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Estado de Minas DA ARQUIBANCADA

Contra o fascismo, erguendo o punho cerrado pela democracia

Agora estou diante da imagem de um negro vestido com uma camiseta em cuja estampa se vê Malcolm X. Acossado pelos fascistas, ele ergue o punho cerrado


postado em 02/06/2020 04:00 / atualizado em 01/06/2020 20:56

À esquerda, manifestante antirracismo e antifascista, à direita, ativista pró-Bolsonaro: grupos disputaram as ruas no fim de semana no Brasil(foto: TABA BENEDICTO/ESTADÃO CONTEÚDO)
À esquerda, manifestante antirracismo e antifascista, à direita, ativista pró-Bolsonaro: grupos disputaram as ruas no fim de semana no Brasil (foto: TABA BENEDICTO/ESTADÃO CONTEÚDO)


A quarentena está para este pobre escriba como o Dreher para Drummond: “Eu não devia te dizer, mas essa lua, mas esse conhaque, botam a gente comovido como o diabo”. Então, vejo as fotos dos policiais de Miami primeiro ajoelhados diante dos manifestantes negros, depois abraçados a eles como a reconhecer os séculos de genocídio. A exemplo do Vilibaldo Alves nos últimos minutos da decisão de 1971, “lágrimas escorrem em minha face”. Dizia ele, com sua matraca de narrador, “quareeeeeeeenta e cinco minutos!”. Alguma coisa de muito especial está para ocorrer.

Agora estou diante da imagem de um negro vestido com uma camiseta em cuja estampa se vê Malcolm X. Na Avenida Paulista, ele denuncia um grupo de manifestantes bolsonaristas que carregam a bandeira ucraniana adotada pelos neonazistas de todo o mundo. É Emerson Balboa, liderança da Gaviões da Fiel em Osasco, cidade vizinha a São Paulo. Acossado pelos fascistas, ele ergue o punho cerrado. “Aqui é democracia!”, grita. E permanece, impávido que nem Muhammad Ali, sereno como o doutor Sócrates, cercado como o Reinaldo no Maracanã lotado. Ninguém encosta a mão. Alguma coisa está para acontecer.

Na mesma via, de repente surge em marcha a Gaviões. “Ih, fodeu, a Galoucura apareceu”, ocorre a este alvinegro treinado no coral do Mineirão. Não estão sozinhos. Estão acompanhados das organizadas antifascistas do Palmeiras, do Santos e do São Paulo. Não são os partidos da esquerda, os sindicatos da CUT, as feministas do Dom Silvério. São o povão, preto e periférico, orgulhoso da sua Democracia Corintiana e conscientes da sua própria história, como povo oprimido e como torcida que se fez na luta contra a ditadura. Quem já viu de perto, sabe como é assustadora a marcha de uma organizada. “Sai, sai da frente, sai que a Galoucura é minha gente!”.

“DE-MO-CRA-CIA! DE-MO-CRA-CIA!”, grita dessa vez o Bando de Loucos. O brado retumba no Rio de Janeiro, onde torcedores unidos de Flamengo e Fluminense reivindicam as ruas, tomadas pelos supremacistas pardos vestidos de CBF. Uma gente que bem sabemos de que lado estaria se crescidos na Alemanha dos anos 30. Gente hipócrita, meu caro Gil, desprovidas de cérebro e coração. Antes, no Sul, gremistas e colorados já haviam inaugurado a união sinistra, com o intuito legítimo de tratar o fascista como ensinam os manuais – na ponta da botina.

Vejo agora os atleticanos descendo a avenida. É a Resistência Alvinegra, a Galo Antifa, velhos pulgas da Galoucura, muitas camisas do Rei. Eu não devia dizer, mas essas coisas botam a gente comovido como o diabo. Veja aí, Caio Ribeiro, o Galo se misturando com a política para defender a sua própria história – o time do preto e do branco, da tolerância racial desde 1908, o time que só não é campeão do mundo porque seu maior craque ergueu o punho cerrado contra a tortura hoje celebrada pelo presidente genocida.

Aliás, não é “o Galo se misturando com a política”. É o Galo defendendo seu patrimônio – a massa de gente que se deseja assassinar pela doença, pela fome, pela exclusão, pelo lucro, pela cor, pelo gênero, pela orientação sexual. “Time de preto, de favelado, mas quando joga o Mineirão fica lotado!” Já ensinou Wilson das Neves: “O dia em que o morro descer e não for carnaval, ninguém vai ficar pra assistir ao desfile final”.

A propósito, este colunista sonhou que o carnaval poderia derrubar Jair Bolsonaro. Depois do suicídio de reputação que o país escolheu praticar, haveríamos de ser salvos pelos foliões: e se ninguém voltasse pra casa na quarta-feira de cinzas, e os blocos parassem a economia e os bêbados tomassem o poder? A ideia me pareceu a única capaz de nos absolver perante o espanto do mundo civilizado sobre o que fomos capazes de fazer com nós mesmos. Agora que alguma coisa está para ocorrer, vislumbro arquibaldos e geraldinos subindo a rampa do Planalto a carregar, unidos, o bandeirão da democracia. “Quem ficar parado vai tomar um tá ligado.”







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