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Estado de Minas

Supremo assume função dos outros poderes e avalia caos no sistema prisional

Acostumados a analisar questões para as quais Executivo e Legislativo não têm solução, ministros da Corte agora terão que avaliar em ação inédita tema sobre segurança pública


postado em 14/06/2015 07:54

Ministros no plenário do STF, onde, com frequência, caem temas nem sempre afeitos à Corte constitucional(foto: Nelson Jr./SCO/STF )
Ministros no plenário do STF, onde, com frequência, caem temas nem sempre afeitos à Corte constitucional (foto: Nelson Jr./SCO/STF )
Sobre a mesa dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) estão ações para definição de regra sobre temas nem sempre afeitos ao Judiciário. Diante da omissão dos poderes Executivo e Legislativo, não resta outra opção se não apelar à Corte constitucional do país. Os exemplos são muitos, como a decisão sobre o financiamento privado de campanhas eleitorais, que ainda aguarda parecer do STF, a questão das bibliografias não autorizadas, analisada na quinta-feira pelos ministros, apesar de existir matéria tramitando no Congresso há anos, e ainda a forma de pagamento de precatórios, que teve regras estabelecidas também pelos ministros. Agora, de forma inédita, chega à Corte, outra matéria de responsabilidade do Executivo: o enfrentamento e solução para a falência do sistema penitenciário no país.

O PSOL acionou a Suprema Corte, por meio da Arguição de Descumprimento do Preceito Fundamental (ADPF) nº 347, para pedir “providências para sanar lesões a preceitos fundamentais, previstos na Constituição Federal decorrentes de atos e omissões dos poderes públicos da União, dos estados e Distrito Federal no tratamento da questão prisional do país”. O advogado do partido, André Maimoni, concorda que é a omissão dos outros poderes que faz com que seja necessária a interferência do STF. “Esse é um assunto político, de competência do Legislativo e do Executivo, mas é como a síndrome do afogado, que te faz agarrar onde puder.” Na ação, o PSOL pede até mesmo medidas liminares, para adoção de critérios mais rigorosos na decretação de novas prisões preventivas e ainda a imediata instalação das audiências de custódia, para evitar prisões em flagrante desnecessárias.

Somente nos seis primeiros meses primeiros deste ano, foram registradas cinco rebeliões nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Bahia. A grande maioria em razão da superlotação e, em comum, tiveram também o emprego de violência. No Rio Grande do Norte, rebeliões aconteceram em março em unidades prisionais do estado e foi necessária até mesmo a convocação de uma força-tarefa para enfrentar o problema, além do reforço da Força Nacional para controlar os rebelados. E pior. O motim resultou ainda na destruição de mais de mil vagas no já combalido sistema prisional potiguar. Em Minas, na última semana, presos se rebelaram também em Governador Valadares e o saldo foi trágico: dois detentos mortos e seis feridos (veja quadro).

De acordo com o advogado André Maimoni, a ação por descumprimento de preceito fundamental é usada com sucesso em outros países. Entre eles, a Colômbia, que, em razão da pouca tradição de movimentos populares e de sua jovem democracia, recorreu à sua Corte para resolver problemas sociais. Maimoni diz ainda que os Estados Unidos também experimentaram esse tipo de intervenção para a garantia do estado constitucional. No Brasil, a ação inédita tem como relator o ministro Marco Aurélio Mello, que ainda não analisou o pedido.

PLANO Na ação, o PSOL pede, entre outras decisões, que a Corte determine “ao governo federal que elabore e encaminhe ao STF, no prazo máximo de três meses, um plano nacional visando a superação do estado de coisas inconstitucional do sistema penitenciário brasileiro, dentro de um prazo de três anos”. Pede, ainda que os ministros determinem metas para uma série de outras ações, passando o STF a ter o controle das medidas executivas de superação do problema. A ação foi elaborada por advogados da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), coordenados pelo professor Juarez Tavares e por Daniel Sarmento, com a colaboração de Maimoni.

Além da violação da Constituição, o texto inicial da ação informa que a situação de caos nos presídios é conhecida por todos, até mesmo pelos ministros do Supremo. O presidente da Corte, Ricardo Lewandowski, considera que o drama nos presídios é um dos dois grandes problemas do Poder Judiciário brasileiro. Por sua vez, o ministro Celso de Mello ressaltou o “descaso, negligência e total indiferença do estado”, com o setor. Uma realidade que despertou a indignação de outro integrante da Corte, Gilmar Mendes, que afirmou: “As péssimas condições dos presídios, que vão desde instalações inadequadas até maus-tratos, agressões sexuais, promiscuidade, corrupção e inúmeros abusos de autoridade, criam verdadeiras escolas do crime controladas por facções criminosas”.

De acordo com a ação, o Brasil tinha, em 1990, cerca de 90.000 presos. Em maio de 2014, este número ultrapassou a casa do meio milhão: 563 mil presos, sem considerar os mais de 147 mil em regime de prisão domiciliar. Desta forma, hoje, o número ultrapassa os 600 mil, o que faz do Brasil o quarto país com maior população carcerária do planeta, atrás apenas de Estados Unidos, China e Rússia. Segundo a ação, “nesse intervalo de 25 anos, o aumento da população prisional brasileira, em números reais, foi de mais de 650%”.

Rebeliões em 2015

19 de janeiro – Detentos se rebelam em três penitenciárias da Zona Oeste de Recife. Três presos são mortos – um deles decapitado –, entre eles um sargento da Polícia Militar. Vinte e nove pessoas ficaram feridas. A rebelião foi motivada pela superlotação.

Em 16 de março – O estado do Rio Grande do Norte decreta estado de calamidade em razão de rebeliões desencadeadas em várias unidades prisionais. Foi necessária a criação de força-tarefa para contenção dos rebelados e ainda adoção de medidas urgentes, como construção e restauração de unidades.

25 de maio – Presos se rebelam no pavilhão 10 do Presídio Regional de Feira de Santana (BA) e fazem como reféns mulheres e crianças. Durante o motim, sete presos são mortos, um deles decapitado. O local tem 13 pavilhões e apenas sete abrigam 1.647 presos.

7 de junho – Em Governador Valadares, Vale do Mucuri, presos mataram dois reféns e feriram seis durante protesto contra superlotação. O presídio da cidade tem capacidade para 290 detentos e abriga 800.

8 de junho – Noventa e dois adolescentes se rebelaram na Unidade Rio Negro da Fundação Casa, em São Paulo, e fizeram 10 reféns.


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