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Estado de Minas

Universitária morta é mais uma vítima da violência em BH; número de assassinatos subiu 12%


postado em 25/05/2012 07:05 / atualizado em 25/05/2012 08:46

(foto: Credito Facebook/Reproducao da Internet )
(foto: Credito Facebook/Reproducao da Internet )
“Perdeu, perdeu, perdeu!” A palavra dita três vezes pelos criminosos antes do disparo que matou a estudante de relações públicas Bárbara Quaresma Andrade Neves, de 22 anos, assassinada na noite de quarta-feira no Bairro Cidade Nova, Nordeste da capital, soa como a repetição de uma sentença que atingiu a própria estudante, sua família e a cidade. A universitária perdeu a vida de forma covarde, atingida sem chance de defesa por um tiro na nuca; os parentes perderam sua Babi, uma jovem cheia de sonhos e de planos; Belo Horizonte perdeu mais uma batalha para o crime, que apenas nos quatro primeiros meses do ano provocou 12,1% mais mortes do que no mesmo período do ano passado.

Na noite de quinta-feira, manifestação de colegas da universitária, na PUC Minas, prestou homenagem a Bárbara e pediu paz. Mais cedo, uma cerimônia carregada de dor, perplexidade e revolta, no Cemitério do Bonfim, sepultou mais essa vítima da escalada da violência, mas deixou no ar muitas perguntas e outras tantas preocupações. Preocupação com a taxa de homicídios em uma cidade que já contou 287 pessoas assassinadas de janeiro a abril, contra as 256 dos primeiros quatro meses do ano passado. A apreensão não é menor se comparado o intervalo de 2010 a 2011. Enquanto há dois anos 620 pessoas foram mortas nas ruas de BH, 762 homicídios foram registrados em 2011, alta de 22%. O roubo, crime que pode ter tirado a vida da universitária, também segue linha ascendente. Conforme a Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds), foram 17.893 casos em 2011 contra 15.748 em 2010, alta de 13,6%.

Mas é exatamente a motivação do crime a principal pergunta a exigir resposta da polícia, que ainda não consegue dizer ao certo nem se o que ocorreu foi um latrocínio – roubo seguido de morte. Bárbara foi assassinada diante do prédio em que morava seu namorado e primo de segundo grau, o gerente administrativo Gabriel Fagundes Quaresma, de 25, na Rua Tabelião Ferreira de Carvalho. Eram cerca de 20h e ele estava no banco de passageiro do carro da jovem quando chegaram dois criminosos, que tinham acabado de descer de um Fiat Stilo onde havia pelo menos mais um comparsa.

A polícia apresentou as fotos de dois suspeitos: Thiago Henrique Fernandes dos Santos, conhecido como “Terror”, de 21, e Wagner Henrique Soares da Conceição, de 20, que teria disparado o tiro. Ambos têm passagens por crimes contra o patrimônio, assim como mandados de prisão expedidos pela Justiça por outra morte em 27 de dezembro do ano passado.

O coordenador de operações especiais do Detran-MG, delegado Ramon Sandoli, diz que a hipótese inicial, de que o objetivo dos ladrões fosse levar o Uno da universitária, não está confirmada, por isso o caso será encaminhado à Delegacia de Homicídios. “Não vimos que a intenção dos autores fosse a subtração do veículo. Não foi pedido o veículo, nem foi pedido que ela saísse do carro”, argumenta o delegado. Os dois suspeitos, diz Sandoli, são autores de crimes semelhantes na Região de Venda Nova. As fotos foram mostradas a Gabriel, que disse notar semelhança com os homens que abordaram o casal, mas não deu certeza.

Segundo a versão do namorado da vítima, ela foi agredida a coronhadas antes de ser baleada, fato que deve ser checado no exame de necropsia e na perícia do veículo, segundo Sandoli. Gabriel abraçava a vítima na hora do crime e, como o tiro foi à queima-roupa, sua mão ficou chamuscada. Ele também foi submetido a exames no Instituto Médico Legal (IML). Ramon Sandoli afirma que na ficha do rapaz há uma passagem policial por uso de drogas, mas admite ser muito cedo para estabelecer qualquer relação do assassinato com vingança ou envolvimento com tráfico.

