Escritor Caetano Galindo de perfil, ao fundo vê-se detalhe de antigo casarão

Caetano Galindo diz que cada língua é um fato cultural moldado também pela política

Kate Griffin/divulgação

Caetano Galindo tinha vontade de resumir em livro o que vem lecionando há 25 anos na Universidade Federal do Paraná (UFPR), mas também queria agregar mais um ponto ao projeto Língua Brasileira, organizado por Felipe Hirsch, do qual participou e rendeu uma peça, um disco de Tom Zé, um filme e uma série de eventos no Museu da Língua Portuguesa. 

Nasceu dessa confluência o “Latim em pó”, livrinho muito simpático e surpreendente que chegou para ensinar que não existe língua mãe ou um idioma superior a outro.

A história do português falado hoje por mais de 210 milhões de brasileiros é o fio condutor do ensaio. É uma história que tem passagens pela Roma Antiga, esbarra no latim, é profundamente marcada pelo colonialismo e encontra até explicações no trabalho minucioso de espécies de arqueólogos da língua.

“O português brasileiro e o europeu são uma língua, ou duas?”, pergunta o autor, que, no início do livro, faz uma reflexão sobre fronteiras impostas a idiomas, divisões muito difíceis de serem compreendidas e, muitas vezes, carregadas de vieses políticos.

“O romeno e o moldavo eram a mesma língua numa semana e na outra, por motivos políticos, eram idiomas diferentes. E o que fazer das línguas de contato, o yopará é espanhol com guarani ou é uma nova língua?”, questiona Galindo, que também reflete sobre a influência da política no uso dos idiomas e sobre os aspectos fascinantes do próprio português.

Fatores políticos interferem mais em uma língua do que fatores sociais? Como funciona essa dinâmica?

A sociedade é rainha. A língua é um fato cultural e, como tal, sempre acaba se movendo mais e melhor do que a legislação. Mas a política (como em outros fenômenos sociais) tem também seu papel nessa história. Às vezes “devido” e às vezes desmedido.

O que mais te fascina no português brasileiro?

No meu caso, esse estudo sempre pareceu acrescentar “profundidade” à língua que a gente usa. Como se o fenômeno de repente ficasse 3D. Saber que uma palavra passou por caminhos tortuosos, que ela representa a fusão de várias línguas, que ela carrega uma história de contatos e de interferências... Isso tudo não precisa mudar o que a gente usa hoje – etimologia não é “verdade”, é só o passado –, mas pode, sim, revestir tudo de uma camada ainda mais luminosa.

Qual é o aspecto mais fascinante de estudar a origem dos idiomas, da linguagem e da fala?

Capa do livro Latim em pó tem letras pretas sobre fundo azul-piscina

Capa do livro Latim em pó tem letras pretas sobre fundo azul-piscina

Companhia das Letras/reprodução
Além das características internas da língua, que poderiam fascinar qualquer linguista, em qualquer cultura, o que mais me fascina no português brasileiro é o fato de ser a minha língua. De ser de um jeito que é até difícil de a gente mensurar, né? E de a gente ser tudo o que ele embute, tudo que carrega de contatos, de violências, de silenciamentos e de discretas sobrevivências dessas vozes silenciadas.

“LATIM EM PÓ - UM PASSEIO PELA FORMAÇÃO DO NOSSO PORTUGUÊS”

• De Caetano W. Galindo
• Companhia das Letras
• 228 páginas
• R$ 59,90