A preservação do Parque Nacional da Serra da Canastra, berço do Rio São Francisco e santuário rico em flora e fauna, continua ameaçada. Uma manobra política retirou da Medida Provisória 542, em tramitação na Câmara dos Deputados, a emenda que reduz a área de proteção ambiental. Agora, ela será votada pelo Senado, por meio de um projeto de lei substitutivo. Conforme o Estado de Minas adiantou na edição de 2 de novembro, o texto substitutivo do Senado prevê a divisão dos 200 mil hectares da área verde em 120,5 mil hectares de parque (de proteção integral); 76,4 mil hectares de monumento natural (onde são permitidas atividades de baixo impacto, como agricultura de subsistência, atividade agropastoril e turismo rural); e 2,1 mil hectares liberados para a mineração e extração de diamantes.
Os arranjos políticos são alvo de crítica do Ministério Público Federal (MPF), que acompanha o caso. “Esses projetos de lei e medidas provisórias mostram que os deputados e senadores estão atentos à questão da Serra da Canastra, mas não vejo os políticos apresentarem solução definitiva para o parque ou garantirem recursos para a preservação efetiva da área. Qualquer alteração nos limites do parque precisa ser compatível com a proteção ambiental, além de atender interesses econômicos e de exploração mineral”, diz a procuradora da República de Passos, no Sul de Minas, Ludmila Oliveira.
O novo projeto, em tramitação no Senado, tem o aval do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão ambiental do governo federal. Por meio da assessoria de imprensa, o ICMBio informou que o texto é resultado de um acordo feitos dentro dos conceitos de desenvolvimento sustentável. Segundo o instituto, ele garante a preservação da biodiversidade com a criação de áreas de parque e monumento natural e também permite atividades de subsistência, especialmente com a produção de queijos e atividades agropastoris. O ICMBio ainda acrescenta que as áreas de mineração estarão fora dos limites de preservação e só poderão ser exploradas com licenciamento ambiental.
Imbróglio jurídico
A retirada da emenda que prevê mudanças no limite do parque da Medida Provisória 542/2011 é uma estratégia dos deputados para fugir de um imbróglio jurídico. Isso porque a medida provisória é alvo de ação direta de inconstitucionalidade do MPF. O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, argumenta que as unidades de conservação só poderiam ser alteradas por lei, e não por medida provisória. Alegando necessidade de segurança jurídica, a emenda de autoria do deputado Odair Cunha (PT-MG) foi retirada da MP na Câmara e agora será votada como projeto de lei substitutivo no Senado.
O texto deve ser votado nos próximos dias pela Comissão de Meio Ambiente da Casa. Por ter caráter terminativo, ele não precisa passar pelo plenário e, se aprovado, segue direto para a Câmara dos Deputados. “Solicitei ao deputado Odair que retirasse a emenda da medida provisória, pois não havia consenso e ela estava sendo criticada pelo Ministério Público Federal. Estou convencido de que fizemos um bom acordo para chegar a essa alternativa que mantém área de 196 mil hectares de preservação, somando o parque e o monumento natural, e ainda resolve conflito com moradores em atividades de subsistência e mineradoras”, afirma o senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), relator da Comissão de Meio Ambiente do Senado.
A batalha em torno do santuário ambiental dura quase 40 anos. Abrigo de espécies em extinção, berço de vários cursos d’água, como o importante Rio São Francisco, o parque chegou a correr o risco de perder 65% de seu território, passando de 200 mil hectares para 71,5 mil hectares. Coautor dos dois projetos que versavam sobre a grande área de cerrado mineiro, o deputado Odair Cunha (PT-MG) argumentava que a proposta regularizaria a situação de produtores rurais que vivem na região. Outra justificativa era de que não haveria redução no espaço, uma vez que o governo só havia remarcado os 71 mil hectares dos quais ele possui registro.