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Estado de Minas

Cidade mineira registra alto índice de grávidas e de mães solteiras após receber operários

Estranhos atraem mocinhas com boa conversa e presentes


postado em 13/01/2013 06:00 / atualizado em 13/01/2013 07:23

Conceição do Mato Dentro – De repente, há cerca de seis anos, a pequena Conceição do Mato Dentro, na Região Central de Minas, começou a receber uma multidão de forasteiros. À população de 18 mil habitantes, somaram-se mais de 4 mil rostos estranhos, a maioria homens, convocados para trabalhar nas obras da multinacional Anglo American, uma das maiores das mineradoras do mundo. Além de aquecerem a economia local, os novos moradores inflamaram a imaginação de algumas mulheres e, vejam só, contribuíram para aumentar o número de mães solteiras.

Não há estatísticas oficiais, mas o fenômeno é constatado por profissionais da Secretaria Municipal de Saúde e observado por muita gente da cidade. “Empregados das firmas têm contribuído para aumentar o número de grávidas e também o de mães solteiras”, afirma a enfermeira Graciele Soares de Oliveira, que há quase três anos acompanha gestantes e mães recentes atendidas em um dos três postos do Programa Saúde da Família.

As firmas a que se refere a enfermeira são as empresas terceirizadas pela Anglo American, que planeja explorar o minério de ferro entranhado na região. Juntas, as empresas contam com 4,4 mil empregados em Conceição. A grande maioria deles são homens, vindos de diversos estados, donos de vários sotaques e feições. Em uma cidadezinha onde quase todo mundo se conhecia, onde hábitos se reproduziam e os dias eram pacatos e previsíveis, aquele monte de gente nova atiçou a curiosidade de senhoras e senhoritas. “Novidade é novidade. Sei de muitos namoros e envolvimentos com homens que vieram de fora. Era algo esperado. Eles vão atrás até de mulher casada, viu?”, diz, sorrindo, o prefeito Reinaldo César de Lima Guimarães (PMDB).

CURIOSIDADE Das 27 gestantes atendidas atualmente no posto de saúde de Graciele, no Bairro Córrego Pereira, pelo menos seis engravidaram de forasteiros, o que dá um percentual de 22,2%. “Ainda conheço umas oito que já deram à luz filhos de gente das firmas”, diz ela. Na maioria dos casos, as mães têm de criar sozinhas seus rebentos. Alguns pais nem moram mais em Conceição: voltaram à terra natal ou se transferiram para outra cidade. Um deles namorou por alguns meses a conceicionense Juliana Francisca de Oliveira, de 22 anos. A filha do casal, Ítala Fernanda, nasceu em junho. Meses depois, o pai, natural de Salinas, no Norte de Minas, foi trabalhar no Serro. “Ele me deixou na mão”, queixa-se Juliana.

Sentada em um beco no Córrego Pereira, a desempregada Juliana segura nos braços Ítala, a primeira filha. Em dezembro de 2010 a moça conheceu o pai da pequena, então operador de máquinas. “Ele era simpático, educado, achei que fosse responsável. Me enganei”, conta. Quando ela revelou que estava grávida, o namorado não gostou. “Pediu para eu tirar. Começou a me deixar de lado”, recorda. Depois, ele, que havia dito que era solteiro, informou que tinha mulher e cinco filhos em Salinas.

Pouco antes de Ítala nascer, Juliana precisou abandonar o primeiro ano do ensino médio para cuidar do bebê. Além de contar com a ajuda de parentes, recebe uma pensão de R$ 150 do operador de máquinas. “Uma vez, gastei R$ 700 em remédios para minha filha. Pedi para ele mandar mais dinheiro, mas ele falou que era para eu me virar”, conta. Em quase todo fim de semana, o rapaz visita Conceição do Mato Dentro, mas passa mais tempo com a nova namorada do que com a filha. “Fica 15 minutinhos e vai embora. Nem a carrega direito”, ressalta a mãe.

DESESPERANÇA Cristina (nome fictício), de 35 anos, ouviu conselhos para ter cuidado ao se relacionar com algum forasteiro. “Sempre disse que nunca ia me envolver com essas pessoas de firma. A visão que a gente tem é de que só querem farra”, diz. A resolução, no entanto, foi esquecida no final de 2010, quando ela, então funcionária de uma padaria, conheceu um baiano. Meses depois, deitaram-se juntos e não usaram camisinha. Em agosto, nasceu a primeira filha de Cristina.

Quando soube que a namorada esperava um bebê, o baiano começou a se afastar. “Ele propôs que eu tomasse remédio para tirar a criança. Não quis mais sair comigo”, conta Cristina. O pai registrou a recém-nascida, disse que ajudaria a mãe a criá-la, prometeu mandar dinheiro todo mês e pagar um plano de saúde para a filha, mas sumiu. Cristina sabe que ele foi trabalhar em Sabará, em Belo Horizonte e depois se mudou para Mato Grosso. Ela entrou na Justiça para obrigá-lo a pagar pensão.

