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Estado de Minas

Saída de Collor na memória: parlamentares mineiros divergem sobre processo

Deputados de vários partidos que participaram do processo na Câmara para o impeachment do ex-presidente, em 1992, têm versões distintas para o desfecho


postado em 04/04/2016 06:00 / atualizado em 04/04/2016 07:02

(foto: Raimundo Pacco/ CB/D.A Press - 29/9/1992)
(foto: Raimundo Pacco/ CB/D.A Press - 29/9/1992)

Quase 24 anos depois de aprovada na Câmara dos Deputados a autorização para a instauração no Senado do processo de impeachment contra o então presidente da República Fernando Collor de Mello, os deputados federais mineiros, que participaram da sessão, têm explicações diferentes para o dramático desfecho. Há entre esses atores quem destaque como fator preponderante o fracasso da política de estabilização da moeda após a experiência traumática do “sequestro” promovido pelo governo das poupanças. A esse fato, soma-se, na avaliação de outros, a falta de base partidária de Collor no Congresso Nacional – que havia sido eleito pelo inexpressivo PRN – e a ausência de base social, que se juntaram, num coquetel explosivo às manifestações dos cara-pintadas pelo país, em protesto contra as denúncias de corrupção envolvendo o presidente. Em comum, contudo, a maioria converge para uma avaliação: todo o processo transcorreu sem polarização a retalhar a sociedade: não houve vozes contrárias ao impedimento nas ruas e, no Congresso, poucos se levantaram em seu apoio.


As denúncias que pipocavam desde o início do governo são conhecidas: Paulo César Farias, o ex-tesoureiro de campanha, agiria intermediando negócios entre o empresariado e o governo Collor. Mas elas se agravaram a partir de maio de 1992, quando Pedro Collor acusou o irmão presidente de manter sociedade com PC Farias, que seria seu testa de ferro nos negócios. “Collor não teve um exército aguerrido, organizado para fazer debate no Congresso. O processo foi mais um monólogo a favor do impedimento, já que a opinião na rua era também contra o presidente e não havia movimentos de massa em sua defesa para fazer qualquer contraponto”, avalia Paulino Cícero, na ocasião deputado federal pelo PDS de Minas.


Opinião semelhante do ex-deputado federal Paulo Romano, do PFL, que foi o voto garantidor do quórum mínimo para a aprovação do pedido, ou seja o voto de número 336 – dos dois terços do plenário que naquele tempo tinha 503 parlamentares. “Havia praticamente um só caudal: quem era contrário ao impeachment na sociedade não aparecia. Do lado da Câmara, ele, que já não tinha base partidária, foi perdendo apoios com as denúncias da CPI e também à medida que aumentava a pressão da sociedade e da imprensa”, lembra Paulo Romano, primeiro deputado federal no país de sua legenda, que era da base de sustentação do governo, a se posicionar favoravelmente ao impedimento. Procurado pela tropa de choque de Collor que negociava o apoio de parlamentares, Paulo Romano rechaçou as insinuações de Lafaiete Coutinho, então presidente do Banco do Brasil, para o financiamento de campanhas futuras.

A condução do processo de impedimento no Legislativo também contribuiu para o resultado. O então presidente da Câmara Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) determinou o voto aberto. “A votação foi em 29 de setembro. Em 4 de outubro havia eleições municipais. Eram mais de 200 candidatos a prefeito em plenário, ao vivo e a cores para o país”, sustenta o ex-deputado federal petista Paulo Delgado. Segundo ele, a estratégia usada pelo ex-presidente Collor foi a de apostar na gazeta de parlamentares. “A defesa jogava com a ausência, o silêncio. Mas os deputados começaram a aparecer em plenário”, conta. E cada qual fazia o seu discurso e mandava o recado na hora de gritar “sim”, em favor da abertura do processo.

RELAÇÃO DIFÍCIL Na Câmara, 441 parlamentares – do mínimo necessário de 336 – deram autorização para a instalação do processo de impeachment; 38 foram contrários; 23 não compareceram e um se absteve. “A relação do Collor com o Poder Legislativo sempre foi difícil: como ele não tinha partido, não respeitava as legendas nem os respectivos líderes. A base de sustentação – e o PFL era o maior partido – foi se esgarçando: havia um desgaste grande para defender o governo por um lado e, por outro, nenhuma obra, programa para o deputado levar à sua base”, explica José Santana, à época, no PFL.

O líder do governo na Casa, Humberto Souto, do PFL, foi um  que se manteve leal e sua leitura daquele momento é distinta dos colegas. “As denúncias de corrupção eram contra PC Farias e não estavam no âmbito do governo.” Para ele, o governo Collor apresentava um bom desempenho e as manifestações de rua seriam “pequenas passeatas dos cara-pintadas”. “Foi um movimento de partidos, porque Collor tinha ganho sozinho de todos no Brasil, contrariando os caciques da política nacional. Ele não fez acordo, não negociou ministério”, garante Souto, contrariando o relato do de Paulo Romano.

Sem legenda e sem base de sustentação, sem apoios na sociedade civil, com graves denúncias envolvendo diretamente o presidente da República, tão isolado estava Collor que, mesmo depois de sua renúncia, em 29 de dezembro, e horas depois de já empossado o vice Itamar Franco, o processo de impeachment seguiu no Senado Federal. Josaphat Marinho, senador e jurista do PFL baiano já falecido, esteve entre os poucos que entendeu não haver mais cabimento o prosseguimento do julgamento. E o impeachment passou contra um presidente que já não estava mais no exercício do cargo. “A tese do Josaphat Marinho estava absolutamente certa”, afirma Tarcísio Delgado, que era líder do PMDB na Câmara dos Deputados. Doze anos depois, por falta de provas, Collor foi absolvido pelo Supremo Tribunal Federal dos crimes de peculato, falsidade ideológica e corrupção passiva.

Diferenças marcantes
Além da polarização de uma sociedade dividida entre apoiadores e opositores ao impeachment de Dilma Rousseff e da sustentação dos partidos políticos ideológicos de sua base parlamentar, duas condições com as quais não contou Fernando Collor: a postura do então vice-presidente da República Itamar Franco é um dos pontos que também distingue os dois processos de impedimento do presidente da República instaurados na Câmara dos Deputados.

“Diferentemente do Michel Temer, que foi eleito vice-presidente e o seu partido, o PMDB, participou ativamente até agora dos dois governos, Itamar Franco foi discreto. Ele havia sido alijado por Collor antes mesmo da posse. Como mineiro, sabia que o vice tem o dever da discrição e da lealdade”, afirma Tarcísio Delgado, ex-líder do PMDB na Câmara dos Deputados. Com Delgado faz coro Paulino Cícero: “Itamar franco ficou em silêncio, sem tomar nenhum tipo de iniciativa para congregar forças a seu favor”. Voz dissonant tem o ex-líder de Collor na Câmara Humberto Souto: “Itamar articulou com os governadores que pressionaram as bancadas. Collor caiu por isso”.

Golpe ou crime de responsabilidade, para caracterizar as acusações que embasam o processo de impeachment de Dilma, eis um questionamento que divide ex-parlamentares. Enquanto para Humberto Souto as denúncias de corrupção envolvendo Collor seriam “um milésimo” daquelas contra o atual governo, o ex-pefelista José Santana, no PR, declara: “No caso Collor havia elementos. Contra a Dilma há pedaladas, sinal de incompetência, mas que não constituem crime de responsabilidade e são cometidas por todos os governos, inclusive o de Fernando Henrique Cardoso”.


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