Gabriel admite que já foi detido. “Já me pegaram fumando maconha, há sete anos. Hoje, não tenho envolvimento nenhum com isso. Não tenho inimigos, não devo nada a ninguém, muito menos ela devia. Bárbara era totalmente do bem. Sou atleta e gosto de preservar a minha saúde”, disse. O pai dele, o pecuarista Ricardo Quaresma, conta que o filho trabalha desde os 18 anos, em Águas Formosas, no Vale do Mucuri, onde nasceu. Mudou-se para Belo Horizonte para ficar perto da namorada.

Procura-se um carro

A principal pista para tentar começar a esclarecer o mistério pode ser o carro usado pelos criminosos. Polícias Civil e Militar tentam localizar o Stilo, possivelmente com a lataria amassada na traseira. Pela manhã, militares da 22ª Companhia da PM chegaram a perseguir e apreender um carro semelhante no Bairro Santa Cruz, onde mora o suspeito Wagner. O motorista, João Victor de Paulo Castro, conhecido como Fubá, teve descartada a participação no assassinato, embora, segundo o capitão Jardel Aquiles do Carmo, da 22ª Cia. seja infrator conhecido na região.

Diante da pista que se revelou falsa, a Polícia Civil segue na caçada ao Stilo, que o delegado Sandoli tenta identificar por imagens da câmera de uma escola, que registrou toda a ação. “Há um Stilo prata relacionado a vários assaltos na Região Norte e que está sendo investigado há três meses”, disse.

Já o namorado de Bárbara acredita na hipótese de assalto, reforçada pelas palavras dos criminosos ao abordar o casal: “Perdeu, perdeu, perdeu”. “Acho que eles tentaram assaltar. Quando um ladrão estava batendo nela, o carro andou um pouco e ele deu o tiro. Ele não abriu a porta, porque estava travada, mas já chegou segurando a maçaneta e com a arma na cabeça dela. Foi nessa hora que eu a puxei para o meu lado, pedindo calma, que eu ia desligar o carro. Acho que ela tirou o pé da embreagem e o carro começou a andar, dando trancos”, contou Gabriel. “A gente tinha vários planos. Vim do interior com a intenção de me firmar com ela”, disse, chorando.

Bárbara Quaresma Andrade


Neves nasceu em 7 de dezembro de 1989, em Belo Horizonte, filha de Gustavo Andrade e Tânia Quaresma Dalton Santos. Tinha 5 anos quando casal se separou. A menina passou a morar com o pai. Desde que Gustavo se mudou para João Pessoa (PB), há dois anos, Bárbara vivia com a avó paterna, no Bairro Serra, Região Centro-Sul de BH. Cursava o 7º período de relações públicas na PUC, câmpus Coração Eucarístico, Região Noroeste da capital. Estagiava na consultoria ambiental Rosa dos Ventos, em Nova Lima, e também era vendedora autônoma de roupas. Depois de se formar, no fim do ano, planejava fazer um intercâmbio de três meses nos Estados Unidos. Tinha dois irmãos por parte de mãe e, por parte de pai, uma irmã. Foi enterrada ontem, vítima de um crime covarde.

Indignação e sofrimento

“Ela tem de se levantar daí.” O apelo inconformado de Ana Gabriella Pinto, de 22 anos, foi feito diante do caixão cerrado em que jazia a amiga de infância Bárbara Quaresma Andrade Neves, que tinha a mesma idade. O corpo da universitária, assassinada na noite de quarta-feira durante tentativa de assalto, no Bairro Cidade Nova, na Região Nordeste de BH, foi enterrado ontem à tarde no Cemitério do Bonfim.

(foto: Paulo Fonseca/Esp. EM/D.A Press)
(foto: Paulo Fonseca/Esp. EM/D.A Press)


Morador de João Pessoa (PB), o pai de Bárbara, Gustavo Andrade Neto, havia chegado de manhã a BH. O professor de 46 anos soube pelo telefone que a filha havia sido baleada e internada no Hospital de Pronto-Socorro João XXIII. Ele e sua mulher, a jornalista Adriana Alves Pinto, de 45, conseguiram comprar passagens para o voo das 4h40, o primeiro com destino a BH. Antes do embarque no avião, porém, receberam a notícia de que a moça tinha morrido.

