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Estado de Minas DA ARQUIBANCADA

O Galo não é campeão. O Galo está sendo campeão

Mas como somos feito Galo escaldado, vamos curtindo esse momento especial como um presente mais que merecido


13/11/2021 04:00 - atualizado 13/11/2021 07:37

Filho do colunista junto à torcida do Atlético
Na festa da torcida do Atlético, muitos rostos, alguns familiares: o que importa a essa altura é a felicidade coletiva (foto: PAULO AFONSO/TWITTER)

“Tá acontecendo”, disse um querido amigo, como se me beliscasse. E assim, no gerúndio, me pareceu tudo muito melhor. O Atlético ainda não é o campeão porque aqui só tem Galo escaldado. E o atleticano, carcomido pelas dores do passado, é o mais patológico dos torcedores em todo o mundo: doente, porque fanático ao ponto do débil mental. Mas também porque os anos de chumbo o fizeram completamente dodói.

Assim, inventamos dificuldades inexistentes. “Contra o Corinthians será duríssimo”; “Zero a zero é vitória, temos gordura pra queimar”; “Tenso”. Mas a realidade é um Zaracho a meter duas canetas na gente. Foi dia de acender luzinha na arquibancada, de chamar a ola pra rodar o Mineirão. Enquanto lá embaixo o passeio se apresentava um baile de proporções humilhantes. Time de casados da firma contra uma equipe de profissionais.

O Galo não é campeão – o Galo está sendo campeão. E o gerúndio é uma lição de vida, porque faz do momento presente um tempo elástico e infinito. O passado já era e o futuro é ficção, o que importa de fato é viver o aqui e o agora – eis o exercício que cura desde o arrependimento dilacerante até as doenças mais graves, cura a separação e a falta de um casamento.

O gerúndio é a maior viagem. Acredite, atleticano: melhor se entorpecer dele do que propriamente chegar ao destino. Engalfinhe-se na carnificina por um ingresso, mas vá ao Mineirão enquanto é tempo. “TIRA A CAMISÁ! TIRA A CAMISÁ”, cantávamos nos anos 90. Pois vá lá rodar a camisa em direção aos céus, cantar até o infarto iminente, beber tudo que puder e abraçar os desconhecidos na hora do gol, como se não houvesse a COVID e nem o amanhã. Porque, enquanto tiver o gerúndio, o amanhã terá de esperar. E, por ora, aproveite, porque vigora a lei: ao atleticano está proibido morrer.

Houve com um diretor de Redação, jornalista famoso, que detestava o gerúndio (não o dizia sequer em carta). Para ele, o governo nunca estava tirando dos pobres para dar aos ricos – estava a tirar. A Faria Lima não estava apoiando um miliciano – estava a apoiar. Trabalhava com a gente o Nirlando Beirão, corintiano e atleticano, infelizmente nessa ordem (que conflito de interesses deve ter-se estabelecido em seu coração no bailão de quarta). O gerúndio é tão perfeito que Nirlando morreu, mas Nirlando não morre, segue com a gente, bem, a nirlar.

Lá nas mesas redondas de São Paulo perguntam quando o atleticano vai se dizer campeão. O atleticano silencia, pois o mineiro que produz queijos e possui bancos sabe que aquele que fala por demais acaba dando bom dia a cavalo. “Sigamos confiantes e contidos”, rezou um amigo com sua barba de Maomé, uma vida inteira a esperar (quer dizer, esperando) o nosso título impossível. “Só uma tragédia tira esse campeonato do Atlético”, diz o paulista na televisão. Amigo, de tragédia temos mestrado, doutorado em Harvard, pós-doc e uma edição inteira da Lancet.

No gerúndio produzimos o silêncio que precede a explosão. Que ela chegue repleta do mais louco amor que se possa imaginar. Que a gente chore tudo que tiver pra chorar, porque o atleticano é uma pessoa tão maravilhosa que, diante de todo o sofrimento que viveu, em vez de ficar amargo ele desaprendeu a chorar nas derrotas e passou a chorar apenas nas vitórias. Que essa explosão acorde todos os atleticanos mortos, aquele seu tio, o meu primo, o Felipe, filho do Wagner, aquele outro que morreu no Independência. A gente era menino e achou que veria isso com nossos pais, escreveu o jornalista Victor Martins. Vamos ver com os nossos filhos. Que sorte eles têm!

***

Encontro no Twitter a imagem do meu menino no Mineirão lotado (foto acima). A camisa na mão, rodando. Os braços abertos pra Massa, a mão espalmada pro alto, a expressão da garra e da mais louca alegria. Ele tem o peito nu, tão menino, tão criança. Seu pai, eu, de costas do seu lado. Eu não sou velho, segundo a fotografia. Prova de que ele ainda é o meu menino. O gerúndio paralisado na fotografia. O retrato cuja legenda seria: “Está acontecendo”.
 
Tomara que dure para sempre, e que nunca chegue a hora em que ele, atleticano velho, vai olhar esse retrato na parede como a gente olha aquele outro – dos atleticanos girando as bandeiras sobre o teto de um ônibus parado na orla de Copacabana em dezembro de 1971. Nunca importou se era ou não era 71. O passado e o futuro não existem, a verdade mora é no gerúndio.

Seremos campeões brasileiros, pessoal. Está acontecendo.

***

“Lutar, lutar, lutar”, o filme do Galo, chega aos cinemas neste fim de semana nos principais shoppings de BH e também no Belas Artes. Além de RJ, SP, Brasília, Porto Alegre, interior de Minas. Vá fornido de muito lenço, porque este Galo é uma máquina de fazer a gente chorar.


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