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Estado de Minas

Bombeiros interditam a Casa de Ópera, no Centro Histórico de Ouro Preto

O mais antigo teatro das Américas foi fechado por problemas na rede elétrica e por não ter extintores de incêndio


postado em 25/04/2014 06:00 / atualizado em 25/04/2014 07:03

No Largo do Carmo, teatro foi inaugurado em 1770 e hoje apresenta riscos que impedem a circulação de pessoas(foto: BETO NOVAES/EM/D. A PRESS)
No Largo do Carmo, teatro foi inaugurado em 1770 e hoje apresenta riscos que impedem a circulação de pessoas (foto: BETO NOVAES/EM/D. A PRESS)

O mais antigo teatro em funcionamento das Américas está interditado pelo Corpo de Bombeiros. A Casa de Ópera, no Centro Histórico de Ouro Preto, a 95 quilômetros de Belo Horizonte, não tem extintores de incêndio, apresenta problemas na estrutura e exibe danificações na parte elétrica e madeirame, além de outros sérios riscos para trabalhadores, visitantes e público dos shows, peças e outras atividades artísticas. “Há muitas falhas no projeto de combate a incêndios”, explicou, ontem, o comandante da 3ª Companhia, tenente Márcio Gustavo Guerra de Toledo, responsável pela vistoria e posterior interdição do espaço na manhã de anteontem.

Inaugurado em 6 de julho de 1770, dia do aniversário do então rei de Portugal, dom João VI, o teatro está sob administração da prefeitura local, via Secretaria Municipal de Cultura e Patrimônio. Conforme o tenente Toledo, a medida impede a circulação de pessoas no interior da casa de espetáculo, ficando vedada, portanto, a permanência de qualquer um na plateia, palco, camarins e outras áreas. “O teatro não oferece condições estruturais para funcionamento. Autorizamos a retirada apenas de equipamentos eletrônicos ”, disse o militar, destacando que os poucos extintores encontrados estavam vazios.

Uma mulher, que prefere não se identificar, conta que a situação é crítica. “É um verdadeiro absurdo o que estão fazendo com a Casa de Ópera. Os empregados estavam apavorados e foram transferidos para o anexo, afinal foram identificadas madeiras podres e comidas pelos cupins. Houve uma restauração, em 2006, mas nos últimos dois anos inexistem fiscalização e preservação desse patrimônio, que é uma joia do Brasil.” A servidora municipal contou ainda que a equipe responsável pelo teatro retirou os extintores, num total de 14, já que a maioria estava com data vencida desde maio do ano passado. “O teatro está fechado desde janeiro, mas as portas cerradas e a interdição só ocorreram depois das sucessivas denúncias e reclamações apresentadas na prefeitura por funcionários preocupados com a segurança no dia a dia”, observou. Para ela, já foram entregues várias solicitações à secretaria municipal, “mas nada surtiu efeito”.

Segundo o secretário José Alberto Pinheiro, que solicitou a vistoria dos bombeiros, as obras de recuperação do teatro vão começar mês que vem, com previsão de término em 30 de junho, a tempo de atender o Festival de Inverno. Ele explicou que a casa foi fechada por questão de segurança, já que havia gambiarras na parte elétrica – feitas para ligação de equipamentos – e outras inadequações na iluminação que poderiam causar curto-circuito.

Pinheiro conta que ontem se reuniu com um professor da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), encarregado de elaborar um projeto de revisão elétrica total e da parte cênica. “Fechamos o teatro para fazer um diagnóstico da situação, que tem agora como complemento o laudo dos bombeiros”, disse o secretário, informando que os extintores não foram recarregados tendo em vista os futuros serviços de recuperação.


HISTÓRIA

Localizado no Largo do Carmo, o Teatro Municipal de Ouro Preto tem formato de lira, sendo um dos poucos no mundo que recriam o instrumento símbolo do nascimento da ópera. Com a sua acústica perfeita, ele está entre as grandes paixões da cantora lírica Rosana Marreco Brescia, que fez doutorado sobre o tema na Universidade de Sorbonne, em Paris, França. Nas suas pesquisas, ela descobriu que se trata realmente do mais antigo em atividade no continente americano: “No Brasil, os teatros de Chica da Silva, em Diamantina, no Vale do Jequitinhonha, e o da Praia, em Salvador (BA), foram pioneiros, mas não existem mais”, informa.

Rosana destacou algumas particularidades que cercam a Casa de Ópera, construída pelo coronel João de Souza Lisboa, com provável projeto arquitetônico de Mateus Garcia, seguindo as linhas do barroco italiano, desaparecidas na mudança da fachada em 1861. Uma delas está na apresentação dos atores. Na época, apenas os homens podiam trabalhar em teatro, fazendo também os papéis femininos, travestidos, mas a Casa da Ópera quebrou esta tradição. Há registros de mulheres em cena, embora a rainha dona Maria I proibisse tal prática e depois não se importasse mais.

No final do século 18 e início do 19, Ouro Preto era uma cidade efervescente, com vida cultural muito ativa, e os textos eram apresentados em português e traduzidos de peças de Molière (1622-1673), Calderón de La Barca (1600-1681) e outros autores europeus. Outra característica está no gosto dos moradores da antiga Vila Rica pelas óperas. A mais surpreendente relaciona-se à formação dos elencos, desfazendo-se o mito de que o gênero é totalmente elitista. Como os portugueses, os brancos achavam que subir ao palco era uma arte menor; os mulatos e negros aproveitavam a brecha para cantar e interpretar. Os mulatos foram também grandes artesãos, pintores e despontaram em outros campos das artes.

MEMÓRIA: Degradação em cena
Em reportagem publicada em agosto de 2006, o Estado de Minas mostrou as obras de restauração do Teatro Municipal de Ouro Preto –Casa de Ópera, que demandou, na época, recursos de R$ 557 mil do antigo Programa Monumenta/Ministério da Cultura/Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e contrapartida da prefeitura local. Com a promessa de voltar aos áureos tempos, o teatro construído de pedra, a equipe substituiu tábuas da plateia, galeria, camarotes e frisas, recuperou as cores originais das paredes cobertas de branco e recuperou telhado e as elegantes cadeiras de palhinha. Com as obras, saíam de cena os cupins, infiltrações, repinturas e riscos de desabamento, entrando no palco a preservação, o respeito pela arte e a reconstituição da história. Oito anos depois, a degradação é convidada de honra na capa de espetáculos.

 


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