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Estado de Minas

Falhas dos ônibus regularizados expõem passageiros a riscos em Minas

Usuários de linhas intermunicipais no Noroeste e Norte de Minas são reféns de serviços de má qualidade, mesmo em viagens legais. em alguns trechos, são forçados a fazer parte do trajeto a pé


postado em 24/08/2015 06:00 / atualizado em 25/08/2015 07:59

Rota Bonfinópolis de Minas a Brasília é operada por frota precária e passageiros, muitas vezes, não encontram o mínimo de conforto para embarcar, como no ponto em Urucuia(foto: Alexandre Guzanshe/EM/DA Press)
Rota Bonfinópolis de Minas a Brasília é operada por frota precária e passageiros, muitas vezes, não encontram o mínimo de conforto para embarcar, como no ponto em Urucuia (foto: Alexandre Guzanshe/EM/DA Press)

Bonfinópolis de Minas, Arinos, Januária e Manga –
No lado oposto ao dos táxis, carros e ônibus clandestinos que disputam espaço e circulam diariamente no Noroeste e Norte de Minas, empresas de ônibus que operam de forma regular – seja por meio de concessão pública de linhas intermunicipais, concedidas pelo Departamento de Estradas e Rodagem (DER/MG), ou autorizações judiciais, também apresentam falhas que ajudam a explicar o surgimento dos ilegais, ao mesmo tempo em que apontam a necessidade urgente de aprimoramento dos serviços.


De motor dianteiro, a grande maioria dos ônibus que desbrava os municípios do sertão, onde a cultura do transporte clandestino está enraizada entre a população, circula suja e em estado precário. A situação é agravada pelas condições das BRs-479 e 135, principais eixos viários de municípios como Arinos, Chapada Gaúcha, Januária, Itacarambi, Manga e Montalvânia, que alteram trechos asfaltados, de cascalho e terra. Com isso, o passageiro, personagem central, fica refém de serviços de má qualidade, sem segurança, mesmo quando a oferta de viagens está dentro da lei. A atuação do transporte regularizado na região é retratada pela segunda reportagem da série Transporte sem Lei.

A parca regularidade de horário dos ônibus, a tarifa, algumas das vezes proibitiva para a população, que sofre com a seca e o desemprego, além as dificuldades enfrentadas nos longos percursos das viagens – como quebras mecânicas, atrasos nas partidas e o transbordo da balsa que atravessa o Rio São Francisco, em Manga, remetendo à época das jardineiras, abrem passagem para o uso do carro clandestino como forma de deslocamento rápido entre as cidades, em detrimento da qualidade e segurança do serviço prestado, com veículos sem horários de viagem, tarifas pré-estabelecidas e motoristas desqualificados, conforme mostrou ontem o Estado de Minas.

A concorrência é agravada pelo fim do Grupo Amaral, uma das maiores empresas de ônibus da região que faliu no fim do ano passado, em meio à uma disputa familiar, dívidas e uma intervenção do governo do Distrito Federal (GDF). No lugar da Santo Antônio Transporte e Turismo (ESA) e Transprogresso, pelo menos três empresas de ônibus assumiram a operação das linhas com destino à capital federal, mas segundo a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), somente a empresa Januária tem autorização legal para circular.

BAGAGEM NO OMBRO Em Manga, município de 19,8 mil habitantes situado à margem esquerda do Velho Chico, a 709 quilômetros de Belo Horizonte, passageiros que utilizam as linhas de ônibus do transporte regular com destino à Jaíba, Janaúba e Belo Horizonte são forçados a fazer parte da travessia de balsa até Matias Cardoso, do outro lado do rio, a pé. O transtorno ocorre em razão da maré baixa do rio em parte do ano, o que a impossibilita a passagem de veículos grandes. Em novembro do ano passado, a Secretaria de Transportes e Obras Públicas de Minas Gerais (Setop) realizou a licitação do transporte aquaviário das balsas, por um prazo de 18 anos, mas não há previsão de melhorias.

