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Estado de Minas

Relatos dos anos de chumbo causam comoção em audiência pública da Comissão da Verdade

Relatos de parentes de vítimas da ditadura militar sobre a romaria em busca de informações emocionam estudantes que compareceram à audiência pública da Comissão Nacional da Verdade


postado em 23/10/2012 06:00 / atualizado em 23/10/2012 07:55

A luta para conhecer o paradeiro de uma irmã e dois sobrinhos presos durante o regime militar contada por Ângela Pezzuti emocionou desde antigos colegas de militância política – que já conhecem bem sua história – até estudantes secundaristas que ouviram pela primeira vez o relato de alguém que viveu de perto a repressão. Nessa segunda-feira, em audiência pública da Comissão Nacional da Verdade (CNV) na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) o depoimento da aposentada foi um dos pontos altos do encontro, que reuniu ex-estudantes da instituição vítimas da ditadura, familiares que sofreram violações de direitos humanos e alunos da universidade e de outras escolas mineiras.

“Participei de uma época muito triste para nosso país, mas também muito rica em experiências. Em 1969, quando minha irmã, Carmela Pezzutti, e meus sobrinhos Ângelo e Murilo foram presos, começou minha romaria para saber onde eles estavam, se estavam vivos ou machucados”, lembra Ângela. Ela narrou a história de sua família ao longo dos anos 1970, buscando informações e garantias de representantes políticos de que seus familiares não seriam mortos pelo regime, a um auditório lotado. “Em um presídio no Rio, depois de muita luta para vê-los, encontrei os dois em estado deplorável, quase como vindos de um campo de concentração de tão magros e doentes. Eles me contaram que viviam a tortura dia e noite e temiam não aguentar por muito tempo”, narrou.

O depoimento foi o que mais chamou a atenção das estudantes Júlia Linhares e Fernanda Dutra, alunas do 3º ano do Colégio Santo Antônio, que foram à audiência. “Essa agonia de não saber o que aconteceu com pessoas de que você gosta, não saber nem mesmo se estão vivos ou mortos, é uma coisa terrível. Talvez ainda existam muitos casos que ninguém conhece e que precisam ser melhor investigados”, questiona Fernanda. Sua colega Júlia, também apontou o depoimento de Ângela Pezzuti como o mais emocionante. “São histórias pesadas. Como gosto muito de história e me interesso pelo assunto, não poderia deixar de acompanhar de perto o trabalho desse grupo aqui em Minas”, disse.

O tom emocional começou na homenagem feita na abertura, quando imagens de 11 estudantes mineiros mortos ou desaparecidos durante o regime militar receberam aplausos e gritos de agradecimentos dos estudantes presentes. Em seguida, Rosa Maria Cardoso, integrande da CNV, apresentou os trabalhos que estão sendo feitos pelo grupo desde sua criação em maio e destacou a importância da participação da sociedade para a construção do material final da comissão que será entregue em maio de 2014. “Viemos para uma audiência temática para ouvir e debater a violência vivida dentros das universidades, contra estudantes, funcionários e professores. É uma das nossas frentes de trabalho que ajuda a construir esse nosso passado, ao lado da sociedade civil e das instituições. A outra frente está em andamento com nossos grupos de trabalho, com levantamento de informações sobre temas específicos como os fatos no Araguaia, os locais e aparelhos de repressão e os mortos e desaparecidos”, explicou Rosa.

Memoriais

Hoje, os integrantes da comissão – além de Rosa Cardoso, estão na capital mineira José Carlos Dias e Maria Rita Kehl – se encontram com representantes da sociedade civil na sede da seção mineira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG) para solicitar que os prédios utilizados pelo regime militar no estado sejam transformados em memoriais, como é o caso da sede do Dops, na Avenida Afonso Pena. A entidade assinou ontem um convênio com a CNV para participar na troca de informações e de arquivos reunidos no estado. Depois, os representantes da comissão serão recebidos para um almoço pelo governador Antonio Anastasia (PSDB). Um dos temas em discussão é a parceria já em andamento para a digitalização do acervo do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos (Conedh), que recentemente revelou documentos até então desconhecidos sobre locais de tortura usados pelos militares durante o período.

Vínculo com dilma

Ângelo Pezzuti da Silva, filho de Ângela, foi um dos líderes do Comando de Libertação Nacional (Colina), grupo de combate à ditadura que a presidente Dilma Rousseff fez parte, quando morava em Belo Horizonte. As ligações dela com Pezzutti foram os principais motivos da tortura que a presidente sofreu em Juiz de Fora, conforme revelado pela série de reportagens A tortura de Estela contada por Dilma, publicada pelo Estado de Minas e finalista do Prêmio Esso de Jornalismo. “Não era sobretudo sobre minha militância em Minas Gerais. Supuseram que, tendo apreendido documentos do Ângelo (Pezzuti) que integram o processo, achavam que nossa organização tinha contatos com a PM ou PC mineira que possibilitassem fugas de presos. Acredito ter sido por isso que a tortura foi muito intensa, pois não era presa recente; não tinha ‘pontos’ e ‘aparelhos’ para entregar”, conta Dilma em parte do depoimento revelado pelo EM. Um dossiê encontrado no Arquivo Nacional, em Brasília, guarda um depoimento de Pezzuti, que confirma ter escrito um bilhete solicitando a Dilma ajuda para fugir da prisão.

 


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