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Estado de Minas

Mulheres que optaram pela adoção revelam que o sentimento maternal não muda

Vitoriosas, revelam ao mundo traços da relação de afeto que é construída dia a dia com base em um amor grande mesmo, capaz de abraçar diferenças, dificuldades, medos e tranformá-los em aprendizado, carinho, superação


postado em 10/05/2015 06:00 / atualizado em 10/05/2015 08:43

Maria Fernanda lembra que cada filho tem a própria identidade, independentemente de ser biológico ou adotivo(foto: Euler Júnior/EM/DA Press)
Maria Fernanda lembra que cada filho tem a própria identidade, independentemente de ser biológico ou adotivo (foto: Euler Júnior/EM/DA Press)


Mãe é mãe. Independentemente de laços de sangue, a relação dessas mulheres com os filhos é construída sobre o pilar de um sentimento superlativo. Nesta edição, o Feminino & Masculino presta uma homenagem àquelas mulheres que não conviveram com o bebê durante os nove meses de gestação, mas muitas vezes esperaram anos e anos pela oportunidade de carregá-lo nos braços. Elas optaram pela realização de um sonho e lutaram muito pelo direito de adotar legalmente uma criança. Vitoriosas, revelam ao mundo traços da relação de afeto que é construída dia a dia com base em um amor grande mesmo, capaz de abraçar diferenças, dificuldades, medos e tranformá-los em aprendizado, carinho, superação. Agora, a recompensa que desejam é uma só: a felicidade plena dos rebentos.

O desejo de assumir filhos adotivos não costuma fazer parte dos projetos de vida de um casal ainda durante a fase de namoro. Mas este era um dos sonhos compartilhados por Maria Fernanda Pires de Carvalho Pereira e José Arthur de Carvalho Pereira Filho, ambos advogados, bem antes do casamento. A união de fato ocorreu, assim como o nascimento das duas filhas biológicas, Maria Laura, hoje com 19 anos, e Maria Helena, de 14. E aquele projeto antigo voltou à tona. “ É muito raro um casal que tenha filhos querer adotar, mas nossa vontade sempre existiu. A princípio como uma ideia de amor de doação. E meu marido tem uma experiência na família, uma história de vida bem próxima”, contextualiza Maria Fernanda.

Com o assunto novamente em debate, a advogada conta que ela e o marido entenderam que não deveriam abrir mão daquele projeto. “Começamos a pensar como seria, a falar novamente sobre isso. Faço parte de um projeto social e víamos a necessidade real de ajudar o outro. A vida seguia quando recebi um telefonema de uma prima sobre um bebê que estava para nascer lá no Norte de Goiás.”A princípio, Maria Fernada havia pensado em uma adoção tradicional, a entrar na fila e passar por todos os processos. Mas surgiu a oportunidade, já que a mãe biológica da criança estava mesmo à procura de pais adotivos. “Sonhamos mais ou menos por três anos, e de repente aquele projeto estava palpável. Na hora sentimos um frio na barriga, mas não voltamos atrás. Liguei para o médico para provindenciar toda a assistência e fizemos todos os procedimentos para legalizar a adoção”.

Sobre o primeiro contato, uma emoção nova. “Quando você gesta um filho e o pega no colo, reconhece aquele ser com quem conversou, fantasiou, reconhece-se nele. Com o Pedro não tive isso, mas um pouco de estranhamento. No primeiro banho dele, eu e o Arthur conversamos sobre esse novo amor, que foi crescendo com o convívio e nos tomou por completo”
Pedro Henrique fez 8 anos. A mãe conta que ele sabe sobre a adoção desde a primeira pergunta. “Logo que ele nasceu, fomos buscá-lo. Entrei com a guarda provisória, logo depois com o processo de adoção. Há quatro anos está tudo regularizado. Não é um processo rápido, penso até que precisa melhorar até para evitar a ‘adoção à brasileira’, considerada crime.” Hoje, Maria Fernanda caracteriza o filho como o xodó da casa. “O amor que eu sinto pelos três é´igual, absolutamente igual. Gente, eu que tenho as duas modalidades – filhos adotivos e biológicos –, amo absolutamente da mesma forma”, derrete-se.

Para os que imaginam um mar de rosas, a mulher é pragmática. “Não posso dizer que questões como discriminação não tenham passado pela minha cabeça. Os pais reconhecem as próprias características nos filhos biológicos, mas mesmo estes são tão diferentes! Então, você vive as dificuldades normais com os filhos, tanto os biológicos quanto os adotivos. Eles lidam com os sentimentos da forma deles, têm identidade própria. Nunca encarei as diferenças físicas ou as dificuldades pelo viés de ele ser um filho adotivo. Há, sim, medos e receios que são enfrentados e superados em qualquer relação entre pais e filhos.”

A mãe apoia-se na verdade como prioridade dessa bonita relação. “Nunca menti, nem evitei conversar sobre a mãe biológica. Antes de dormir, rezamos para ela, lembramos que ela quis muita coisa bacana para ele, que fez a opção que julgou certa para que ele tivesse uma vida melhor.”