“Levamos aquele susto. Na hora, parece inacreditável, parece que é um pesadelo e você vai acordar”, descreveu Adriana. “É a maior dor que um pai pode sentir. Ela era meu maior orgulho”, comentou Gustavo. Ele e Bárbara se encontravam quatro ou cinco vezes por ano e, a distância, se falavam diariamente por telefone ou internet. “Ela sempre me consultava antes de tomar decisões”, contou o pai.

No dia da tragédia, os dois conversaram durante toda a tarde. Combinaram a data em que ela viajaria para a capital paraibana, no fim do ano, após se formar em relações públicas na PUC Minas. Moraria um mês na casa do pai, antes de um intercâmbio nos EUA. “Era uma pessoa cheia de planos. Divertida, de bem com a vida, tinha um astral ótimo. Gostava muito do curso, muitíssimo dos amigos”, descreveu Gustavo.

O velório ocorreu na sala dois do cemitério. O desespero de familiares, amigos, colegas e professores da estudante aumentou com a chegada do carro funerário, pouco antes das 15h. Em pé ao lado do caixão, olhando as trancas da tampa serem afrouxadas, a avó paterna da moça, Marina Neves, de 85 anos, fraquejou: “Acho que não vou aguentar”.

“Minha filha, meu amor”, lamentou Gustavo, baixinho. Apoiado no caixão, em alguns momentos ele parecia ter se conformado, o olhar sereno. Mas depois balançava a cabeça, em negativa, e voltava a chorar. Acariciava a filha com cuidado, como se pudesse quebrá-la. A mãe de Bárbara, Tânia Quaresma Dalton Santos, chorava menos e parecia ainda mais calma. “A serenidade dos pais mostra a certeza do dever cumprido. Eles fizeram por Bárbara o que podiam ter feito”, discursou o padre João Nogueira.

Antes de o caixão ser novamente fechado, Tânia se encorajou a levantar o véu que cobria a moça e acariciar o rosto. Gabriel Quaresma, de 25 anos, namorava Bárbara havia seis anos e se despediu beijando de leve a boca da moça. “Gabriel está passado, não dormiu, fica repetindo: ‘mataram minha Babi. Por que fizeram isso?’”, contou uma prima do rapaz, Carolina Moura Quaresma, de 34.

Pouco depois das 17h, o caixão seguiu rumo ao jazigo 130 da quadra 27. Dezenas de pessoas acompanharam o cortejo. “Ela era tranquila, meiguinha, extrovertida, muito carinhosa. Nunca soube de ninguém que não gostasse dela”, disse Hugo Coimbra, colega de turma. “Ela era brincalhona, espontânea, gentil. Era uma aluna esforçada, dedicada, comprometida com prazos”, garantiu a professora da PUC Lorena Viegas, orientadora do trabalho de conclusão de curso da moça.

O caixão foi lacrado em uma lápide clara, com uma cruz simples em cima. “Não faz sentido nenhum”, sussurrou Gustavo. Uma mulher o abraçou e tentou consolá-lo: “A vida não foi feita para fazer sentido”. O pai, porém, não se resignava. Ergueu o rosto e parecia querer gritar, mas a voz saiu fraca: “Não faz sentido nenhum! Não faz sentido nenhum!”.

(foto: Beto Novaes/EM DA Press)
(foto: Beto Novaes/EM DA Press)
Roubo de carros cresce 22,6%

Na Região Leste da capital, os roubos e furtos de veículos subiram 22,6% de 2010 para 2011, o que fez a área saltar de 4º para o 3º lugar no ranking de BH. As 771 ocorrências de 2010 subiram para 946 no ano passado. Somente no bairro, 10 veículos foram levados com uso de violência entre janeiro e 20 de maio desse ano. O problema da segurança no bairro é reconhecido pelo coordenador de Operações Policiais do Departamento Estadual de Trânsito (Detran), delegado Ramon Sandoli. “O Cidade Nova sempre esteve na mira de bandidos por ser uma região com residências de pessoas com alto poder aquisitivo. E isso é óbvio: o bandido vai onde tem dinheiro”, afirmou, ao mostrar as fotos dos suspeitos de assassinar Bárbara: Thiago Henrique Fernandes dos Santos (na foto da esquerda, na mão do delegado), conhecido como “Terror”, de 21 anos, e Wagner Henrique Soares da Conceição, de 20, que teria disparado o tiro que matou a universitária.


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