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Estado de Minas

Médicos condenados por tráfico de órgãos continuam trabalhando

Sentenciados a prisão por remoção irregular e comércio de material para transplantes, médicos seguem atendendo pacientes em Poços de Caldas. Juiz critica postura do CRM


postado em 22/02/2013 06:00 / atualizado em 22/02/2013 06:45

Apesar de condenados a penas que variam de 8 anos a 11 anos e meio de prisão, médicos condenados em primeira instância por tráfico de órgãos em Poços de Caldas continuavam ontem a atender normalmente pacientes em consultórios e na Santa Casa de Misericórdia da cidade do Sul de Minas. O hospital é  conveniado ao Sistema Único de Saúde e a sentença determina  expressamente que os réus se afastem do atendimento no SUS. Outros dois profissionais, que tiveram os crimes prescritos em decorrência de terem ultrapassado 70 anos – um deles inclusive acusado de homicídio doloso –, também operam e atendem sem qualquer constrangimento. O Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais (CRM-MG), que tem o poder de suspender preventivamente profissionais sob suspeita de conduta grave, preferiu não lançar mão dessa medida e ainda iniciará procedimento de investigação sobre o caso, ocorrido mais de uma década atrás.

Foram quatro os profissionais sentenciados: o médico Alexandre Crispino Zincone, de 48 anos, recebeu pena de 11 anos e seis meses de prisão; João Alberto Goés Brandão, de 44, Celso Roberto Frasson Scafi, de 50, e Cláudio Rogério Carneiro Fernandes, de 53, foram condenados a oito anos cada um. Todas as penas são em regime fechado, embora os réus possam recorrer em liberdade. As acusações contra Félix Herman Gamarra Alcântara, de 71, e Gérsio Zincone, de 77, caducaram. A defesa dos acusados informou já ter recorrido da decisão.

A condenação ocorreu em um dos oito casos investigados pela polícia, referente à morte, remoção e tráfico dos órgãos de José Domingos Carvalho, morto aos 38 anos, em 2001. Outras sete mortes e procedimentos de transplante aguardam julgamento. Um nono caso, que diz respeito à morte e retirada de órgãos do menino Paulo Veronesi Pavesi, que hava sido fechado, foi reaberto no ano passado. Em 2000, aos 10 anos, o garoto caiu do prédio onde morava e foi atendido por Celso Roberto Frasson e Cláudio Rogério Carneiro, entre outros. Foram as apurações de sua morte que levaram a descobrir o grupo considerado pelo Ministério Público uma organização criminosa especializada em tráfico de órgãos.

O esquema, que consistiria em tratar com descaso proposital vítimas de traumatismo craniano e acidentes vasculares cerebrais, teria rendido até R$ 200 mil por mês aos envolvidos. De acordo com a sentença da 1ª Vara Criminal de Poços de Caldas, pacientes eram mantidos em condições inadequadas de tratamento até que seu quadro se tornasse irreversível. Nesse estágio, segundo indicam as apurações, eram mandados para a unidade de terapia intensiva, a fim de manter em funcionamento os órgãos que interessavam ao grupo, definido na sentença em termos como “organização” e “máfia”. Conseguida a autorização para doação, rins, córneas, coração e fígado eram encaminhados a médicos “dos estado vizinho de São Paulo ou remetidos a Belo Horizonte”, ignorando a fila única de transplantes e com cobrança irregular.

No meio da tarde dessa quinta-feira, o Estado de Minas procurou pelos réus em suas casas e locais de trabalho. A informação obtida é de que todos continuam a atender normalmente. Considerado pelo juiz do caso, Narciso Alvarenga Monteiro de Castro, como “o mais perigoso do grupo”, o médico que foi processado por homicídio doloso, o neurocirurgião Félix Herman, continua atuando na Santa Casa de Misericórdia, hospital onde a promotoria aponta que as mortes e tráfico de órgãos ocorreram. Lá são feitos atendimentos tanto do SUS quanto de particulares.

Ontem, a secretária do consultório de Félix na Santa Casa disse que o médico estava atendendo um paciente e que não daria entrevistas sobre as acusações que pesam contra ele. Alexandre Crispino Zincone foi procurado e estava atendendo em seu consultório no edifício do Centro Clínico, no Centro de Poços de Caldas. Deixou as recepcionistas avisadas de que não comentaria a decisão judicial. Na casa do urologista Celso Roberto Frasson Scafi, a informação era de ele que estava atendendo pacientes na clínica, como faz todos os dias. Ele não retornou os contatos da reportagem.

Conselho ainda vai começar apuração

O próprio juiz do caso considerou “um absurdo” o fato de o CRM não suspender preventivamente os acusados, para garantir a segurança de pacientes. “Deveriam suspender esses profissionais, porque (a continuidade do exercício da profissão) contamina toda a sociedade. Os conselhos são órgãos de fiscalização e têm essa obrigação”, afirmou Narciso Monteiro de Castro.

Procurado, o presidente do CRM-MG, João Batista Gomes Soares, disse que as investigações da entidade sobre o caso – ocorrido há 12 anos – ainda serão iniciadas, e que enquanto isso os médicos poderão trabalhar. “Não se pode punir por antecedência. Isso geraria ação na Justiça por perda da atividade da qual se tira o sustento. A exceção ocorre em fatos altamente gritantes, em que se determina uma interdição. Esse é um caso grave, mas não tivemos acesso aos autos do processo criminal”, argumentou.

Jose Arthur Di Spirito Kalil , advogado dos acusados João Alberto, Celso Roberto e Cláudio Rogério, afirma que seus clientes são inocentes de todas as acusações e disse ter recorrido da sentença de condenação, por acreditar que houve vícios no processo. “Deve levar uns quatro meses para que seja julgado o recurso. Em determinados momentos do julgamento, a defesa não pode atuar e isso prejudicou meus clientes. Não houve crime, tudo o que os médicos fizeram foi seguindo estritamente as rotinas regulares”, disse.


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