Maria Fernanda afirma ainda que a experiência real modificou aquele ideal do casal de namorados, tomou outro lugar. “Aquela ideia era teórica, tinha desejo, vontade, mas é muito diferente do ser mãe. E tenho até que me policiar por me sentir extremamente responsável pela felicidade dele. Outro dia, ele contou que uma colega disse que ser filho adotado deveria ser ruim. Conversamos e eu mostrei a ele que foi um escolhido, que viajamos meio Brasil para buscá-lo, que as diferenças existem, independentemente de origens. Nosso papel é desconstruir esse conceito de antigamente, quando o assunto adoção era velado, dito em voz baixa.”

Com a voz embargada, a mãe de Pedro, Maria Laura e Maria Helena ressalta que o sentimento é um só. “Sinto uma ternura muito grande. A maternidade é uma viagem maravilhosa, a minha melhor parte. Só não gosto que pensem que fizemos caridade, ou que supervalorizem nossa ação. Penso que a sorte é nossa: o Pedro nos revelou uma capacidade imensa de amar.”

"Respeito muito a posição dela, e a crio dessa forma. Procuro ensiná-la a a lidar com as diferenças porque essa é a beleza do ser humano" (foto: Euler Júnior/EM/DA Press)


Tal mãe, tal filha

A engenheira civil Adriana Martins Wallace de Oliveira esperou bem mais do que os nove meses convencionais para realizar o sonho de ser mãe. Já casada há 15 anos, ela semeou a ideia da adoção no coração do marido, Dirceu Oliveira, aos poucos, após tentativas frustradas de gravidez. Ao todo, esperou oito anos até a chegada de Lara.”Não havia uma lista de espera disponível aqui em Belo Horizonte. Então, entrei em todos os lugares onde existia o serviço: em Riberão das Neves, Nova Lima, no Rio Grande do Sul... Sofri muito, porque me sentia desmotivada a cada reunião, acredito que as assistentes sociais fazem de tudo para você desistir. Existe um terrorismo emocional”, lamenta.

No começo do processo, Adriana conta que havia a expectativa de adotar uma criança com biótipo parecido com o dela e o do marido. Depois, essa ideia ficou para trás, tamanho o desejo de ter um filho nos braços. O casal recebeu a notícia do nascimento de Lara 3 anos e meio após a inscrição na primeira lista, depois de um processo longo. “Consegui a guarda provisória, mas apenas quando ela tinha 11 meses conquistamos a guarda definitiva. E sofri muito nesse primeiro ano porque a incerteza causa muita angústia. Cheguei a receber uma assistente social que questionou o fato de o quarto dela não ter suíte, sendo que estava tudo certo, o quarto sempre arrumadinho, fiquei uns dois anos sem trabalhar para estar com ela o tempo todo. Quando regularizamos a situação sentimos um alívio muito grande”.

Hoje, já com 8 anos, a pequena pede um irmão, mas Adriana titubeia ao pensar em enfrentar tudo novamente. “A legislação brasileira tinha que facilitar esse processo. Vemos tantas crianças que necessitam de cuidados nos abrigos, mas o processo não ajuda.”

Superado o trauma dos trâmites legais para a adoção, ela conta que a vida mudou após a maternidade. “É engraçado porque quando recebemos a notícia da chegada da Lara eu estava hospitalizada, em um processo cirúrgico. Mas pedi ao juiz uma autorização e agarrei aquela oportunidade. Ainda em recuperação, olhava para o rostinho dela e nem acreditava, tamanha a emoção”, descreve.

A menina não se parece fisicamente com a mãe, mas tem muito das características da personalidade e das ações de Adriana e do pai, Dirceu. “Penso que determinar a capacidade de um ser humano pela genética é ilusão. Tudo é moldado pelo convívio, a gente é quem faz a diferença. Vejo características de personalidade, nosso jeitinho nela, a forma de lidar com as coisas. Chego a esquecer que ela não saiu de mim.”

Também na casa da família o assunto não é tabu. “Não escondo nada da Lara e digo que não temos o direito de recriminar a mãe biológica. Explico sobre as condições necessárias para manter uma criança e sobre o fato de muitas pessoas viverem em dificuldade, miséria. Sei que ela terá questionamentos, e prometo responder ao que me perguntar, pois lidamos com a adoção de forma tranquila. Guardo o processo para que ela tenha acesso a tudo se um dia ela apresentar curiosidade em relação à sua história.”

Adriana conta que outro dia, na escola na escola da filha, houve uma atividade que representava a árvore genealógica dos alunos. “A Lara veio me perguntar o que deveria colocar. E eu disse que ela mesma poderia escolher. Lá em casa, ela é filha única, mas tudo bem se quisesse dizer para a turma sobre a origem, levantar a possibilidade de ter irmãos. Respeito muito a posição dela, e a crio dessa forma. Procuro ensiná-la a lidar com as diferenças, porque essa é a beleza do ser humano.”

A menina também já está escolada para lidar com o preconceito. Adriana faz questão de falar sobre o amor que não está necessariamente vinculado a laços de sangue. “Muitas vezes, um filho de coração é até mais amado que um biológico. E perde tempo quem quiser ofendê-la de alguma forma, pois ela sabe que é e se acha especial.”

Em casa, Adriana descreve as delícias do convívio com a filha, considerada uma grande companheira. “Ela é um doce, danada, bagunceira, extremamente inteligente, carinhosa. Diz que sou a mãe mais maravilhosa do mundo e eu fico daquele jeito. A Lara é a realização do meu maior sonho, e por ela sinto o maior amor do mundo.”


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