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Estado de Minas

Dados do SUS de Belo Horizonte mostram que há especialidades com vagas de sobra

Pelo menos 37,6 mil horários em serviços de prevenção e promoção da saúde ficaram em aberto ao longo de 2016 em BH. Na lista, exames de vista, controle do tabagismo e até ginástica


postado em 01/01/2017 06:00 / atualizado em 01/01/2017 08:14

Nas academias ligadas ao SUS, a dificuldade é manter a frequência dos alunos para prevenir doenças (foto: Jair Amaral/EM/DA Press)
Nas academias ligadas ao SUS, a dificuldade é manter a frequência dos alunos para prevenir doenças (foto: Jair Amaral/EM/DA Press)
Em um contexto de filas, longo tempo de espera e muitas queixas por falta de atendimento, há vagas ociosas no Sistema Único de Saúde (SUS) de Belo Horizonte, em serviços e programas capazes de garantir pelo menos 37,6 mil atendimentos a mais do que os que hoje são realizados. São horários e agendamentos disponíveis para exames oftalmológicos, consultas para controle de tabagismo, aulas de ginástica e da prática corporal lian gong, atividade da medicina chinesa que inclui 18 terapias voltadas para tratamento e prevenção de doenças. Embora tenha profissionais e espaços disponíveis para aumentar esses atendimentos, preencher as vagas tem se mostrado um desafio para a gestão da saúde na capital mineira. De acordo com o secretário municipal Fabiano Pimenta, “a saúde ainda precisa conseguir, de maneira mais ampliada, uma interlocução capaz de atrair a população aos serviços da atenção básica, de promoção e prevenção à saúde”.

Para se ter uma ideia, em uma das áreas onde a demanda tem sido menor que a oferta, a oftalmologia, sobraram 37,8% das 25.612 consultas oferecidas a pacientes diabéticos , nos primeiros 11 meses deste ano, para exames de fundoscopia (avaliação do fundo do olho). Pessoas que têm a doença devem fazer o controle anual da visão, pelo risco de desenvolverem retinopatia diabética, doença que evolui para cegueira, se não tratada. Mas, apenas 15.914 visitas ao especialista foram marcadas. Em relação às consultas para pacientes com retinopatia diabética, das 6.871 consultas oferecidas, apenas 2.660 foram marcadas pela população no mesmo período, o que representa 38,7% do total. Neste caso, a sobra foi ainda maior: 61,2% dos procedimentos ofertados não foram procurados pelos pacientes.

No programa do tabagismo, mais absenteísmo, segundo o secretário. O programa está disponível em 122 dos 150 centros de saúde da rede SUS-BH, mas está longe de alcançar a população fumante da capital, que chegou a 16,2% dos homens e 9,2% das mulheres da cidade, segundo dados da pesquisa Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel) 2015. De janeiro a outubro deste ano, 3.312 pessoas participaram do programa. “Ainda há uma subutilização do serviço, que poderia ser mais demandado”, diz Fabiano. Segundo ele, há possibilidade de atender grupos com até 30 pessoas para as atividades coletivas e tratamento com medicamentos e adesivos de nicotina que agem no controle do desejo de fumar. “Mas há casos em que os grupos são formados com apenas 10 pessoas”, afirma. Ou seja, o número poderia ser três vezes maior que o atual.

(foto: Arte EM)
(foto: Arte EM)
E quem participa avalia bem o programa. “É ótimo, excelente. Os integrantes do grupo vão a encontros periódicos com uma equipe multidisciplinar, que faz toda a diferença para nos mantermos firmes no objetivo de parar de fumar. Além disso, recebemos medicamentos e adesivos para controle de ansiedade e da abstinência do tabaco. Tudo isso gratuitamente”, conta a aposentada Marina Lúcia Nicácio Melo Franco, de 65 anos, que parou de fumar em julho, depois de participar do programa. Ela termina as sessões neste mês e revela: “Além de as turmas começarem com poucas pessoas, o número diminui porque alguns não conseguem levar o tratamento adiante”.

