Jornal Estado de Minas

MEIO AMBIENTE

COP-27: Demarcação de terras indígenas é saída para barrar crise climática


Lideranças indígenas estão presentes na 27ª Conferência das Partes da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP-27), em delegação coordenada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), para pautar a importância da demarcação de terras indígenas. O evento ocorre entre os dias 6 e 18 de novembro e acontece em Sharm el-Sheikh, no Egito.





No Brasil, os territórios protegidos pelos povos originários são as áreas com maior biodiversidade e vegetação mais preservada. De acordo com dados fornecidos pela APIB em parceria com o Instituto de Pesquisa Ambiental do Amazonas (Ipam) e com o MapBiomas, 29% do território ao redor das terras indígenas brasileiras está desmatada, enquanto seu interior apresenta uma taxa de apenas 2%.

Também está presente na COP-27 o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que aceitou os convites de governadores da Amazônia Legal e da presidência egípcia. A vitória do político é vista com otimismo pelas autoridades em relação à retomada da preservação ambiental, que teve uma queda durante o governo de Jair Bolsonaro (PL): entre 2019 e 2021, o país registrou quase o dobro das taxas anuais de desmatamento em comparação aos anos anteriores a 2018. Só em 2021, foram mais de 13 mil km² de floresta derrubados, o maior desmatamento anual em 15 anos.

Demarcar, proteger e preservar

O Brasil e o México foram os únicos dois países dentre os signatários do Acordo de Paris (Cop-21) que regrediram em suas metas na revisão de 2020, segundo estimativa da ONU.





Em 2021, o Brasil despejou na atmosfera 2,42 bilhões de toneladas brutas de CO², o que representa um aumento de 12% em relação a 2020, além de ser a maior alta nas emissões de gases do efeito estufa em 19 anos, segundo levantamento do Observatório do Clima. A principal causa pode ser a alta dos desmatamentos.

Célia Xakriabá, primeira deputada federal indígena eleita pelo estado de Minas Gerais, diz que a Organização das Nações Unidas (ONU) aponta a demarcação dos territórios indígenas como solução "número um" para barrar a crise climática. “Nós não somos nem 1% da população brasileira, e nem 5% da população mundial, mas protegemos em torno de 80% da biodiversidade do planeta”, afirma ela.

Para Célia, é importante que as lideranças do país compreendam a importância da preservação de povos e terras indígenas e que esse grupo é responsável pela maior parte da conservação ambiental no planeta. “Entender a demarcação é entender que, comprovadamente onde tem território demarcado, tem floresta de pé”, explica.





Em 2018, uma das promessas da campanha de Jair Bolsonaro (PL) era a de não demarcar territórios ancestrais, medida que representa um grande ataque aos direitos dos povos indígenas garantidos pela Constituição Federal de 1988, além de ser um inventivo ao desmatamento e à mineração ilegal, como diz Dinaman Tuxá, advogado e coordenador-executivo da APIB.

“No Brasil, não há solução para a crise climática sem a demarcação de terras e, consequentemente, a proteção dos povos indígenas. Nós temos uma relação íntima com a Mãe-natureza e vemos de perto os efeitos da destruição ambiental que Bolsonaro causou. Agora com Lula, esperamos trabalhar juntos para que a situação mude”, afirma Dinaman.


Bioeconomia

Célia Xakriabá também explica que, além das perspectivas de barrar a crise climática a partir da demarcação de terras indígenas, as lideranças também estão presentes na COP-27 para discutir a transição econômica e a bioeconomia. “Não dá para adiar o financiamento da preservação ambiental porque essas pessoas estão realmente preocupadas com a economia, e o ecocídio vai custar muito mais caro para a humanidade”, comenta ela.





O reposicionamento do Brasil em relação às políticas ambientais e às relações internacionais com a vitória de Lula também já renderam perspectivas positivas para o cenário proposto, como o anúncio feito pelo governo da Noruega sobre a retomada ao Fundo Amazônia, programa de cooperação internacional criado em 2008, durante o governo Lula, que destinava suporte financeiro ao Brasil para reduzir e evitar o desmatamento.

Em 2019, Bolsonaro impôs exigências ao Fundo que fizeram com que os governos financiadores da Noruega e da Alemanha encerrassem as transferências de recursos que chegavam a US$ 1 bilhão. 

Eunice Kerexu, coordenadora executiva da APIB, comenta sobre o alívio e o otimismo trazido pela esperança de um governo comprometido com pautas ambientais e de proteção indígena. “Com Lula, temos um cenário mais otimista, mas a luta não para. Vamos continuar batalhando pela demarcação de terras indígenas e a derrubada da tese do Marco Temporal. Assim como a Noruega, é importante também que mais países participem do debate e voltem a dialogar com o Brasil para, juntos, solucionarmos a crise climática”, afirmou.

Célia Xakriabá reforça que as eleições de 2022 foram cruciais para determinar o futuro do meio ambiente, mas que ainda há muita luta pela frente. “Uma das grandes preocupações nesses últimos 40 dias de governo é que ainda pode ter uma destruição que, em 20 anos, ainda não possa ser recuperada. Nós temos dito que a nossa chegada no Congresso Nacional é de olho no Planalto, mas também é de olho no planeta”, finaliza.



* Estagiária sob supervisão do subeditor Thiago Prata
 

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