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Estado de Minas DA ARQUIBANCADA

O Galo não ganha se a gente não se comove

O Galo é uma máquina de fazer homem chorar. O Galo nunca ganha quando a gente não se comove


11/03/2023 04:00 - atualizado 11/03/2023 07:49

Torcida do Atlético
Quando a gente ganhou a Libertadores de 2013, escrevi da arquibancada do Mineirão, morrendo de chorar: "Queria ter braços gigantes para abraçar toda essa gente" (foto: ALEXANDRE GUZANSHE - 24/7/2013)


Comentei com um amigo que a coluna anterior, sobre a morte da Fabi, tinha provocado um tsunami de amor, expresso nas milhares de mensagens que recebi ao longo da semana. E que isso havia me comovido a tal ponto, que me achava desidratado de tanto chorar. Agora, disse a ele, estava sentado em frente à página em branco sem saber como continuar.

Precisava voltar ao tema do futebol, ao assunto que afinal ocupava, até outro dia, os 10% da minha cabeça animal (percentual que a gente efetivamente usa, segundo o Raul Seixas) – o Clube Atlético Mineiro, o espaçoso inquilino das nossas mentes e corações, esse MST assentado em nossa massa cinzenta.

“Fale de banalidades”, aconselhou o amigo palmeirense, união sinistra que ninguém segura. Um bom cronista é artista especializado na escultura das ideias a partir de banalidades diversas, do comezinho da vida, do trivial que nos escapa. O Antônio Prata, corintiano, é de longe o meu preferido da atualidade. Um incrível ordenhador de pedras, um Krajcberg da conversa fiada. Eu adoro esse cara.

Na minha particular obsessão sobre o tema que desejava inutilmente evitar, pensei aqui com meus botões: não há qualquer originalidade em se morrer, e a morte, nesse sentido, é a maior banalidade da vida – a única certeza, como diz o outro. No entanto, ela agora me comove mais do que mil luas, mais do que mil conhaques que pudesse beber o Drummond.

Tento explicar à terapeuta a qualidade do meu choro. “Ele não é de desespero nem de revolta. Eu choro de emoção.” Sim, eu sou emocionado, sou um homem que chora, e agora, então, tenho preferido o Gatorade ao conhaque, de modo a repor o líquido perdido. “Vou te contar uma coisa sobre a relação entre a minha pessoa e o meu time de futebol”, digo, sempre confiante de que todos sabem que 11 homens de listrado correndo atrás da bola é a mais perfeita metáfora da vida. Vou em frente, corajoso.

“Quando eu era pequeno, as derrotas do Galo me feriam de tal forma, que eu chorava desesperado, um choro profundamente doído, sufocante, como que a expurgar todas as injustiças do mundo, dos homens e de Deus. De repente, calculo que ali pelos meus 30 anos, e sem nenhum motivo que eu possa me recordar, passei a chorar apenas nas vitórias. A derrota me faz indiferente. A vitória me arranca a mais desbragada das emoções. Eu choro o gol no final, a catarse da minha torcida, o título impossível que eu sempre sonhei.”

Chorar pacifica tudo, dá um soninho bom, restaurador, se puder entregar-se à pestana que se sucede ao colapso nervoso. Sem querer parecer um idiota, mas já parecendo, volto ao futebol: depois de chorar os títulos mais importantes das nossas vidas, eu me entreguei ao que nem era mais a pestana, mas um estranho período de hibernação.

Por longos meses, não conseguia mais me emocionar. Depois de 2013, por cerca de 8 ou 9 meses fui secretamente um falso torcedor, acometido por aquela falta de sensibilidade do isentão, aquele inabalável coração de pedra, um Michel Temer das arquibancadas. A virada sobre o Flamengo na Copa do Brasil de 2014, o 4 a 1 eterno, veio me resgatar desse desalmado estado de torpor.

Depois de 21, passei todo o ano de 22 sem qualquer sentimento sobre o Atlético. Eu era a Gal cantando “socorro, não estou sentindo nada, nem medo, nem calor, nem fogo. Não vai dar mais pra chorar, nem pra rir. Socorro, alguma alma mesmo que penada me entregue suas penas. Já não sinto amor, nem dor, já não sinto nada”.

Socorro! Então veio 23, e por motivos que têm a ver com a Fabi, estou comovido como o diabo. Todas as mensagens que me chegaram, uma maioria de atleticanos, uma gente tão maravilhosa, me fez chorar com o Galo depois de tanto tempo. Quando a gente ganhou a Libertadores de 2013, escrevi da arquibancada do Mineirão, morrendo de chorar: “Queria ter braços gigantes para abraçar toda essa gente”. Faço isso agora, em nome da Fabi e de toda a minha família.

O Galo é uma máquina de fazer homem chorar. O Galo nunca ganha quando a gente não se comove. Pois agora eu acho que a gente vai ganhar é tudo. Vai passar na quarta-feira, vai ganhar o Mineiro. E levaremos todos ao Mundial os nossos corações de pedra. Socorro! Vamo, Galo, pelamordedeus.


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