O aumento no número de pedidos de permanência, no entanto, não veio acompanhado de uma estrutura adequada para atender a demanda. Levantamento do Ministério de Justiça demonstra que dos 20 mil pedidos protocolados entre agosto e dezembro do ano passado, menos da metade foram analisados, ou seja, cerca de 9,3 mil. Dos analisados, 6,6 mil foram deferidos no período. O secretário de Justiça, Paulo Abrão, confirma a deficiência e explica que a análise dos processos precisa ser detalhada e requer um tempo maior.
Com a mesma linha de raciocínio, o ministro das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo, afirma que o Brasil tem que se aparelhar melhor para acolher pessoas que pedem abrigo no país. Segundo ele, diante do aumento do número de pedidos de permanência de estrangeiros, a estrutura de acolhimento tem que ser aperfeiçoada. A declaração do ministro, durante a reunião de abertura dos trabalhos da Comissão de Relações Exteriores do Senado, foi provocada pelo questionamento em relação à médica cubana Ramona Matos Rodríguez, que abandonou o Programa Mais Médicos.
O pedido de refúgio no país é autorizado quando há, contra o estrangeiro, fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas. As primeiras análises dos processos pelo Ministério da Justiça, no entanto, mostraram que a maioria veio para o Brasil por razões econômicas, em busca de melhores condições de vida e trabalho.
Cidadania
O sírio Nazir Farra ainda não domina o português, mas confirma que, mesmo com hábitos de vida tão distintos e a barreira do idioma, o Brasil foi descoberto como um bom lugar para se viver e exercer a cidadania. Ele desembarcou no Brasil com a família em setembro de 2012 e disse que veio atraído pela solidez da economia brasileira. “Eu queria que minha filha se beneficiasse da cidadania brasileira”, afirma Nazir, que prefere se comunicar em inglês.
O sírio conta que viveu a maior parte da vida no Golfo Pérsico e sofreu com o alto custo de vida no seu país, o que não ocorre no Brasil. “Em todos os países temos prós e contras, vivendo em casa ou fora. Mas optei por ter benefícios a longo prazo”, afirma. De acordo com o consulado da Síria em Belo Horizonte, desde o início do conflito a capital mineira foi escolhida como destino por pelo menos 15 famílias e não existe registro de problemas de adaptação.
Paulo Abrão explica que é possível observar que houve uma inversão nos fluxos migratórias globais. “A ONU (Organização das Nações Unidas) verificou que houve uma inversão no fluxo migratório, que era do Sul para o Norte, e, agora, é do Sul para o Sul”, explica. Segundo ele, no Brasil, o maior e mais tradicional fluxo migratório ainda é de latinos, seguidos por angolanos, portugueses e espanhóis.
O secretário de Justiça acredita que, além dos atrativos do Brasil, os conflitos internacionais são responsáveis pela dispersão dos grupos sociais. De acordo com estudo da ONU, todos os países em que foi verificado maior número de pedidos, tanto para o Brasil quanto para outras nações, têm histórico de conflito político, étnico e com disseminação de violência. A maioria é formada por Estados em desenvolvimento ou de menor desenvolvimento relativo, especialmente os da África.
Sobrevivência
Atualmente, de acordo com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (Acnur), são estimadas 214 milhões de pessoas vivendo fora dos seus países de origem, por diversas razões e motivações, como oportunidade de trabalho e sobrevivência. Mas a crise na Síria teve impacto direto no aumento de refugiados em todo o mundo no ano passado. Do total de 1,5 milhão de novos refugiados no primeiro semestre de 2013, 1,3 milhão são da Síria. Essas pessoas se abrigam principalmente nos países vizinhos – Líbano, Turquia, Jordânia e Iraque, de acordo com a Mid-Year Trends 2013.
Segundo o Ministério da Justiça, os países que mais solicitaram refúgio ao Brasil são a República Democrática do Congo, com 106 concessões, Colômbia (87), Paquistão (32) e Angola (17). Entre os países da América do Sul, Bolívia (16) e Venezuela (seis) lideram os pedidos. “O Brasil tem tradição de acolhimento. É como no caso dos haitianos que entram, sem documentos, em busca de refúgio. Para eles é dado o direito de entrar, viver e trabalhar no Brasil enquanto o processo é examinado pelo Conare (Comitê Nacional para Refugiados”, lembra o ministro Figueiredo.
Visto para haitianos