista aposentada Cleuza de Azeredo Coutinho, que ficou com três filhotes. Ela conta que no domingo à tarde, depois de longo tratamento contra o câncer, Xerife morreu, deixando os herdeiros aos cuidados de Olívia e do padastro Kurt Cobain. Foi cremado. “Mas está tudo bem, ele ficou os últimos tempos convivendo com os filhos e Olívia, como tanto queria”, assegura Cleuza ao lado da filha Tatiana, outra incansável no trato com os bichos.


Longe do Bairro Prado, em Juatuba, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), estudantes do sexto ano da Escola Municipal José Pires Montes continuam interessados no triângulo amoroso canino, que se tornou alvo de um trabalho conduzido pela professora de português Wanessa Ferreira Saraiva. Ela explica que, no ano passado, fez uma sequência didática usando as reportagens publicadas durante vários dias no Estado de Minas. “Como meus alunos gostaram da aula, resolvi aplicá-la novamente. E, para finalizar, pedi a eles que escrevessem cartas ao jornal”, afirma a professora, lembrando que seleciona várias matérias para ministrar as aulas. “Isso motiva muito e os leva a ter vontade de ler, de escrever.”

Cleuza lê carta de estudante ao lado de seu outro cachorro, Kurt Cobain
Cleuza lê carta de estudante ao lado de seu outro cachorro, Kurt Cobain

Ninguém melhor do que Cleuza para responder às cartas ilustradas com desenhos dos cães, marcas das patinhas marrons na folha branca, emoldurada a lápis de cor, e um “bom- dia!” em caligrafia esmerada para saudação inicial. Na tarde de ontem, ela leu as correspondências dos estudantes Larissa, Amanda Carolina, Amanda Letícia, Paulo Sérgio e Kaíque, do ensino fundamental, e ficou muito satisfeita. “Que bonito! Olha só como eles gostaram dessa história de amor. Dá para ver que leram os textos com interesse e compreenderam bem”, observou com os olhos brilhando.

Uma das cartas de estudantes com perguntas sobre Xerife e Olívia
Uma das cartas de estudantes com perguntas sobre Xerife e Olívia
ENCANTO Kaíque quis saber se todos os filhotes já tinham sido adotados e escreveu: “Sabe, eu me encantei com essa história”. Com Kurt circulando pela sala e Olívia brincando com os filhos no jardim, Cleuza informa que todos têm um lar. Ao lado, Tatiana lembrou que muita gente pediu um filhote em adoção, sendo impossível atender todo mundo. Na casa onde nasceram, crescem Batman, Clarice, “a mais levada”, segundo Tatiana, e Charlotte, que ganhou esse nome em homenagem à princesinha inglesa. Bonitos e saudáveis, mostrando a determinação do pai e o charme da mãe, que traz sangue nobre e vira-lata nas veias, os três usam bandanas coloridas no pescoço com seus nomes. Num momento de descuido, Olívia foge pelo portão da garagem, deixando os repórteres com o coração na boca: no entanto, o que parecia fuga era só mesmo uma voltinha no quarteirão. E lá vem ela lépida e fagueira.

Paulo Sérgio desenhou a família canina e, por cima, pôs uma faixa com a frase “Lar, doce lar”, escrita como se fosse com pedacinhos de ossos. Ele comentou que as brigas constantes entre Xerife se tornavam o maior empecilho na adoção do vira-lata pela família Azeredo Coutinho. Durante muito tempo, devido ao clima hostil entre ambos, Xerife se postou diante da grade da residência, recebendo, vez ou outra, um chamego da amada. Por várias vezes, foi acolhido em casa, mas o resultado era sempre conflito, com sérios prejuízos para a harmonia no reino animal e sossego doméstico. Xerife sofria de ciúmes, mas a relação entre Kurt e Olívia nunca se consumou, pois o atual padrasto não tem altura suficiente para cruzar.

Mandando “muitos abraços”, Larissa quis saber se poderia fazer visita com os colegas. “Venham quando quiserem, pois terei muito prazer em recebê-los”, convidou Cleuza. Tatiana aproveitou para dar notícias de alguns dos filhotes: Ringo curte a boa vida num sítio em Mateus Leme; Leão e Tigre estão com o mesmo dono; Pincel, com o rabo na forma do seu nome, ficou com um cunhado dela; e Júlio seguiu com o mestre de obras Alaerte Alves Pereira, que trabalhava numa construção próxima à casa da Rua Turquesa e apelidou o vira-lata de Xerife – “pois está sempre de olho, atento aos movimentos”, conforme revelou na época ao EM.

DESFECHO A trajetória de Xerife e Olívia lembra muito o filme de animação A dama e o vagabundo, lançado em 1955. O cão mineiro, certamente, teve uma vida mais movimentada e livre. Conseguiu fugir do laço de um agente de endemias do Centro de Controle de Zoonoses da Prefeitura de BH e, quando voltou para visitar seu amor, foi capturado e castrado. Depois, Tatiana o levou para um hotel-fazenda em Ribeirão das Neves, na RMBH, para conviver com outros cães. Na volta, em novembro, foi diagnosticado um câncer, demandando sessões de quimioterapia nos meses seguintes.

“Xerife comia cada vez menos, ficava quietinho, abatido e vomitava muito. A imunidade baixou, ele contraiu leishmaniose, que atacou os rins e causou insuficiência renal, sendo necessária a hemodiálise”. Na esperança de salvá-lo, acrescenta Tatiana, foi feito um tratamento experimental com células-tronco. “Fizemos o que foi possível. Agora, temos os herdeiros dessa história tão peculiar.”

 

Memória


(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)

Amor animal


A história de Xerife, de pelo preto, e Olívia, branquinha, começou pouco antes do carnaval de 2015, quando a funcionária pública Tatiana de Azeredo Coutinho Ferreira acolheu a vira-lata Olívia Palito em casa. “Ela era muito magrinha, daí o nome em homenagem à namorada de Popeye”, contou Tatiana ao EM em 27 de maio. De imediato, a cadelinha recebeu olhares de cobiça de Kurt Cobain, então com 11 anos, morador antigo e apelidado em homenagem ao guitarrista (1967-1984) da extinta banda Nirvana. Um belo dia, quando estava no cio, Olívio Palito fugiu. Não tardou muito para Xerife aparecer na grande da casa da Rua Turquesa e lançar olhares românticos para a cadelinha. Se na rua era Xerife, na casa virou Lord Voldemort, o vilão da série Harry Potter. Logo depois veio a ninhada de 11 filhotes (um morreu no mesmo dia) e o começo de uma curiosa história de amor.


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