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Estado de Minas

Novela de um ano e meio no Anchieta não tem previsão para acabar


postado em 26/10/2011 06:00 / atualizado em 26/10/2011 07:23

Os prédios ameaçados no Anchieta: dezoito meses depois, muita gente continua longe de casa(foto: Cristina Horta/EM/D.A Press %u2013 26/5/11)
Os prédios ameaçados no Anchieta: dezoito meses depois, muita gente continua longe de casa (foto: Cristina Horta/EM/D.A Press %u2013 26/5/11)

 

Susto, transtorno, desamparo, frustração. Sentimentos de quem precisou deixar sua casa para trás, diante do risco de desabamento. A interdição do prédio no Buritis relembra o drama de outras famílias desalojadas na cidade. “Estamos sempre morando provisoriamente”, lamenta o bancário aposentado Plínio Corrêa de Aquino, de 73 anos, fora de casa há um ano e meio, desde que um muro de contenção das obras de ampliação do Shopping Plaza Anchieta, no Bairro Anchieta, Região Centro-Sul, desmoronou, em abril de 2010. Cinco prédios do entorno foram condenados pela Defesa Civil e a maioria dos moradores ainda espera um acordo ou luta na Justiça para garantir seus direitos.

“Pedimos aos empreiteiros do shopping que fizessem reparos no prédio e no terreno, que está sem sustentação. São exigências básicas de segurança. Assim, nós poderíamos voltar”, explica o proprietário de um apartamento no Edifício Ouro Preto. “Foi uma peleja para comprar aquele apartamento, uma luta, a conta certa do nosso dinheiro. Eu pensava que ia ter um imóvel para a vida toda, mas essa incerteza ainda tira meu sono: até quando a Justiça vai garantir que eles paguem nosso aluguel? Como isso vai ficar? Já sou da terceira idade e não tenho mais disposição para recomeçar”, desabafa o aposentado.

Segundo a advogada Letícia Ateniense, que representa os moradores dos edifícios Ágata, Ouro Preto e Lenise, o acordo foi fechado apenas no caso do primeiro prédio, que teve perda total. O pagamento da indenização de R$ 3,5 milhões foi parcelado e será quitado até dezembro, quando o shopping deixará de pagar o aluguel para cinco famílias que moravam no edifício. No que diz respeito aos outros dois prédios, o processo judicial foi suspenso por 30 dias, para permitir a negociação da recomposição dos edifícios e indenização por danos morais e desvalorização.

“Minha mãe sofria do coração. Foi acordada e retirada de casa com risco de o Edifício Ouro Preto cair, por causa dos abusos da construção civil. Ela faleceu este ano, sem teto e sem chão. Fomos pegos de surpresa por uma situação que jamais esperávamos que pudesse acontecer. E ficamos à mercê de uma Justiça morosa”, lamenta o corretor de imóveis José Martins Izidro, de 55 anos.

A pesquisadora da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Maria do Carmo Salazar Martins, de 61 anos, precisou morar na casa da filha por seis meses, até que a empreiteira do shopping alugasse um apartamento para ela e o marido. “O quarto de hotel que nos ofereceram era muito pequeno, acabamos nos mudando para a casa da minha filha, o que é um incômodo para todos. Minha biblioteca com mais de 3 mil livros também ficou para trás e isso me causa muito transtorno, porque é meu objeto de trabalho. Aquele imóvel foi a única coisa que conseguimos construir ao longo da vida e agora não sei o que vai acontecer, nem se a gente vai ter coragem de morar lá de novo.”

 Réveillon interrompido e mudança às pressas

 

Embora seja o mais emblemático dos últimos anos, o drama dos moradores do Bairro Anchieta está longe de ser um caso isolado em Belo Horizonte. Uma das pessoas que constataram isso da pior forma foi a enfermeira Sílvia de Freitas Cunha Avelar, de 35 anos. Ela aproveitava o último dia do ano de 2009 com o marido no cinema quando recebeu uma ligação da mãe, avisando que “uma coisa séria” tinha acontecido com o prédio onde o casal morava, no Alto Barroca, Região Oeste de BH. Por causa da chuva forte, o barranco de uma casa na rua de trás cedeu, colocando o edifício da Rua Canaã em risco. Ao chegar em casa, a família só teve tempo de retirar o indispensável. Com a interdição, cerca de 150 pessoas foram obrigadas a passar o réveillon longe de casa.

“Era um dia de festividade, tínhamos planos e começamos o ano tristes. Até então, não sabíamos de rachaduras ou estrutura ruim na construção do prédio, que tinha 18 anos, era relativamente novo. Foram três semanas de angústia na casa de uma tia, medindo milímetro por milímetro da chuva, com medo de que o prédio desabasse. Depois de cinco ou seis meses fora, período em que a Sudecap fez um reparo emergencial na contenção do barranco, pudemos voltar. As chuvas do ano passado trouxeram receio, mas graças a Deus correu tudo bem. Hoje, os próprios moradores custeiam as melhorias”, conta ela.

Dia a dia, ao longo de quatro meses, a comerciária Jeanete Aparecida Borges de Lima, de 36, viu sua casa toda trincar. A escada ficou comprometida, as paredes da sala, o terraço e também a varandinha, canto preferido do imóvel no Bairro Pompeia, Região Leste da cidade. Jeanete até tinha receio, mas não tinha para onde ir. Em setembro, a Defesa Civil condenou a estrutura de quatro casas de um mesmo lote, por causa do vazamento de uma tubulação da Copasa, e há quase um mês ela vive em um hotel pago pela concessionária de água e esgoto. Outras seis famílias também foram removidas.

“Eles ofereceram uma quantia para que a gente fizesse reparos na casa, mas o valor não dá para custear nem o início. Sem contar que não sabemos se também houve danos subterrâneos”, diz a comerciária. Instalada em um hotel no Bairro Saudade, na mesma Região, Jeanete está mais distante do trabalho, e sua filha, da escola. Ela só conseguiu tirar o fogão e a geladeira, que guardou na casa de parentes. “Minha casa era toda arrumadinha e agora nem sei se volto para lá. Como estou morando em um hotel, ficou tudo para trás. Só carrego comigo dúvidas e incerteza.”
 
A Copasa informou que discute valores de ressarcimento com os moradores das casas avariadas e que, juntamente com órgãos responsáveis, tem acompanhado os trabalhos de perícia e análise do solo. Quando não houver mais risco de desabamento, o trânsito nas ruas interditadas será liberado.

Transtorno

No Bairro da Graça, também na Região Leste de BH, parte de uma casa desabou na semana passada. O imóvel ficava ao lado de um prédio em construção, na Rua Silveira. Segundo os moradores, a estrutura começou a apresentar rachaduras em abril, quando as obras começaram. O muro de contenção caiu, abalando as paredes da sala, suíte e da área social. A Defesa Civil solicitou os laudos de estabilidade e segurança. A casa continua parcialmente interditada, mas o trânsito na rua foi impedido, porque um poste também tombou na via. A Cemig já retirou a estrutura de cimento e a Sudecap solicitou dois dias para recuperar a pista. O trânsito está sendo desviado pelas ruas Geraldo Farias de Souza, Juruá e São Bento.

Em março foi um edifício de quatro andares que desabou no Bairro Céu Azul, Região de Venda Nova. O prédio estava em fase final de construção e os operários tinham deixado o local três horas antes. Duas casas na Rua Joaquim José dos Santos foram atingidas. Oito apartamentos já estavam vendidos e em 15 dias os novos moradores fariam a mudança. (PS)

 


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