A Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG) acionou, na última semana, o Tribunal de Justiça do Estado (TJMG) com um mandado de injunção coletivo para cobrar a regulamentação das cotas raciais em concursos e processos seletivos da administração pública estadual, direta e indireta, após identificar a ausência de normas que garantam a reserva de vagas para candidatos pretos, pardos, indígenas e quilombolas. A medida tem como alvos a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) e o governador Romeu Zema (Novo).
Segundo a Defensoria, a falta de regulamentação impede a aplicação de políticas afirmativas previstas na Constituição mineira e compromete a efetivação de direitos fundamentais relacionados à igualdade material, ao acesso ao trabalho e à integração de grupos historicamente marginalizados. A instituição afirma que a omissão afronta também o Estatuto da Igualdade Racial do Estado e tratados internacionais assinados pelo Brasil.
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No pedido encaminhado ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais, a defensoria solicita que o tribunal aplique a chamada “teoria concretista” e determine que, até a edição de norma estadual específica, sejam adotados parâmetros da Lei Federal 15.142/2025, que prevê reserva mínima de 30% das vagas para minorias étnicas em concursos públicos. Assim, a medida serviria como solução provisória para garantir o direito constitucional enquanto o Legislativo e o Executivo não promovem a regulamentação definitiva.
Caso o tribunal rejeite a aplicação imediata da teoria, a Defensoria pede que seja estabelecido um prazo para que governo e Assembleia editem a legislação com a previsão de cotas para as minorias étnicas nos concursos públicos e processos seletivos. Em caso de descumprimento, solicita que os critérios e percentuais previstos na lei federal passem a valer automaticamente nos concursos estaduais.
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O mandado é assinado pelo defensor público Paulo César Azevedo, Coordenador Estratégico de Tutela Coletiva. Ele afirma, em nota divulgada pela instituição, que a ausência das cotas configura “omissão inconstitucional” do Estado e defende que a “regulamentação e efetivação de cotas raciais é uma medida inadiável”. Segundo Azevedo, o Brasil assumiu compromissos internos e internacionais para adoção de ações afirmativas, e a lacuna normativa mantém desigualdades históricas.
“A ausência de cotas raciais nos concursos públicos de Minas Gerais não é apenas uma falha administrativa: é uma omissão inconstitucional que perpetua desigualdades históricas. Com este mandado de injunção coletivo, buscamos assegurar que os direitos fundamentais não fiquem apenas no papel, mas se traduzam em políticas concretas de inclusão e justiça social,” explicou Paulo César Azevedo.
A discussão sobre a ausência de cotas raciais nos concursos de Minas começou a ser tratada pela Coordenadoria Estratégica de Tutela Coletiva (Cetuc) em agosto de 2024, depois que uma candidata procurou o órgão para tomar conhecimento sobre as ações afirmativas em um edital da Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG).
A partir da demanda, foi instaurado o Procedimento Administrativo de Tutela Coletiva (nº 095.2024), que resultou em recomendação extrajudicial, rejeitada pelo Estado, e, posteriormente, em uma ação civil pública (nº 5267813-26.2024.8.13.0024).
Desde então, segundo a Defensoria, a publicação de novos concursos sem reserva de vagas para minorias étnicas se tornou recorrente. Entre eles, o órgão destaca um certame da Secretaria de Estado de Educação (SEE), que abriu dezenas de milhares de vagas sem previsão de cotas. Em razão disso, e após solicitação da Associação Educafro, a Cetuc instaurou um segundo procedimento, o PTAC nº 106.2025, que originou outra ação civil pública sobre o tema.
Para a DPMG, a repetição dos casos e a resistência do governo em adotar as cotas mesmo após recomendações formais justificam a adoção de uma medida mais ampla e estruturante, que atinja toda a administração direta e indireta. A instituição sustenta que a falta de regras estaduais uniformes tem levado à multiplicação das demandas coletivas, enquanto órgãos de controle e instituições do sistema de justiça já adotaram políticas próprias de reserva de vagas.
Em nota, a defensoria afirma que órgãos como o próprio TJMG, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e o Tribunal de Contas do Estado (TCE) já incorporaram cotas raciais em seus concursos, ainda que não exista norma estadual impondo o critério. “A DPMG defende que o mesmo deve se dar em relação aos demais órgãos e entidades estaduais”, acrescenta.
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O governo estadual e a Assembleia Legislativa foram procurados pela reportagem do Estado de Minas, mas não responderam até a publicação da matéria.
