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Estado de Minas

Manifestações que tomaram o Brasil completam um ano

Em 2013, 50 mil pessoas protestaram contra Copa do Mundo em BH. Este ano, manifestações foram esvaziadas graças à polícia e à falta de apoio da população


postado em 22/06/2014 07:00 / atualizado em 22/06/2014 15:28

Daniel Camargos

Avenida Antônio Carlos se transformou em campo de batalha. Policiais e manifestantes se enfrentaram durante jogo do Brasil x Uruguai, há um ano(foto: Cristophe Simon/AFP)
Avenida Antônio Carlos se transformou em campo de batalha. Policiais e manifestantes se enfrentaram durante jogo do Brasil x Uruguai, há um ano (foto: Cristophe Simon/AFP)

Manifestantes atiram pedras e devolvem as bombas de gás lacrimogêneo e gás de pimenta atiradas contra eles pelos policiais; um jovem cai do viaduto e morre; várias lojas, principalmente concessionárias de veículos, e agências bancárias são completamente destruídas; uma massa de aproximadamente 50 mil pessoas solta o grito que marcou os protestos naqueles dias de junho: “Não vai ter Copa”. Quem presenciou as cenas que transformaram a confluência das avenidas Antônio Carlos e Abrahão Caram, próximo ao Mineirão em uma praça de guerra, poderia pensar que realmente não seria realizada a Copa do Mundo. Na quarta-feira, porém, completa-se um ano da maior manifestação anti-Copa de Belo Horizonte, e o Mundial é elogiado nos quatro cantos do planeta como um dos melhores já realizados. Enquanto isso, as manifestações perdem fôlego e os protestos carecem do apoio popular, ficando reduzidos a grupos de extrema esquerda e a pautas específicas, como a redução da tarifa de ônibus e regulamentação das ocupações urbanas.

Para o sociólogo Rudá Ricci, membro do Observatório Internacional da Democracia Participativa e autor do livro Nas ruas – A outra política que emergiu em junho de 2013, lançado pela Editora Letramento, uma conjunção de fatores afastou as multidões das ruas. Os dois principais, segundo ele, foram a violência presente nos protestos e as estratégias dos governos, que criaram pânico na população, com medidas drásticas. Uma dessas leis é a que foi sancionada na semana passada pelo governo Alberto Pinto Coelho (PP), que restringe o uso de máscaras em manifestações. “Uma lei que depõe contra o direito civil”, pontua o sociólogo.

Outro motivo, segundo a análise de Ricci, é que a Copa do Mundo é a maior efeméride nacionalista do Brasil. “É o único momento em que as pessoas choram quando toca o Hino Nacional”, afirma. Para o sociólogo, é muito difícil superar esse sentimento. Mesmo assim, ele identifica que as pesquisas apontam que a população permanece insegura em relação às conquistas sociais e também avalia que o governo gastou mais do que deveria com a Copa. “São dois sentimentos que correm em paralelo. A indignação e o sentimento em relação ao Mundial”, explica.

TARIFA ZERO Até o momento, o movimento mais atuante em Belo Horizonte é o Tarifa Zero, criado a partir de um grupo de trabalho da Assembleia Popular Horizontal (APH). Nos dias que antecederam o Mundial, seus ativistas fecharam as ruas e avenidas da cidade por diversas vezes e despertaram a revolta de grande parte das pessoas que ficava presa no engarrafamento. A quantidade de apoiadores, no entanto, não lembra nem de perto as multidões do ano passado. Além do Tarifa Zero, mais de uma dezena de grupos e partidos políticos de extrema esquerda se mobilizam.

Desde que a Copa do Mundo começou, foram três manifestações. Na primeira, na estreia da Copa, no dia 12 de junho, um grupo exaltado virou uma viatura da Polícia Civil, apedrejou um prédio residencial, agências bancárias e até um cinema, próximo a Praça da Liberdade. Nos dois protestos seguintes, no sábado, 14 de junho, na Praça Sete, e na terça-feira, 17, na Savassi, a Polícia Militar mudou a tática e cercou os manifestantes.

Os militares passaram a usar a tática conhecida como Caldeirão de Hamburgo, ou kettling (do inglês enchaleiramento), em que os manifestantes são concentrados dentro de um cordão policial, restando apenas uma saída e entrada, com forte revista em bolsas e mochilas. A tática foi usada pela primeira vez em Hamburgo, em 1986, quando os black blocs começavam a surgir. A estratégia da polícia é controversa e foi criticada na Europa, chegando a ser condenada em tribunais do Velho Continente, pois restringe o direito legítimo de protestar.

