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Estado de Minas PANDEMIA

Cancelamento de festas juninas tira o ganha-pão dos forrozeiros

Proibição de aglomerações impede a temporada de são-joão, provocando crise sem precedentes. Sem trabalho, músicos e outros artistas perderam a fonte de renda. Junho e julho serão meses dramáticos


09/06/2020 04:00 - atualizado 09/06/2020 00:59


“O são-joão é o nosso verão.  Junho e julho, para nós, é como a alta temporada de quem trabalha no litoral”. A comparação feita por Fred Letro, zabumbeiro e vocalista do Trio Lampião, resume a preocupação de quem se dedica às festas juninas há mais de 15 anos e se depara com um cenário inédito devido à pandemia da COVID-19. Com o cancelamento e adiamento de eventos em todo o Brasil, artistas vivem a incerteza sobre o futuro, sem trabalho nos meses mais importantes da agenda.

Entre junho e julho, o grupo belo-horizontino chegava a fazer 40 apresentações, conta Letro. “Tinha semana com um show por dia, entre festas juninas fechadas e de empresas, apresentações no interior e eventos abertos.” Até o momento, não há previsão de volta aos palcos. O que resta para o bimestre são as lives, apresentações ao vivo na internet. Porém, o formato ainda não representa uma boa alternativa financeira para os músicos.

PATROCÍNIO

 “Sem o show ao vivo, ou seja, sem poder aglomerar, ficou bem difícil. Vamos fazer lives em junho e julho, um novo formato para nós. Não temos tanta experiência nisso e ainda faltam patrocínios e apoiadores. Para quem atrai mais mídia é mais fácil, acompanhei várias lives de grandes artistas, achei interessante. Mas fica a dificuldade para nós, que fazemos música mais específica e não temos o respaldo gigante como os sertanejos, por exemplo. É uma dificuldade a mais”, lamenta Letro.

Adepto das vertentes tradicionais do forró, o trio mescla baião, coco, xaxado, xote e arrasta-pé. Lampião lançou um EP com músicas autorais, em 2011, e outro, em 2015, resultado de uma turnê pela Europa em 2014, viabilizada pelo edital Música Minas. O futuro é uma incógnita. “A maior preocupação é o rumo que isso vai tomar, quando e como os shows vão voltar. Tudo ficou incerto. Muitos músicos estão angustiados, tem gente abandonando a carreira, casas de shows fechando. Para nós, que dependemos muito dos meses de junho e julho, fica a incerteza. É preciso repensar o nosso trabalho”, afirma Fred.

Vilmar Aparecido, o Vilmar da Lapinha, há 20 anos é um dos protagonistas do concorrido Arraiá do Vilarejo, na Serra do Cipó, na Região Central de Minas, acompanhado pelo Trio Lapinhô. Com as festividades canceladas, ele criou uma rifa para manter as contas em dia. Por R$ 20, os participantes concorrem a um show exclusivo, a ser realizado assim que a pandemia passar. Caso vendesse 100 bilhetes, a apresentação seria na companhia do Trio Lapinhô.

A meta foi atingida, mas o cenário é preocupante. “Graças a Deus, vendi tudo, deu para pagar as contas de maio e sobrou para o pequeno cachê dos outros músicos, mas daqui pra frente não sei como vai ser”, revela Vilmar. Em junho e julho, ele fazia até 10 apresentações em localidades da região, que garantiam as finanças em dia nos meses seguintes. “A preocupação maior é que é uma cadeia, com muita gente envolvida além dos músicos”, explica. Vilmar pretende participar do edital Arte Salva, recém-lançado pelo o governo de Minas, para amparar a classe artística durante a pandemia.

Em quatro décadas de carreira, o cantor e compositor Edson Duarte rodou o Brasil e o mundo. Seu caminho chegou a se cruzar com o de Luiz Gonzaga, Trio Nordestino e Jackson do Pandeiro. Com quase 70 anos, ele se assusta com a pandemia. “Nunca vi nada assim em canto nenhum. Estou passando um perrengue danado. Sem trabalhar, como alguém vive? Tem mais de três meses que não faço um show. Aí o cabra quebra”, lamenta o alagoano. Toda a agenda deste ano foi cancelada, incluindo a turnê na Europa.

“O negócio tá feio, nunca fui de chorar, mas agora sou obrigado a reclamar. Minha grande preocupação é que, recentemente, descobri uma diabetes, quase todo meu dinheiro vai para o tratamento e os remédios. A renda do artista é show. Não tenho aposentadoria. Não comprovei 35 anos de trabalho, só vivi de show e nunca contei que isso fosse acontecer. Hoje, tenho apoio de artistas amigos, dá até vergonha. Sempre vivi numa boa. Gravei 16 LPs, 35 CDs, tenho 460 músicas, um nome grande, mas não tem adiantado”, relata. Ele mora em Vila Velha, no Espírito Santo, e prepara uma live para 20 de junho, às 15h. O horário é pensado também para o público da Europa, onde o forró brasileiro tem grande popularidade. A transmissão será pelas redes sociais, haverá possibilidade de colaboração do público.

Neste ano atípico, projetos na internet surgem como opção para a cadeia que abrange músicos, profissionais da dança, DJs, artesãos e figurinistas. O Fórum Nacional Forró de Raiz, parceria da Associação Cultural Balaio Nordeste e Associação Respeita Januário, criou o festival on-line São-joão na rede, marcado para 12 a 29 de junho. A programação ainda será detalhada. A ideia é oferecer apresentações variadas, inclusive com grandes nomes da música ligados ao forró, e arrecadar fundos para artistas em dificuldades. Tudo será transmitido pelo Facebook e YouTube.

SAFRA

Coordenadora nacional do Fórum Forró de Raiz, a paraibana Joana Alves Silva diz que junho “é como se fosse a safra para o forrozeiro, que plantou o ano inteiro para colher agora”. Junho e julho são o ganha-pão de muita gente. “Especialmente os trios tradicionais, de forró pé de serra, que não faturam tanto como os músicos mais conhecidos. Até para fazer live é difícil. Tem gente vendendo instrumento para sobreviver”, revela. A live leva entretenimento, até colaborando com lares que estão tristes e angustiados nestes dias, mas não resolve todos os problemas”, diz.

Coordenador do Fórum Forró de Raiz em Minas, o produtor cultural Guilherme Veras diz que essa cultura envolve “um amálgama de saberes e fazeres: tem relação com culinária, desenho, estilo e indumentárias, vários outros movimentos culturais que fazem essa interface. Minas tem 54 DJs de forró. BH é a capital mundial da dança do forró, são mais de 80 escolas na cidade. E todas as atividades estão paradas”, lamenta.



O MAIOR SÃO-JOÃO

Em Caruaru (PE) e Campina Grande (PB), que disputam o título de Maior São-joão do Mundo, os festejos ganharão versão inédita on-line. Em 23, 24 e 27 de junho, 17 artistas vão se apresentar em transmissão pelo YouTube, com participação de talentos regionais e atrações nacionais, como Elba Ramalho. Os shows terão cenário junino, sem a participação do público, mas adotando medidas de proteção determinadas pelas autoridades sanitárias.


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