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Roteirista de "Bom dia, Verônica" conta como imagina a continuação da série

Raphael Montes diz que manterá o vilão da segunda temporada numa eventual nova safra de episódios. Netflix ainda não confirmou terceiro ano da produção


19/09/2022 04:00 - atualizado 18/09/2022 18:29

A atriz Tainá Müller de cabeça baixa sentada em cama em cena de 'Bom dia, Verônica'
Tainá Müller vive a escrivã policial Verônica Torres na adaptação para o formato de série do livro escrito por Raphael Montes e Ilana Casoy (foto: Netflix/Divulgação)

 
Uma pergunta não sai da cabeça dos fãs da série "Bom dia, Verônica" (Netflix): afinal, haverá ou não uma terceira temporada?. A resposta, nem mesmo o autor da história, o escritor e roteirista Raphael Montes, tem. "Ainda não sabemos", diz ele. 
 
Pela boa recepção de público e crítica, no entanto, é razoável supor que a trama não se esgotará na segunda temporada, cujos seis episódios foram lançados pelo serviço de streaming no mês passado, dois anos depois da estreia da trama original sobre a escrivã de polícia Verônica Torres (Tainá Müller), ambientada numa delegacia paulistana. "Bom dia, Verônica" é baseada no romance homônimo de Raphael Montes e Ilana Casoy.
 
Raphael Montes, contudo, afirma não ter escrito uma linha sequer sobre o destino do missionário Matias Cordeiro (Reynaldo Gianecchini), o vilão da segunda leva de episódios, mas garante ter a ideia do que quer contar em uma eventual continuação da série.

Diferentemente do que ocorreu com o segundo ano da história, o roteirista pretende manter uma provável continuação centrada em Matias, “mas com um novo personagem”, conforme diz.
 

"A gente está cada dia mais em discussões sobre racismo, sobre crimes sexuais, sobre homofobia. Eu, como autor, posso amplificar essas discussões, o que é muito positivo. Infelizmente, situações de racismo, de homofobia, de crimes sexuais, violências em geral continuam a acontecer, porém tudo isso está sendo discutido, e a discussão, para mim, é o primeiro passo para a mudança"

Raphael Montes, escritor e roteirista

 
 
Além de Reynaldo Gianecchini, a nova safra de episódios tem no elenco a atriz Klara Castanho como Ângela, filha do missionário. Os holofotes se voltaram para a série antes mesmo de sua estreia, quando se tornou público (à revelia da atriz) que Klara Castanho sofreu um estupro, engravidou e decidiu entregar a criança para adoção legal. 
 
A partir daí, surgiram informações desencontradas sobre a segunda temporada, como a de que a história teria sido modificada em respeito à atriz, excluindo cenas de um abuso do qual Angela seria vítima por parte do pai. Raphael Montes diz que a obra não sofreu cortes.

 "Desde o início da segunda temporada a gente queria tratar de assuntos muito atuais e, infelizmente, muito comuns nos lares brasileiros, que são o abuso sexual, os crimes sexuais contra a mu lher. E por ser também um tema muito frágil e ser uma série policial, tomamos o cuidado desde o início do projeto", diz.


 Os crimes sexuais cometidos por Matias são, em sua maioria, narrados pelas vítimas. "Damos voz às vítimas, e não ao crime. Por isso, não precisamos fazer mudanças na série quando a questão pessoal da atriz Klara Castanho veio à tona. O que saiu na imprensa foi pura fofoca", afirma.

Outro cuidado observado desde o início do projeto foi o de não criticar nenhuma religião específica – “Sou religioso, tenho formação católica”, diz o roteirista - mas, sim, o uso da religião e da fé como instrumentos de poder e manipulação. 
 
"Na série, o Matias não pertence a nenhuma igreja, a nenhuma religião específica, porque o problema não é a religião, o problema é você usar a religião para influenciar as pessoas", diz Montes, apontando "evidentes deturpações nos últimos anos" da caracterização do Brasil como um Estado laico.
 
O personagem Matias não foi inspirado em uma única figura, mas encontra eco em várias pessoas reais, não somente do Brasil. "Líderes religiosos que usam seu poder para cometer crimes estão por aí. Além dos crimes sexuais do Matias ao longo da série, eles também praticam outros que são uma busca pelo poder. O Matias tem uma espécie de exército que ele cria no orfanato, um exército de fiéis. Isso eu acho que dialoga, de algum modo, com várias questões do Brasil contemporâneo."

Por mais otimista que seja, Raphael Montes não acredita que tão cedo o país consiga se desvencilhar da relação que estabeleceu entre religião e política. "O brasileiro é um povo de muita fé, né?", pondera. "Independentemente da religião, infelizmente temos muitos lobos em pele de cordeiro, muitos falsos samaritanos ainda fazendo uso da fé desse povo para adquirir poder."


Roteiro da série


Assim como no livro, o roteirista teve a colaboração de Ilana Casoy no desenvolvimento do roteiro adaptado para o formato de série. Ele elogia a contribuição dela para a história. “Ela é uma mulher 30 anos mais velha do que eu, com uma grande experiência de vida, de vivências. Além disso, é uma criminóloga, especialista em não ficção", diz. "Várias dessas ressonâncias com o real ela traz e eu transformo isso em ficção, em dramaturgia, é uma parceria muito feliz nesse sentido."
 