FALTA DE HÁBITO A falta de adesão se repete nas atividades das 71 Academias da Cidade espalhadas pelas regionais de BH. Nos espaços, são oferecidas aulas de ginástica com acompanhamento de profissionais de educação física. Mas, dos cerca de 19,9 mil usuários inscritos, apenas 16,9 mil estão ativos. “E ainda há possibilidade de expandir para 24 mil vagas”, afirma a gerente de Assistência à Saúde da Secretaria Municipal de Saúde (SMSa), Taciana Malheiros. Com isso, são pelo menos 7 mil vagas ociosas. Outra atividade muito recomendada por quem está praticando na rede SUS é a ginástica lian gong, oferecida atualmente em 217 locais na cidade e que atende 10 mil usuários. “Temos capacidade para dobrar esse atendimento”, diz a coordenador do programa, a médica Luzia Hanashiro.

A explicação para a sobra de vagas, segundo a gerente Taciana Malheiros, está centrada em um fator cultural. Segundo ela, a população, de modo geral, não tem por hábito trabalhar o autocuidado. “A nossa cultura é voltada para o remédio, para os exames, a alta tecnologia e o tratamento de doenças e não a prevenção delas”, afirma. Taciana explica que reverter essa lógica envolve uma mudança de hábitos da população. “E essa é uma estratégia que vem sendo trabalhada fortemente pela saúde em BH nos últimos anos, especialmente pelo fortalecimento do modelo de atenção à saúde da família”, diz, citando que são 588 equipes presentes em todos os 150 centros de saúde da cidade.

Falhas na gestão


Para o coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Saúde do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Gilmar de Assis, o absenteísmo está relacionado a fatores ligados à gestão do SUS. Um desses aspectos diz respeito ao Programa de Saúde da Família. O promotor explica que, apesar de Belo Horizonte ter uma das mais altas coberturas do programa, que chega a 86% da cidade, a iniciativa ainda pode estar falha no sentido de motivar a demanda. Isso ocorre, segundo o promotor, porque os profissionais muitas vezes estão atendendo outras funções.

Gilmar de Assis destaca também a portaria do Ministério da Saúde que permite que o agente comunitário de saúde (acs) atue no controle de endemias, o que “sobrecarrega o profissional”. Ele disse ainda que a busca ativa feita pelas equipes de PSF precisa da retaguarda de outros profissionais, como nutricionistas, psicólogos, fisioterapeutas, nem sempre presentes nos centros de saúde. Esses especialistas integram as equipes dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família em BH.

O secretário de Saúde Fabiano Pimenta afirma que expandir o programa é um desafio. “Há uma cobertura importante. São 59 equipes que atendem a todos os centros. Tínhamos o planejamento para mais 23, o que não ocorreu por falta de orçamento do ministério”, explica. Sobre o uso dos agentes no controle de endemias, a gerente Taciana Malheiros defende que eles são capacitados para trabalhar de forma integrada.

Palavra de  especialista

Fábio Guerra, presidente do Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais

Prevenção emergente

Como o valor da prevenção vem sendo fortemente discutido nos últimos anos, com o entendimento de que ela é muito mais importante do que a atividade curativa, o paradigma de assistência de saúde já está mudando. Por muito tempo, a cultura foi a de trabalhar a doença, mas já vemos avanços estruturais, com o trabalho que é feito na atenção básica. Até mesmo os planos de saúde já perceberam a importância da prevenção e têm ações voltadas para essa prática. Mas essa mudança, bem como o aumento da adesão da sociedade a esse novo conceito, leva tempo. Do ponto de vista do gestor, é preciso também melhorar a estratégia para atrair essa população, com ações educativas, de mobilização, ampla divulgação e capacitação dos profissionais para um trabalho de quase convencimento das pessoas sobre a importância da prevenção.


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