![Na calçada da Rua Nossa Senhora de Fátima, na Serra, a televisão de 14 polegadas complementou a festa de um grupo de moradores(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press) Na calçada da Rua Nossa Senhora de Fátima, na Serra, a televisão de 14 polegadas complementou a festa de um grupo de moradores(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)](https://i.em.com.br/Q74O_jBocYE5ogCTwwfAVM4uiH4=/675x/smart/imgsapp.em.com.br/app/noticia_127983242361/2014/06/18/540302/20140617230908298337i.jpg)
“Na ‘Copa dos Excluídos’, todo mundo saiu ganhando”, defende Alexandre Morais, o Lêcha, de 36 anos, coordenador do Paz na Serra, entidade que promoveu um concurso de decoração que mobilizou todo o morro, que se coloriu de verde e amarelo, com a adesão de 25 ruas. “Queremos mostrar esse lado bonito do aglomerado que é a união desse povo que sofre e que sabe de verdade como faz falta a saúde e a educação”, diz. Segundo Lêcha, diferentemente dos bairros da Região Sul, que economizaram nos enfeites, é preciso seis horas para fazer um tour pela favela nos tons da Copa.
Exatamente como no jogo do Brasil, ontem, o resultado do concurso rendeu o empate entre a Rua da Passagem e a Rua Doutor Camilo. Na primeira, ganharam as bandeiras gigantes de papel crepom picado, que podem ser vistas de vários pontos da Serra. Na segunda, pesou a restauração do muro da escola pública e a limpeza do lixo nas ruas. Como prêmio, foram oferecidas peças de picanha, engradados de cerveja e refrigerantes. “Nosso morro é só curtição”, disse Cláudio Gabriel Ferreira, de 14, que aproveitava as férias escolares para fazer uns bicos no lava-jato localizado em uma das ruas vitoriosas. Em clima de Copa, exibia os cabelos pintados de verde-limão.
Na Rua Nossa Senhora de Fátima, na altura do número 339, os moradores preferiram investir o dinheiro que seria gasto na decoração. A vizinhança organizou uma animada torcida diante de uma televisão de 14 polegadas. O mais importante era a canjica distribuída gratuitamente, com direito a acréscimo de leite condensado. No jogo anterior, havia sido arroz doce. No próximo, está programado caldo de mandioca. Se o Brasil passar para a próxima fase, está previsto um churrasco.
Na barriga, aos 9 meses, Luan Vítor ameaçava nascer. A mãe, Priscila Mara Silva, de 23 anos, continuava assistindo ao jogo, já sentindo as primeiras contrações. Já o pai, que havia trabalhado a noite inteira como taxista, aproveitava para descansar. “Na semana passada ele viu o jogo, mas hoje ele está exausto. Disse que está trabalhando com medo de tomar pedrada. Na minha opinião, se eles quisessem impedir a Copa, tinha de ser antes e não agora, depois que já se gastaram milhões, não é?”, questionava a gestante.
Praça, corrida e pipoca
Tão logo começou o jogo Brasil x México, o professor de inglês Érico Vieira saiu para correr. E correu muito, com fôlego suficiente para contornar a Igreja de Nossa Senhora da Boa Viagem, passar pelas praças Sete, Raul Soares e Liberdade, chegar à Savassi e depois subir a Avenida Afonso Pena até a Praça do Papa, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte. “Gosto de esportes, mas não de futebol”, revelou Érico que, de mochila nas costas, mostrava boa forma física e muita determinação. A exemplo do professor, há outros mineiros que preferem, no dia em que a Seleção Canarinho entra em campo, ficar longe da tevê e buscar alternativas de diversão – sempre de bom humor e sem um pingo de remorso.
Único cinema da cidade com sessão na hora da partida, o Humberto Mauro, no Palácio das Artes, recebeu 10 pessoas, que assistiram gratuitamente ao filme A cor do dinheiro, de Martin Scorsese. No primeiro jogo do Brasil, quinta-feira, havia apenas duas. “Não consigo entender essa idolatria com o futebol e acho até que, desta vez, o povo nem está tão empolgado. Não sou contra a Copa, mas vim ao cinema para fugir de tudo isso”, disse o artista plástico Roberto Freitas.
Ao ar livre
Na Praça Floriano Peixoto, no Bairro Santa Efigênia, o administrador Geraldo de Andrade, residente no Bairro São Geraldo, ficou longe do 0 a 0, sentado tranquilamente num banco do espaço público, onde crianças brincavam e casais de namorados se beijavam. Bem longe dali, na Praça do Papa, os namorados Felipe Leonardo Gomes Mendes Fonseca e Raquel Mendes, moradores do Bairro Planalto, buscaram o sossego, de olho na bela paisagem da cidade e da Serra do Curral. “Até passamos na Savassi, vimos aquela muvuca e achamos melhor vir para cá. Gosto de futebol, não nego a minha alma e minha essência, mas não estou com o menor entusiasmo nesta Copa”, disse Felipe Leonardo. Para Raquel, sempre vale torcer pela Seleção. “Acho interessante a Copa ser no Brasil, há muita gente diferente e encontro de culturas.”