Mesmo com a boa repercussão da série, ele não acredita num aumento do número de tramas policiais produzidas pelo setor audiovisual brasileiro, que, segundo ele mesmo observa, segue muito ao sabor das tendências.

"Acredito que as pessoas gostam de boas histórias. Eu sou um defensor fiel de contar boas histórias, tanto que criei junto com a produtora de desenvolvimento, que é a Casa Rodes, para contar histórias de suspense, mistério, terror, mas que prendam o espectador e que gerem comentários e reflexões e façam provocações.” 
 
Ele diz gostar “desse encontro do entretenimento com a pertinência”. “Torço, sim, para que a gente faça mais séries, mais filmes de suspense e policial, um dos gêneros mais feitos nos Estados Unidos e na Europa, e no Brasil a gente ainda não tem tantas séries nesses gêneros".
 
Entre as séries recentes, ele aponta como suas favoritas “Succession” (HBO), “série policial com muito suspense e com dramas familiares”, vencedora do Emmy 2022 na categoria série dramática, e “Severance”, que o deixou bastante encantado. "É uma série que pega um pouco da distopia e também de conversar com a realidade, é uma ficção científica que de algum modo dialoga com a realidade e a cultura da época”. 
 
Raphael Montes se diz fã da utilização das histórias de gênero, como terror, suspense, policial, ficção científica, para debater algum assunto. Não à toa, um de seus filmes favoritos é o sul-coreano vencedor do Oscar “Parasita”.

“São filmes de gênero, mas que mudam o gênero para fazer muito mais do que contar uma boa história”, diz ele, citando o longa nacional “O lobo atrás da porta” como um de seus filmes preferidos. "(O diretor) Fernando Coimbra é incrível", afirma.

APOIO A KLARA Raphael conta que conversou diretamente com Klara Castanho logo quando o caso veio à tona. "Não me manifestei publicamente em mídias sociais justamente por ser um caso de ordem pessoal e que ela não queria que viesse à tona, e veio à tona graças a uma imprensa vulgar que infelizmente nós ainda temos no Brasil", critica. "Na medida em que eu tenho uma relação pessoal com a atriz, fui conversar com ela e oferecer o meu apoio e o meu carinho."
 
Em relação às redes sociais, sem deixar de reconhecer aspectos que podem ser positivos em seu bom uso, ele observa que elas também amplificam discurso de ódio, notícias mentirosas, fofocas, bullyings, violências em geral. "Por isso têm que ser tratadas com muito cuidado."
 
Ele se considera bastante ativo nas redes sociais, onde encontra uma maneira de manter contato com o público, de informar sobre trabalho, de mostrar um pouco da vida pessoal e de manter contato com amigos.

"Eu tento sempre usar as redes sociais para o lado positivo, mas é evidente que o lado negativo por vezes transborda e nos atinge. Assim, a gente tenta seguir adiante, porque você não vai ficar aí se protegendo de tudo. A gente está vivo é para isso mesmo, para enfrentar as situações”, diz.
 
No entanto, o roteirista pondera sobre a amplitude da cobrança por opiniões. “Agora, me assusta um pouco o fato de que todo mundo tem que ter uma opinião sobre tudo. E aí, necessariamente, as opiniões são superficiais, são pouco aprofundadas, têm pouco tempo de reflexão. Sempre tenho muito cuidado, porque eu sei que tudo que vai para a rede social é complicado."


Redes sociais

Ele também usa as redes sociais como ferramenta de trabalho. "Hoje as notícias correm mais rápido, as relações se mantêm mesmo a distância. Antigamente, era por carta, depois por telefone, e hoje em dia a gente consegue ter um contato muito mais próximo. É importante estar nas redes sociais, atento ao mundo que nos rodeia." 
 
Close no rosto da atriz Klara Castanho, com expressão assustada, em cena deBom dia, Verônica
A atriz Klara Castanho interpreta Ângela, filha do missionário criminoso Matias Cordeiro (Reynaldo Gianecchini) na nova safra de episódios (foto: Netflix/Divulgação)
 
 
Neste ano, Raphael Montes comemora 10 anos do lançamento de seu livro de estreia, “Suicidas” (Companhia das Letras). O escritor garante que apesar de sempre escrever histórias que envolvem crime e violência, ele é um otimista e por isso tenta acreditar que o mundo evoluiu ao longo da década. 
 
"A gente está cada dia mais em discussões sobre racismo, sobre crimes sexuais, sobre homofobia. Eu, como autor, posso amplificar essas discussões, o que é muito positivo. Infelizmente, situações de racismo, de homofobia, de crimes sexuais, violências em geral continuam a acontecer, porém tudo isso está sendo discutido, e a discussão, para mim, é o primeiro passo para a mudança."
 
O escritor acredita que a velocidade do mundo de hoje mudou a forma de se contar histórias em relação ao que era 10 anos atrás. "As pessoas hoje em dia se informam mais, conhecem mais sobre diferentes personalidades, as pessoas fazem psicoterapia. Acho que isso faz com que a gente tenha personagens cada vez mais complexos, com falas cada vez mais ágeis."

Ele atualmente está escrevendo o livro "Os discípulos", que espera lançar no ano que vem.


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