Assim como Cristina, Lívia (nome fictício) ouviu muitos conselhos. “A maioria falava que cara de firma só quer aproveitar e ir embora”, recorda. Porém, também acabou virando mãe solteira. Em 2010, ela conheceu um rapaz de Itabira, Região Central. Ele trabalhava como ajudante de topografia. O casal namorou por mais de um ano. Uma vez, não usaram camisinha e em maio de 2011, a filha nasceu. O rapaz assumiu a paternidade, mas retornou à cidade natal. Ele manda uma pensão que varia de R$ 150 a R$ 200 e visita as duas pelo menos uma vez por mês, mas Lívia acha que isso é pouco.


Amores e desilusões

Em Conceição do Mato Dentro, vez por outra as conversas tocam no assunto. “É mais fácil dizer quem não engravidou desses homens de firma”, diz a atendente de uma farmácia. “Conheço muitas que se deixaram iludir, principalmente mocinha nova. Eles chegam, prometem mundos e fundos, e as meninas não estão acostumadas com a vida boa”, enfatiza. Outra atendente conta, maliciosa: “Outro dia, ouvi um dizendo: ‘Você sabe que eu te amo, que você é tudo na minha vida’. A menina se derreteu toda. Cidade pequena, você vê todo dia as mesmas caras. Gente nova chama a atenção.” No jogo da sedução, alguns conquistadores enchem as moças de presentes caros, como joias, roupas de marca, celular e câmera fotográfica digital.

Muitos rapazes nativos sentem ciúmes de forasteiros. “Os caras da cidade ficavam muito chateados, porque os de fora roubavam as meninas daqui”, confirma Josimar Gonzaga, de 23. Ele diz conhecer três moças que, depois de engravidarem, desenganaram-se com os de fora. “Todo mundo alerta para não se envolverem demais. O cara pode ser casado e dar uma de solteiro. O futuro do cara é incerto: ele pode ser transferido, ter de ir embora”, alega o rapaz, que é de Conceição e trabalahou como vigilante em alojamentos de terceirizadas, mas está desempregado. Segundo ele, depois de inúmeras desilusões, as meninas de Conceição ficaram mais espertas. “No início, elas se interessavam mais pelo pessoal das firmas. Os caras fizeram a festa, ‘passaram o rodo’, mas ‘queimaram’ o filme”, explica.

Paixões com final feliz

Nem tudo é desamor. Na cidade, alguns forasteiros que se apaixonaram e constituíram família, nem pensam em se mudar. Em 2011, William Pereira, de Senhor do Bonfim (BA), chegou a Conceição para trabalhar como armador de estruturas. Na mesma empresa, a conceicionense Myriani Aparecida Rodrigues empregou-se como faxineira. Com quatro meses de namoro, a mulher engravidou. Pareceu não ter sido planejado, mas a verdade é que William deu o “golpe da barriga” ao contrário. “Foi uma coisa meio constrangedora. Parei de tomar remédio (anticoncepcional) porque ele disse que tinha feito vasectomia. Depois, me disse que foi uma arma que usou para não eu largá-lo”, explica Myriani, de 29 anos.

Apesar da insegurança de William, o estratagema não teria sido necessário. Myriani já estava apaixonada. Vítor Lorrann nasceu em maio. O casal passou a morar junto e o baiano ainda assumiu dois filhos que a mulher criava sozinha: João Vítor, de 5, e Izabella Caroline, de 6. William os trata com afagos e beijos, como se os tivesse gerado. A casa no Bairro Vila Caetano é alugada, mas os dois compraram um lote no Córrego Pereira e já começaram a erguer o futuro lar. “Se a firma quiser me transferir, procuro outro serviço. Ou então transfere a família todinha”, garante o nordestino, de 24. William continua trabalhando nas obras da Anglo American e reconhece que, entre os colegas, poucos fariam o mesmo que ele.

CASAL FELIZ
Também veio do Nordeste o bem-querer de Mariana Reis. Ela era balconista quando, em 2008, conheceu o pernambucano José Márcio da Silva. Amigos e parentes a alertavam. “A fama do pessoal de fora não é muito boa. Muitos só querem farra. Eles têm muita lábia, fazem muitas promessas e as meninas acabam caindo”, explica. No início, ela desconfiou do pretendente.

A gravidez veio com seis meses de namoro. Não foi nada planejado, mas José Márcio, conhecido como Pernambuco, adorou a notícia. Maria Eduarda nasceu em janeiro de 2009. Com o tempo, os receios da mãe se dissiparam. “Percebi que ele era sincero, trabalhador. Sempre me deu segurança de que iria ficar”, diz Mariana. E ficou. Quando era motorista de uma terceirizada, quiseram transferi-lo para São Paulo. Ele se recusou, mudou de firma e tornou-se taxista. Hoje, José Márcio tem 32 anos e a mulher 24. A família mora em uma casa no Bairro Maranhão. Mariana está no sétimo mês de gestação da segunda filha, Camila.

Por coincidência, uma irmã da jovem, Marina, também se casou com um rapaz de firma, outro motorista pernambucano, e também está grávida.


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