
E afeta. Como afeta. Admito que todos nós somos passíveis de ser tomados por paixões e raivas que nos fazem falar mais do que devíamos. Como disse um sábio, temos dois ouvidos e uma boca e, contrários à lógica, falamos muito mais do que escutamos. A escuta implica em refletir. E é aí que mora o perigo ou a redenção.
Se suportamos a escuta na psicanálise, é por acreditarmos que a expressão de cada um só diz respeito à sua própria verdade, única e singular, capaz de, uma vez escutada, permitir ao sujeito sair do aprisionamento das identificações aos traços familiares e do imaginário que, ao serem repetidos e perpetuados, nos tornaram vítimas de reproduzir valores alheios que se tornaram nossos.
Assim, vamos no escuro, seguindo e errando, talvez mais do que acertando em nossas escolhas e só depois sabendo dos erros, quando já sofremos, produzimos angústias, ansiedades, deprimimos. Vivemos em parte alienados de nossos verdadeiros desejos e conteúdos, isto é, motivados por nossa alienação ao outro. E isto nos faz agir em desconformidade com os limites aos quais seria preciso nos ater para assegurar uma posição tranquilizadora e estabilizante.
Com certeza, sempre haverá faltas e falhas na educação – e nossos pais foram pessoas que erraram. Quem não erra? Impossível também é que as transmissões que recebemos colem 100% e, por isso podemos sem dúvida admitir que da educação recebemos uma parte e outra não. Como educadores sabemos que mandamos as mensagens, mas não controlamos até onde elas serão assimiladas da forma que desejamos.
Educar pessoas é uma das tarefas mais árduas e complexas que enfrentamos na vida, apesar de indispensável. Ela envolve não apenas racionalidade, mas também afeto. É este que nos faz envolver o corpo do bebê desde cedo com nosso calor, olhar, voz, transmitindo a humanização. E deste modo há imprecisão na mensagem e na recepção.
Somos vítimas e algozes ao mesmo tempo. Nossas intenções nem sempre definem o que será resultante de nossos esforços. Como dizemos, às vezes, o tiro sai pela culatra, ou mesmo, atiramos no próprio pé. Quem nunca?
Fato é que nunca podemos desistir do que fizemos e de seus resultados. A culpa não nos ajuda. Angústia e ansiedade não nos tornam menos responsáveis. Não somos apenas vítimas, somos também autores e responsáveis.
E é bom saber que nunca poderemos nos inocentar de termos errado porque a resposta não foi o que esperávamos. Nunca poderemos prever tudo, nem somos deuses para acertar sempre. O que importa é que nos escutemos para lidar com o que vier no futuro. Então, que me desculpem os donos da verdade, hoje me curvo ao real para saber que ninguém pode absolutizar certezas.
Somos produto de como interpretamos o que vivemos com toda complexidade de portarmos em nós um inconsciente, não todo sabido. Toda verdade é relativa e, neste quesito, não é possível controle pleno. Que possamos lidar com ternura daquilo que fizemos e dos resultados, e também de tratar cuidadosamente do que vivemos pelo bem do que virá.