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Diálogo entre Brasil e Índia ainda é desprezado

Brasil e Índia são sociedades em busca de afirmação, abertas à inclusão social e que possuem um imaginário desimpedido e entusiasta do diálogo intercultural


postado em 02/02/2020 04:00 / atualizado em 01/02/2020 21:26


Brasil e Índia são paradoxalmente iguais. Embora separadas em centenas de anos pelo nascimento na história da humanidade, são sociedades em busca de afirmação, abertas à inclusão social e que possuem um imaginário desimpedido e entusiasta do diálogo intercultural. E a espiritualidade indiana ajuda muito quando assegura que toda vez que você iniciar alguma coisa é este o momento certo.

O Brasil é composto de populações vindas dos quatro cantos da Terra. Muitos contatos comerciais são assim fundamentados. E as heranças culturais impulsionam a riqueza da vida local. Por acaso das migrações, entre as grandes nações, a Índia se destaca como uma com a qual o Brasil tem muito menos contato do que o esperado. Por isso, qualquer esforço de aumentar os laços entre os dois países é fundamental para iniciarem e se desenvolverem projetos conjuntos.

Ao contrário da Europa e dos EUA, não há uma grande população de origem indiana no Brasil. Atualmente, a China, desde que se transformou no maior parceiro comercial do Brasil em 2009, tornou-se o país que nos envia o maior número de imigrantes de fora do continente americano.

Sem a vinda de imigrantes em números maiores do que na atualidade, a população brasileira vai crescer em mais 20 milhões de pessoas nos próximos 25 anos e começará a declinar. Em média, é essa a projeção mais recente, tanto do IBGE quanto da Divisão de População da ONU. Tal declínio traz várias complicações e pode ser bom um diálogo com a Índia, que tem excesso de população, é apenas nosso décimo parceiro comercial e pode ser a maior economia do mundo lá para o fim deste século.

Os países têm muito a aprender um com o outro, inclusive por conta de dificuldades parecidas. Tanto Índia quanto Brasil são péssimos na alocação mais produtiva de seus recursos. E nenhum deles considera sua gente seu principal recurso econômico. Em virtude disso, se somar desocupação, subocupação e desalento da população em idade economicamente ativa, tem-se um retrato da desorganização econômica e social que limita o crescimento dos dois países. Ainda que ao governo não caiba contratar essas pessoas, deveria se interessar pela organização do sistema econômico de forma menos elitista e acadêmica, dando logo um jeito de considerar o trabalho, e não o fiscal, o imposto e o jeitinho, como principal fator de produção e dignidade humana.

Em 2019, Abhijit Banerjee e Esther Duflo ganharam juntos o Nobel de Economia e publicaram um livro muito interessante cuja tradução seria Boa economia para tempos difíceis. Nascido em Bombaim, Banerjee é casado com Duflo, nascida em Paris. O casal se encontrou na região de Boston, onde ambos estão desde os anos 1990 afiliados ao Instituto de Tecnologia de Massachusetts, o MIT. Ambos têm cidadania americana, sendo que Banerjee teve que abrir mão da cidadania indiana por conta da restrição que a Índia tem à dupla nacionalidade.

Boa parte das considerações do livro são baseadas em pesquisas e experimentos que realizaram na Índia. Um dos exemplos é a dificuldade que a Índia tem de colocar no mercado de trabalho a população com mais de 10 anos de escolaridade, entre 20 e 30 anos de idade. Segundo o dado mais recente de que dispunham, 26% dos homens indianos com essas características não estavam trabalhando. De acordo com as entrevistas que realizaram, uma parte fundamental do problema é uma desconexão de expectativas. Há uma discrepância entre níveis crescentes de educação (e as expectativas geradas) e níveis decrescentes de oportunidade de trabalho.

Como também é comum no Brasil, a saída- padrão buscada na Índia por essa população educada é ficar esperando por uma aprovação em concurso público. Porque, em países problemáticos, os cargos públicos são absurdamente mais atraentes do que os empregos na iniciativa privada. Como não tem em quantidade para todo mundo, existe uma enorme fila. Ao ficarem por tempo indeterminado nessa fila, não apenas a vida pessoal é desgastada como a economia do país sofre muito.

De semelhante maneira, comparando hábitos de administração e de investimento em firmas indianas com relação a americanas, Banerjee e Duflo apontam para a regra na Índia de baixo investimento e preparação organizacional para o crescimento. Chamam a atenção para o que em hindi é o jugaad, conceito muito parecido com o jeitinho brasileiro.

O jugaad é visto como muito positivo na Índia, e de fato o é naquilo que tem de criatividade, espontaneidade e capacidade de adaptação. Mas a resiliência já está virando outra coisa. Uma boa desculpa adaptativa que penaliza a produtividade ao manter o investimento no trabalho muito abaixo do que é necessário para um crescimento sustentável. (Com Henrique Delgado)

* Paulo Delgado, sociólogo

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