O papilomavírus humano (HPV) costuma ser associado principalmente às mulheres, especialmente por sua relação direta com o câncer de colo do útero, que corresponde a mais de 90% dos casos desse tipo de tumor. No entanto, uma nova pesquisa realizada pela MSD com apoio da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) revela um cenário preocupante: os homens ainda sabem muito pouco sobre o vírus e seus riscos.
O levantamento, que ouviu 300 homens entre 22 e 45 anos, de todas as regiões do país, mostra que mais da metade (54%) acredita que o HPV não causa verrugas genitais, e apenas 34% sabem que a infecção pode levar ao desenvolvimento de câncer. Os números reforçam a ideia de que o HPV ainda não faz parte das principais preocupações masculinas quando o assunto é saúde sexual.
O que é HPV?
O HPV é a IST mais comum do mundo, com mais de 200 tipos identificados, dos quais cerca de 5% são de alto risco. Dados globais mostram que, em 2018, 690 mil novos casos de câncer foram associados ao HPV. No Brasil, o câncer do colo do útero, doença diretamente ligada ao vírus, é responsável por mais de 16 mil novos casos e aproximadamente 6 mil mortes anuais.
Apesar disso, crenças equivocadas dificultam a adesão, como a ideia de que apenas meninas precisam se vacinar; o medo de efeitos colaterais graves; e a percepção de que o HPV não representa risco relevante.
Em grande parte dos casos, o próprio organismo consegue eliminar o vírus naturalmente. Entretanto, em alguns casos, o vírus pode persistir no organismo humano e se estiver presente, especialmente os HPVs de tipos 16 e 18, deve ser realizado um exame mais minucioso para descartar uma lesão precursora do câncer, pois se ela for tratada tende-se a interromper a progressão.
O vírus pode ser dividido em dois grandes grupos:
- alto risco
- baixo risco
Desinformação e riscos reais
Entre os entrevistados da pesquisa, 49% desconhecem que exames regulares ajudam na detecção precoce do vírus, enquanto 45% acreditam que usar camisinha é suficiente para prevenir a infecção. Embora o preservativo reduza o risco, não oferece proteção total, justamente porque áreas como escroto e região pubiana podem ter contato direto com o vírus.
Em homens, os sinais mais comuns do HPV incluem verrugas genitais e cânceres relacionados ao vírus. Estima-se que um em cada cinco homens acima de 15 anos esteja infectado com um tipo de HPV capaz de causar câncer. A infecção está associada a 5% de todos os cânceres no mundo, e mais de 80% das pessoas sexualmente ativas terão contato com o vírus até os 45 anos.
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Os dados mostram ainda que, embora 65% dos homens afirmem saber o que é HPV, o vírus não aparece entre as ISTs mais lembradas - ficando atrás de HIV, AIDS, sífilis e gonorreia. Mesmo entre homens das classes A e B, persistem mitos como a crença na proteção total da camisinha ou o desconhecimento sobre a relação entre HPV e câncer.
Falta de rotina médica e tabus
O estudo também demonstra que o cuidado dos homens com a própria saúde ainda é restrito. Em média, eles procuram de uma a duas especialidades médicas, principalmente clínico geral (76%), dermatologista (38%) e cardiologista (32%). A saúde íntima, no entanto, permanece à margem.
Para a urologista Maria Claudia Bicudo, coordenadora da Comissão de Imunizações da SBU, essa lacuna é preocupante.“Os resultados evidenciam que ainda existe uma lacuna importante entre a preocupação dos homens com a própria saúde e o conhecimento real sobre o HPV. Muitos acreditam que o HPV é um problema feminino ou que a camisinha resolve tudo, o que causa uma falsa sensação de segurança. É importante destacar que o uso adequado do preservativo reduz o risco de exposição, mas não elimina completamente a possibilidade de infecção.”
Ela reforça que o vírus pode permanecer latente e se manifestar anos depois, especialmente em períodos de queda de imunidade. O fato de estar em um relacionamento estável, por exemplo, não permite determinar quando ocorreu a infecção.
