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Estado de Minas

Justiça decide se imagem de Nossa Senhora do Rosário fica com fiés ou colecionador

MP quer que a imagem volte para Pedro Leopoldo, de onde foi furtada em1981. Colecionador de SP disputa a peça


postado em 18/02/2014 06:00 / atualizado em 18/02/2014 06:45

Imagem do século 18 foi furtada na noite de 1º de dezembro de 1981(foto: Ministério Público Estadual/Divulgação)
Imagem do século 18 foi furtada na noite de 1º de dezembro de 1981 (foto: Ministério Público Estadual/Divulgação)
Dia decisivo para o patrimônio cultural de Minas e, de forma especial, para a comunidade de Fidalgo, no distrito de Quinta do Sumidouro, em Pedro Leopoldo, na Grande BH. Nesta terça-feira, às 13h30, a 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) vai determinar o destino da imagem de Nossa Senhora do Rosário, do século 18, furtada em 1º de dezembro de 1981 da capela erguida em honra da padroeira e tombada pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha-MG). De um lado, está o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), que apreendeu a peça em 13 de novembro de 2012, em São Paulo (SP), e trava batalha de uma década para levá-la de volta ao local de origem. Do outro, o engenheiro civil paulista Renato de Almeida Whitaker, de 73 anos, considerado um dos maiores colecionadores de arte sacra do país e decidido a retornar para casa com a relíquia.

“É um dia D para nosso estado e confiamos na Justiça para que a imagem fique definitivamente com a comunidade de Fidalgo”, disse, nessa segunda-feira, o coordenador das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico (CPPC-MG), Marcos Paulo de Souza Miranda, a respeito da apelação proposta por Whitaker. Segundo o TJMG, o paulista alega que não há prova de que a imagem apreendida em seu poder seja a mesma furtada da capela. Assim, recorreu da decisão que o condenou a devolver a imagem ao local de origem, sob pena de multa diária no valor de R$ 50 mil; por litigância de má-fé (atrasar e prejudicar o andamento do processo), implicando pagamento de R$ 200 mil ao Fundo de Preservação do Patrimônio Histórico de Minas Gerais; e ainda danos morais ao Fundo Estadual dos Direitos Difusos Lesados, no valor de 1 mil salários mínimos.

Dependendo da decisão dos desembargadores, ainda caberão recursos e a parte que perder poderá recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). No caso de determinação favorável ao MPMG, a peça ficará a cargo do Iepha, que tem a guarda judicial, até ser confirmada a segurança da Capela de Nossa Senhora do Rosário para receber o bem. Se o colecionador paulista sair vitorioso, poderá reintegrar a escultura ao seu patrimônio. “O importante é que agora não serão mais necessárias perícias e testes para provar que a imagem de Nossa Senhora do Rosário é mesmo de Minas”, afirmou Marcos Paulo, que acompanhará a sessão de julgamento.

Esperança

Em Fidalgo, o clima não é mais de tristeza pela perda da imagem da padroeira, mas de muita alegria e esperança na decisão da Justiça. Na manhã de ontem, moradores mostraram que estão confiantes ao acompanhar, pelas ruas, uma procissão com bandeirinhas azuis, estandarte da guarda de congado, cânticos, toque de sino e muita reza. Um detalhe, no entanto, chamava a atenção e não deixava de emocionar. Enfeitado com rosas vermelhas, flores de buganvília brancas e lírios, o andor estava vazio, à esperança da padroeira. Com um terço pendurado no pescoço, a coordenadora do Conselho Paroquial Comunitário, Edna Maria da Silva Santos, a Nininha, disse que a animação e expectativas são fortes. “Muita gente morreu sem ver a santa de volta ao altar, mas tenho certeza de que o céu estará em festa”, afirmou, com um buquê nas mãos.

“Virgem do Rosário/sois rosa mimosa/e entre outras flores/sois a mais formosa”, cantavam homens, mulheres, adolescentes e crianças no cortejo que saiu da Capela de Nossa Senhora do Rosário, que já está com alarme instalado e tem concluído o sistema de monitoramento por câmeras de vídeo. “O templo foi reformado em 2004 e está preparado para receber a nossa padroeira”, afirmou o gerente do Parque Estadual do Sumidouro e morador da localidade, Rogério Tavares, lembrando que foi recuperada a imagem de Nossa Senhora dos Martírios, sob guarda do Memorial da Arquidiocese, em BH. “Queremos que seja feita justiça.” As adolescentes Marina Silva e Catarina Clemente, ambas de 13, também defenderam a volta da peça por ser do “patrimônio da comunidade”.

