O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltou a pressionar o Banco Central e atacar a Selic (taxa básica de juros) no Brasil, afirmando que é uma "irresponsabilidade" mantê-la no patamar de 13,75%. Lula disse que vai continuar "batendo" e "tentando brigar" para que ela possa ser reduzida.
Lula também voltou a atacar o presidente do BC, Roberto Campos Neto, embora não o tenha citado nominalmente. O chefe do Executivo afirmou que não pode demiti-lo, pois depende do Senado para encerrar o seu mandato. No entanto, acrescentou que ele não se importa com os termos previstos na legislação que prevê a autonomia do BC.
Há um consenso no mercado financeiro que a Selic será mantida no atual patamar pela quinta reunião consecutiva, a segunda sob o governo Lula. Para uma parcela dos analistas, não há espaço para corte de juros antes do segundo semestre.
O Copom se reúne a cada 45 dias para recalibrar a taxa básica. O último encontro do colegiado do BC havia sido nos dias 31 de janeiro e 1º de fevereiro.
"Não posso demiti-lo porque depende do Senado, mas deixa eu te contar uma coisa. Eu acho um absurdo a taxa de juros estar a 13,75% no momento em que a gente tem os juros mais alto do mundo, no momento em que não existe uma crise de demanda. Existe excesso de demanda. Nós temos 33 milhões de pessoas passando fome, desemprego crescendo, a massa salarial caindo", afirmou o presidente.
"Então não há nenhuma razão, nenhuma explicação, nenhuma lógica. Só quem concorda com juros altos é o sistema financeiro, que sobrevive e vive disso e ganha muito dinheiro com especulações", acrescentou.
Assim como fez em outras ocasiões, Lula passou a criticar diretamente Roberto Campos Neto, que foi indicado ao cargo pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Sem citar seu nome, afirmou que ele não tem compromisso com o crescimento da economia, que também estaria no escopo de atribuições do BC.
"Eu sinceramente acho que o presidente do Banco Central não tem compromisso com a lei que foi aprovada de autonomia. A legislação diz que é preciso cuidar da responsabilidade da autonomia monetária, mas é preciso cuidar da inflação também, do crescimento de emprego, coisa que ele não se importa", completou.
Lula ainda disse que vai continuar "batendo" para que a Selic seja reduzida. "Eu vou continuar batendo, vou continuar tentando brigar para que a gente possa reduzir a taxa de juros para que a economia possa voltar a ter investimento", completou.
Em 14 de março, a Comissão de Assuntos Econômicos do Senado aprovou um convite para que Campos Neto dê explicações sobre a taxa básica de juros. A audiência está prevista para 4 de abril.
O convite veio em reação às críticas diretas de Lula e de integrantes do governo federal ao nível atual da Selic, diante de um cenário de desaceleração da economia, aumento da inadimplência e sinais de maiores dificuldades financeiras enfrentadas por empresas.
O foco inicial dos ataques do petista era a autonomia do BC, a qual chamou de "bobagem". A retórica depois evoluiu para ataques diretos a Campos Neto –a quem o presidente se referiu como "esse cidadão". Até que Lula foi aconselhado por aliados a dar uma trégua nas críticas após o presidente do BC fazer acenos na tentativa de diminuir a tensão entre a autoridade monetária e o governo.
PRIVATIZAR A ELETROBRAS 'FOI UM CRIME', DIZ LULA
O presidente Lula também voltou a criticar a privatização da Eletrobras e afirmou esperar que um dia o governo volte a ser proprietário da companhia de energia. Lula afirmou que a passagem do controle para a iniciativa privada foi um "crime de lesa pátria"."O que foi feito na Eletrobras foi um crime de lesa-pátria. Privatizar uma empresa daquele porte. Você utilizou o dinheiro para quê?", questionou o presidente.
Em fevereiro, o mandatário já havia afirmado que a AGU (Advocacia-Geral da União) iria questionar o contrato de privatização da Eletrobras.
Lula também disse que a Petrobras vai suspender todas as vendas de ativos, posição que o governo já vinha adotando desde a atuação do gabinete de transição, após as eleições.
"A Petrobras, a gente já avisou para o presidente dela, o companheiro Jean Paul [Prates], que é preciso suspender todas as vendas de ativos. Não tem condições de continuar vendendo. Obviamente, que as pessoas já tinham feito contrato com algumas coisas. Tudo isso tem uma briga jurídica que a gente quer resolver e vamos resolver na política e não na jurídica", afirmou Lula.
"Vamos voltar a fazer que a Petrobras seja uma grande empresa de investimento. A Petrobras não foi feita para exportar óleo cru, a Petrobras não é apenas empresa de petróleo, é empresa de energia, tem que estar preocupada com gás, diesel, biodiesel", completou.
ENTENDA: AUTONOMIA DO BANCO CENTRAL
O que é autonomia do Banco Central?
A regra desvinculou o BC do Ministério da Economia e o tornou uma autarquia de natureza especial. A principal mudança foi a criação de mandatos fixos de quatro anos, com possibilidade de uma recondução, o que distancia o órgão da influência política.
Quando a lei de autonomia do BC foi aprovada e por quê?
Com o objetivo de blindar a instituição de interferências de governo e criar mandatos fixos, o projeto de lei foi aprovado em 2021 e em seguida sancionado pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL).
Os membros da diretoria podem ser demitidos?
Podem deixar o cargo quando apresentarem desempenho insuficiente para alcançar os objetivos do BC, com decisão do presidente da República e sendo necessário o aval do Senado em votação secreta. Também podem ser exonerados a pedido ou caso contraiam doença que incapacite o exercício do cargo. Além disso, podem ser demitidos se condenados, mediante decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado, pela prática de improbidade administrativa ou de crime cuja pena proíba, temporariamente, o acesso a cargos públicos.
Como ficou definido o primeiro mandato fixo?
O presidente e dois diretores terão mandatos até 31 de dezembro de 2024, e os demais encerram os períodos de forma escalonada. Dois deles já encerraram o mandato em 31 de dezembro de 2021. Os próximos dois terminam em 28 de fevereiro de 2023; e outros dois, em 31 de dezembro de 2023.
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