Como a lei do devedor contumaz fecha o cerco às organizações criminosas
Projeto que vai a sanção presidencial mira empresas de fachada, que costumam sonegar impostos e lavar o dinheiro do tráfico
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A Câmara dos Deputados aprovou na última terça-feira, 9, o projeto de lei complementar nº 125 de 2022, que cria a figura do devedor contumaz — empresa que deixa de pagar impostos de forma reiterada e sem justificativa. O texto já passou pelo Senado e segue para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A lei do devedor contumaz é uma das apostas do ministro Fernando Haddad (Fazenda) para reforçar os cofres federais, A expectativa da equipe econômica é que a norma contribua para o aumento da arrecadação em 2026. Somente no setor de combustível, conhecido pelos sonegadores profissionais, R$ 14 bilhões podem ser pagos em impostos aos cofres públicos, segundo cálculo do ICL (Instituto Combustível Legal).
Pela lei, um processo administrativo será aberto para que o contribuinte possa se defender antes de ser considerado um devedor contumaz. Dados da Receita Federal apontam que, dos mais de 20 milhões de CNPJs existentes no Brasil, pelo menos 1.200 têm dívidas reiteradas, substanciais e injustificadas que poderiam ser classificados como devedores contumazes. Atualmente, a legislação brasileira estabelece que a empresa que paga o tributo devido não pode ser punida porque o processo é extinto com a quitação do débito.
Essa regra tem ajudado organizações criminosas como o PCC a usarem diversas empresas de fachada, que costumam sonegar impostos, para lavar o dinheiro do tráfico. Além disso, as normas vigentes fixam um prazo de defesa nos processos administrativos que garantem prazo suficiente para que novos crimes sejam cometidos sem tempo para a Receita encontrar e bloquear recursos para cobrir os débitos.
O CNPJ com dívida de pelo menos R$ 15 milhões, e patrimônio inferior ao valor da dívida por pelo menos quatro anos, pode ser enquadrado como devedor contumaz. Além disso, essa empresa fica proibida de se beneficiar da extinção dos processos em caso de pagamento do débito tributário. A proposta também prevê o cancelamento do cadastro junto à Receita Federal dos sonegadores reincidentes.
Em relação aos tributos estaduais e municipais, legislações próprias terão um ano para definir valores para caracterizar a dívida substancial. Após esse prazo, caso as normas não sejam definidas, valerá o valor de R$ 15 milhões. No processo, o contribuinte poderá demonstrar que deixou de pagar os tributos de forma justificada se for em decorrência de situações como:
-Estado de calamidade reconhecido pelo poder público;
-Apuração de resultado negativo no exercício financeiro corrente e no anterior, salvo indícios de fraude ou má-fé; ou
-Não praticou atos para esconder patrimônio e fugir à cobrança, como distribuição de lucros e dividendos, pagamento de juros sobre capital próprio, redução do capital social ou concessão de empréstimos ou mútuos pelo devedor.