Moradores saíram nessa segunda-feira em procissão pelas ruas de Quinta do Sumidouro, carregando o andor à espera de sua padroeira (foto: Beto Novaes/EM/D. A Press)
Moradores saíram nessa segunda-feira em procissão pelas ruas de Quinta do Sumidouro, carregando o andor à espera de sua padroeira (foto: Beto Novaes/EM/D. A Press)

LEMBRANÇAS Foi numa noite chuvosa, de triste memória, que os ladrões arrombaram a janela da capela dedicada à santa e a carregaram, juntamente com as esculturas de Santo Antônio, São Sebastião, Nossa Senhora das Dores, Santa Efigênia, Anjo Gabriel, que foi arrancado do altar, tendo quebrada a asa, e Madona Menor, além de cálices, pratarias e coroas. “Por ser muito pesado, o Senhor dos Passos foi deixado no adro, debaixo d’água”, recorda-se Joaquim Lélis Sobrinho, de 83 anos, conhecido como Joaquim da Venda, que, na época, era zelador do singelo templo.

Na manhã de ontem, Joaquim estava entusiasmado e cheio de fé em Deus. “Precisamos da nossa padroeira aqui. É nossa guia”, disse o aposentado, ao lado de José Leão, de 83, o primeiro a notar que a capela havia sido arrombada, e Raimundo Patrocínio Rodrigues, de 70, que passou em frente à capela pouco depois e viu o Cristo jogado na lama. “De imediato, falei com o Joaquim Lélis sobre o roubo e ele, então, tomou as providências”, disse José Leão visivelmente comovido. Na porta da igreja, a dona de casa Adissionina Maria Francisco, de 57, recordava-se do “assalto” e da tristeza que ficou em Fidalgo. “Mas ela voltará, se Deus quiser.”

Já no altar, a ministra da eucaristia Janir Teodoro Bastos, de 66, destacou a atuação da comunidade, “que acordou cedo para rezar e fazer a procissão” a fim de pedir de volta o seu bem precioso desaparecido há mais de três décadas. Ao lado, as integrantes da Guarda do Congado Chico Rei fortaleciam a corrente de orações em prol do retorno da santa. O Estado de Minas tentou contato com Renato de Almeida Whitaker, por telefone fixo e celular, mas não teve sucesso.

Cronologia

Luta sem fim

1974 – Em 25 de outubro, é feito o tombamento da Capela de Nossa Senhora do Rosário, no distrito de Quinta do Sumidouro, em Pedro Leopoldo, na Grande BH.
1981 – Em 1º de dezembro, são furtadas seis peças sacras da capela, entre elas a imagem da padroeira.
2003 – Em 11 de setembro, técnicos do Iepha identificam imagem em catálogos de colecionador paulista, seguindo indicação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em Minas. Em 16 de setembro, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) instaura procedimento investigatório. Em dezembro, colecionador informa ao Iepha ter tomado conhecimento da suspeita de que a escultura procurada pelo instituto se encontrava em seu poder e propõe reunião sobre a questão. Em dezembro, relatório do Iepha aponta que imagem em poder do colecionador é a mesma furtada da Capela de Nossa Senhora do Rosário.
2004 – Em 7 de janeiro, em reunião no Iepha, em BH, colecionador se compromete a entregar imagem, caso se comprove que o tombamento ocorreu antes do furto. Em 29 de janeiro, colecionador descumpre palavra dada ao Iepha e MPMG e ajuíza ação cautelar na Justiça Federal, em São Paulo, para manter a propriedade da escultura até a decisão do processo. MPMG propõe ação civil pública contra o colecionador, pleiteando a restituição da imagem à capela. Juíza da 1ª Vara da Fazenda Pública de BH defere o pedido de liminar de busca e apreensão da imagem. Colecionador é novamente notificado judicialmente a entregar a imagem, sob pena de multa. Determinação judicial não
é obedecida.
2012 – Em 13 de novembro, em operação envolvendo MPMG, Polícia Civil e Iepha, imagem é apreendida em São Paulo (SP) por determinação judicial e fica sob guarda do instituto.

SERVIÇO
Para denunciar roubos, furtos ou dar informações sobre peças, faça contato:
Ministério Público Estadual – cppc@mp.mg.gov.br e telefone (31) 3250-4620.
Para obter ou dar informações, basta acessar o www.iphan.gov.br e verificar o banco de dados de peças desaparecidas. Denúncias anônimas podem ser feitas pelo telefone (21) 2262-1971, fax (21) 2524-0482, pelo
bcp-emov@iphan.gov.br ou no próprio banco on-line.
ww.iepha.mg.gov.br ou pelo telefone (31) 3235-2812 ou 2813.

MEMÓRIA: Operação resgate

Na manhã de 13 de novembro de 2012, como documentou o EM, uma operação envolvendo Ministério Público Estadual (MPMG), Polícia Civil e Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha-MG), apreendeu, em São Paulo (SP), por determinação judicial, a imagem de Nossa Senhora do Rosário, pertencente à Capela de Nossa Senhora do Rosário, do distrito de Quinta do Sumidouro, em Pedro Leopoldo, na Grande BH. Na época, o coordenador das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico (CPPC-MG), Marcos Paulo de Souza Miranda, informou que o colecionador Renato Whitaker não ofereceu resistência e pediu a um funcionário que estava no apartamento, na região dos Jardins, para entregar a escultura barroca de madeira, em policromia, com 89cm de altura. A ação para resgate da imagem foi ajuizada em 15 de março de 2004.


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