Campanha “Cuide do Seu”
A pesquisa integra a campanha “Cuide do Seu – HPV em Homens: do tabu à imunização”, organizada pela MSD e pela SBU, que busca combater mitos, incentivar a vacinação e promover a prevenção de forma ampla, envolvendo homens, mulheres, famílias e figuras públicas.
Durante o lançamento da iniciativa, o criador do personagem Menzinho, Fausto Carvalho, foi anunciado como embaixador da causa. Atletas de diversas modalidades também participaram, reforçando que o cuidado com a saúde masculina deve ocorrer durante todo o ano e em todas as faixas etárias.
O ex-jogador Denilson, presente no evento, relatou sua experiência após a aposentadoria.“Os atletas são ‘mimados’ em ter sempre disponível uma equipe médica. Depois que a gente para de jogar, precisa ter iniciativa de cuidar da própria saúde. Lembro de ter uma dor de cabeça muito forte e ligar para o médico do time. Ele perguntou: ‘você tem plano de saúde? Então vai precisar fazer’. Desde então eu me cuido, principalmente pelo histórico de câncer de próstata na família.”
Vacinação: para todas as idades
Para Maria Claudia Bicudo, a vacinação continua sendo a principal forma de prevenção. “As vacinas têm gênero neutro. O melhor momento para tomar é antes do início da vida sexual, porque protege muito mais. Mas mesmo na fase adulta há benefícios, já que a pessoa pode ainda não ter tido contato com todos os subtipos do vírus.”
Ela também esclarece que não há contraindicação para a vacina e que o ideal é aplicá-la a partir dos 9 anos. “O preconceito e a ignorância andam juntos”, afirma, reforçando a importância de campanhas educativas contínuas.
Segundo a urologista, muitos homens têm medo do diagnóstico, e isso impacta até a saúde mental. O papel do médico, diz ela, é informar de forma clara e didática, reduzindo o estigma e incentivando o acompanhamento regular. Pelo menos uma consulta anual ao urologista é recomendada, com avaliação genital completa.
A vacina está disponível gratuitamente no Sistema Único de Saúde (SUS) para crianças e adolescentes de 9 a 14 anos. E, até dezembro de 2025, as vacinas estarão também disponíveis para adolescentes de 15 a 19 anos.
Diagnóstico e tratamento
O HPV não fica sempre ativo: ele pode permanecer latente e ser reativado em momentos de baixa imunidade. Por isso, não é possível determinar quando ocorreu a infecção. A urologista explica que o tratamento envolve remoção das lesões, como verrugas, por meio de cauterização ou procedimentos específicos, dependendo do caso.
A médica também esclarece dúvidas comuns, como a diferença entre HPV e herpes. O herpes simples, por exemplo, costuma ficar latente nos gânglios nervosos, enquanto o HPV permanece na pele e mucosas.
Quanto à vida sexual, a recomendação é clara: com lesões ativas, não deve haver contato sexual. Após o tratamento, o retorno deve ser orientado por um profissional.
Informação como ferramenta de prevenção
Para Fernando Cerino, diretor de Vacinas da MSD, envolver o público masculino no debate é urgente. Ele destaca que “a erradicação do câncer de útero é mais de 90% prevenível, está na hora de falar com os homens”, lembrando que o HPV também causa doenças graves na população masculina, como câncer de ânus, pênis, boca e garganta.
A percepção da saúde masculina também passa por outros medos: câncer, doenças cardíacas e transtornos mentais estão no topo das preocupações dos homens — o que deveria abrir espaço para um cuidado mais amplo e preventivo.
A expectativa de vida reforça essa necessidade: homens vivem, em média, 70,5 anos, enquanto mulheres chegam a 75,6 anos. Muitas mortes masculinas são prematuras e evitáveis, o que evidencia a urgência de ampliar o acesso à informação e ao cuidado médico.
