
Débora Gabrich ama comer. Amanda Mendonça e Anna Lara consideram a comida uma parte muito importante de suas vidas. Thobias Almeida é frequentador assíduo de bares e restaurantes. Victor Schwaner está sempre em busca de uma nova receita. Não é só a paixão pela comida que une esses cinco personagens. Todos são fotógrafos especializados em gastronomia e levam a sério a máxima de que uma imagem vale mais que mil palavras. São eles que nos fazem salivar, mesmo de longe, ao olhar a fumaça saindo do prato ou a calda derramando na sobremesa.

Não basta clicar. O trabalho, no fim das contas, tem o objetivo de abrir o apetite, e requer muito planejamento, envolvendo cores, objetos, ingredientes e ângulos ideais para compor a cena. “Na hora de clicar a comida, você tem que pensar em como vai provocar desejo em quem está vendo aquela imagem”, diz a fotógrafa Débora Gabrich, que se apaixonou pela área da gastronomia quando começou a fotografar os pratos do namorado, chef de cozinha.
Segundo ela, para fazer o outro salivar é importante conhecer bem os alimentos e entender como eles se comportam. Em quanto tempo a carne perde a suculência, o sorvete derrete ou a salada murcha e quais são as harmonizações possíveis. “Se vou fotografar um hambúrguer com cheddar e bacon, não posso colocar limão. Assim como tenho que saber que carne harmoniza bem com alecrim e sal grosso.”

Ao olhar para o retrato de uma comida, Victor acredita que é preciso enxergar principalmente suculência. Além de trabalhar com comida bem fresca, que acabou de sair da cozinha, o fotógrafo explica que a iluminação ajuda muito a passar esta sensação: a luz certa consegue potencializar a cor e a qualidade da comida. “Os pratos hoje são tão elaborados que os vejo quase como uma escultura. Tento encarar isso pelo lado da fotografia de arte”, comenta.
Para Anna, registrar comida exige um cuidado especial. “Não tenho que dar informações técnicas, interessa a vontade que posso despertar no espectador. Por isso, precisamos entender que comida é muito mais que prato, envolve toda uma atmosfera”, analisa a fotógrafa, que divide a câmera com Amanda, sua sócia no Stúdio Tertúlia. Amanda acrescenta que, mais que comer, o público tem que sentir vontade de se sentar naquela mesa e entrar no clima da foto.

Uma das estratégias da dupla é humanizar a imagem. “Sempre colocamos os elementos num contexto que leve a pensar que existem pessoas ao redor, por mais que não tenha. Parece que alguém está comendo, que passou por ali, é como se as fotos tivessem vida”, destaca Anna. Ou seja, a toalha não vai estar totalmente esticada, o talher pode estar fora do lugar ou alguém é enquadrado para compor a cena, como no caso das mãos do garçom servindo o molho no Vecchio Sogno.
MOVIMENTO Já Débora gosta de trabalhar com movimento, por acreditar que este recurso aproxima as pessoas da imagem. No portfólio dela, encontramos uma série de fotografias que estão longe de ser estáticas, entre elas a da cerveja “explodindo”, como se tivesse acabado de ser apoiada na mesa; a do chef Caio Soter esticando o aligot na panela; e a da calda de caramelo caindo em cima da esfera de chocolate recheada com creme de cupuaçu, servida no D'artagnan Bistrô.

Thobias considera a área da gastronomia uma das mais desafiadoras na fotografia. “Todos nós temos contato a vida inteira com comida, então sabemos como ela é. Isso exige um respeito muito grande com os ingredientes”, pondera. Para que a imagem consiga refletir a verdade, o fotógrafo entende que o primeiro passo é dominar a técnica, com o objetivo de mostrar texturas, cores e volumes presentes no prato. Um bom exemplo é a foto do carré de cordeiro com lentilhas estufadas e bacon defumado, que dá a dimensão da altura dos ossos, mostra a suculência da carne e realça o colorido dos legumes.

Dentro de contexto
Se antes a fotografia era para ilustrar o cardápio, em tempos de redes sociais ela tem o poder de levar o cliente até o estabelecimento para experimentar aquele prato. Isso muda a forma como a comida deve ser registrada. “Antes, os empresários e chefs queriam tudo branco, mas isso não surte o menor efeito, não dá nenhuma vontade de comer. Hoje a foto precisa ter uma atmosfera, estar dentro de algum contexto”, compara Amanda Mendonça, fotógrafa do Stúdio Tertúlia.
Fotos de comida contam histórias e Débora Gabrich comenta que, antes do ensaio, precisa entender que história é essa. “Não faz sentido usar a luz do dia para fotografar um restaurante que só abre de noite”, exemplifica. No caso de um bolo, vale incluir na cena farinha, fuet, espátula e medidor para reforçar a ideia de que é um produto artesanal. Muitas vezes, as fotos também passam informação, como a do minigelato no palito de limão siciliano da Fiorella Gelato. O fundo está todo coberto por rodelas de limão para revelar o sabor, “escondido” pela cobertura de chocolate branco.

Já de olho no futuro, Victor Schwaner considera este um bom momento de se pensar em vídeos gastronômicos. “Nós buscamos dinamismo na foto, que seja de alguém brindando, do mel caindo ou do chef finalizando um prato, então imagino que o vídeo é um formato de audivisual ainda mais suculento”, opina o fotógrafo, que já tem investido neste novo formato.
Carré de cordeiro, lentilhas estufadas com legumes e bacon defumado
Chef Cristiano Campos (O Italiano)
Ingredientes
280g de carré francês de cordeiro; 100g de lentilhas verdes; 40g de bacon picado; 10g de cebola; 10g de cenoura; 10g de salsão; 2 dentes de alho; 2 colheres de sopa de azeite; 2 folhas de louro; 1 colher de sopa de manteiga; cebolinha, pimenta-do-reino em grãos e sal a gosto.
Modo de fazer
Corte os legumes em cubos médios. Faça um caldo de base usando os legumes. Leve as lentilhas ao fogo e cozinhe com o caldo de legumes. Acrescente as folhas de louro. Cozinhe as lentilhas até que estejam macias, mas não desmanchando. Refogue o bacon e acrescente as lentilhas. Finalize com a manteiga, sal e pimenta. Pique a cebolinha e reserve na geladeira. Grelhe o carré de cordeiro até o ponto desejado. Finalize com flor de sal e cebolinha.