MUDANÇA A combinação entre o maior aparato policial e o menor apoio da população esvaziou os protestos. No último sábado, quando foi realizado o jogo entre Argentina x Irã no Mineirão, a Assembleia Popular Horizontal recuou e decidiu não ir às ruas para protestar. Foi agendada apenas uma ocupação cultural da Avenida Aarão Reis, no Centro da cidade marcada para hoje. Um clima bem diferente de junho do ano passado, quando a hashtag mais usada nas mídias sociais foi #vemprarua. À época, era também o grito dos manifestantes, que conclamavam trabalhadores, motoristas e quem estava em casa a engrossar a multidão.

Durante a Copa das Confederações, os manifestantes percorreram as principais praças da capital. Gritaram em frente à prefeitura, à Câmara Municipal, à Assembleia e à antiga sede do governo estadual, o Palácio da Liberdade. Mas, principalmente, marcharam do Centro da cidade até a Pampulha, no limite imposto pela Fifa para garantir a segurança de quem participava e torcia na Copa das Confederações, nos três jogos realizados no Mineirão. Durante os protestos, dois jovens morreram após caírem do viaduto José de Alencar e os comerciantes da Avenida Antônio Carlos acumularam milhões de prejuízos com a quebradeira.

Como foi no ano passado

Em menos de duas semanas, os protestos em Belo Horizonte levaram quase 200 mil pessoas às ruas em junho


Dia 14 – sexta-feira
» No calor dos movimentos de São Paulo o desembargador Carlos Augusto Levenhagen aceita pedido do governo estadual e proíbe qualquer tipo de manifestação nas ruas de Minas Gerais durante a Copa das Confederações.

Dia 15 – sábado
» Cerca de 8 mil pessoas participam da passeata, saindo da Praça da Savassi até a Praça da Estação. A manifestação foi pacífica.

Dia 17 – segunda-feira
» Um violento confronto entre policiais e parte das 20 mil pessoas que saíram às ruas nesse dia aconteceu em frente à UFMG, na Avenida Antônio Carlos. A PM usou bombas de gás lacrimogêneo e de efeito moral, além de tiros de bala de borracha para conter os manifestantes que tentavam entrar na área da Fifa, próximo ao Mineirão, onde Nigéria e Taiti jogavam pela Copa das Confederações.

Dia 18 – terça-feira
» Os manifestantes começam a se articular. Ocorre um encontro embaixo do Viaduto Santa Tereza à noite. Durante o dia, protestos que reuniram cerca de 600 pessoas fecham as rodovias federais próximas à capital mineira.

Dia 19 – quarta-feira
» Cerca de 10 mil pessoas percorrem as ruas de Belo Horizonte. A concentração é na Praça Sete, mas os manifestantes passam pelas praças da Liberdade, Assembleia, Estação e Savassi. Uma loja é depredada na Savassi.

Dia 20 – quinta-feira
» Prefeito anuncia redução de R$ 0,05 nas passagens do transporte coletivo municipal e o governador de R$ 0,15 para os coletivos intermunicipais. À noite, 20 mil pessoas vão às ruas, passando pelas praças Sete e da Liberdade até a Câmara Municipal.

Dia 21 – sexta-feira
» No Barreiro, 5 mil pessoas saem às ruas pedindo a conclusão das obras do Hospital Regional e a chegada do metrô até a região. A BR-040, próximo a Ribeirão das Neves, é parada por 14 horas. Três policiais ficam feridos em confrontos com bandidos que os alvejaram na porta da empresa Transimão.

Dia 22 – sábado
» Mais de 20 mil pessoas deixaram a Praça Sete em direção ao Mineirão, onde jogavam Japão e México. O limite da área da Fifa foi mais uma vez palco de batalha, com uso de bombas de efeito moral pela polícia. À noite, houve cenas de vandalismo nas concessionárias da Avenida Antônio Carlos e no Centro de Belo Horizonte. A polícia usou toda a força para reprimir o ato, estreando o blindado “caveirão” e prendendo 32 pessoas.
 
Dia 25 – terça-feira
» A reitoria da UFMG é invadida por estudantes, que não aceitam que a universidade seja ocupada por militares durante a manifestação marcada para o dia seguinte.

Dia 26 – quarta-feira
» Dia da semifinal entre Brasil e Uruguai no Mineirão e também data do confronto mais violento ocorrido em Belo Horizonte. Cerca de 50 mil pessoas participaram da passeata até o Minerião. No caminho, um jovem morreu ao cair do Viaduto José Alencar. Concessionárias, agências bancárias e o comércio da região foram incendiados e destruídos por black blocs, que enfrentaram a polícia e romperam a barreira de proteção da área da Fifa no entorno do estádio.


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