Até então, a travessia era realizada precariamente por pessoas jurídicas, sem autorização ou fiscalização do estado, o que motivou ação civil pública exigindo a regularização do serviço. Como os ônibus não têm condições de utilizar o acesso à balsa, que é ingrime e de terra, são os próprios usuários que se encarregam de atravessar o rio. Funcionários e um caminhão-baú da empresa Transnorte, que opera as linhas da região, se dispõem a transportar as bagagens maiores. Mochilas e malas pequenas, contudo, são levados pelos próprios passageiros. A tarifa cobrada para a travessia de cada ônibus é de R$ 59. Seis balsas revezam o funcionamento da transposição, dos quais quatro funcionam durante os finais de semana. “Nessa época do ano, quando a maré do rio fica baixa, eles nem arriscam passar com o ônibus por aqui”, conta o fiscal Estelito Dourado, de 22 anos.

LAÇOS COM BRASÍLIA Em Bonfinópolis de Minas, no Noroeste Mineiro, João Oliveira, dono de uma mercearia na rodoviária da cidade desde a inauguração, há 25 anos,  descreve o forte laço que a cidade tem com Brasília. “Fizeram um levantamento recente na cidade e descobriram que, além dos 6 mil moradores, há outros 24 mil bonfinenses morando em Brasília”, diz João. É possível ver muitos carros estacionados nas ruas de Bonfinópolis com placas de Brasília. A falta d’água e oportunidades de emprego, por outro lado, afastam as pessoas do município localizado a 560 quilômetros de Belo Horizonte e 150 de João Pinheiro.

Ninguém do Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado de Minas Gerais (Sindpas) e da Transnorte foi localizado para comentar o assunto.

REFLEXOS

(foto: Alexandre Guzanshe/EM/DA Press)
(foto: Alexandre Guzanshe/EM/DA Press)
"Viagem" a pé

Morador da vizinha Montalvânia, o inspetor da Guarda Municipal da cidade Gerlon da Silva Rodrigues, de 29 anos, faz a travessia da balsa de Manga para Matias Cardoso, a pé, constantemente. Ele reclama das condições e acredita que a empresa concessionária da linha deveria dar uma atenção maior. “Acho péssimo. Viajo pouco de ônibus, mas já observei que o pessoal reclama demais. Já ouvi até história de ônibus que deixou o passageiro para trás no caminho de volta até a rodoviária”.

(foto: Alexandre Guzanshe/EM/DA Press)
(foto: Alexandre Guzanshe/EM/DA Press)
"Não aguentei"


Márcio Antônio Botelho, de 52 anos, chegou a gerenciar um bar na rodoviária de Manga por 13 anos. Desistiu do negócio há dois anos devido à queda brusca de faturamento no local. Hoje Mô, como é conhecido na cidade, ocupa o tempo no balcão de outro bar vendendo passagens para a empresa Januária, uma das três viações que assumiram as linhas com destino à Brasília, no lugar das empresas do Grupo Amaral, que faliu. “Depois que a Empresa Santo Antônio fechou, não aguentei”, conta ele, que chegou a ser bilheteiro registrado na empresa. Para Márcio, a principal concorrência no transporte na cidade é dos próprios moradores. Muitos manguenses residem em Brasília, sendo este o público mais fiel da linha que interliga a cidade até a capital federal. “Muita gente que mora na roça compra carro e passa a viver de fazer viagens, cobrando carona. Os ônibus estão andando praticamente vazios. Os carros carregam todo mundo.”

Sem alternativa


Natural de Manga, o mestre de obra Antônio Santos, de 38 anos, vive há 12 em Toledo, no Paraná. Quando está de férias, visita a terra natal e utiliza ônibus. Para ele, os poucos táxis que fazem viagem até Januária e Montes Claros não trazem vantagem. “Eles não funcionam numa hora dessas (sábado a tarde), só quando há movimento. Além disso, cobram mais caro e não têm serviço que presta. Para o pessoal que mora aqui, o transporte acaba sendo bom, porque não tem alternativa”, ressalta.

 


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