Lula e Trump se reúnem para negociar tarifaço pela primeira vez; o que se sabe até agora

Chefes de Estado, que se encontraram brevemente em setembro, sentaram para conversar pela primeira vez desde a implementação do tarifaço de 50% aplicado pelos Estados Unidos a produtos brasileiros.

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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se reuniu neste domingo (26/10) com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em Kuala Lumpur, na Malásia.

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É o primeiro encontro entre os dois desde que Washington impôs tarifas de 50% sobre produtos brasileiros — medida que provocou a maior crise diplomática recente entre os países.

A reunião acontece durante a participação dos dois líderes na 47ª Cúpula da Associação das Nações do Sudeste Asiático (Asean).

Durante a semana, os dois governos trataram o encontro com cautela.

Até as últimas horas, nem Brasília nem a Casa Branca haviam confirmado oficialmente a reunião, embora os líderes tivessem deixado a agenda livre antes do jantar oferecido pelo primeiro-ministro da Malásia.

A conversa aconteceu em Kuala Lumpur no período da tarde (de madrugada no horário de Brasília).

O encontro foi articulado ao longo de semanas por assessores dos dois governos, desde o breve cumprimento entre Lula e Trump em setembro, durante a Assembleia Geral da ONU, em Nova York.

Na ocasião, o americano afirmou que houve "química excelente" com o brasileiro e indicou estar disposto a fazer uma reunião bilateral.

O presidente dos EUA, Donald Trump, acompanhado pelo secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, pelo secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, e pelo representante comercial dos EUA, Jamieson Greer, em reunião com o presidente Lula acompanhado pelo ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, e outras autoridades
Reuters
O presidente dos EUA, Donald Trump, acompanhado pelo secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, pelo secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, e pelo representante comercial dos EUA, Jamieson Greer, em reunião com o presidente Lula acompanhado pelo ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, e outras autoridades

Nesta sexta-feira (24/10), Lula afirmou a jornalistas em Jacarta, na Indonésia, que não haveria "assunto proibido" no encontro.

"Tenho todo interesse nessa reunião. Quero mostrar que houve equívoco nas taxações, mostrar com números", disse o presidente brasileiro. "Se eu não acreditasse que é possível chegar a acordo, eu não faria reunião."

Trump também comentou sobre a possibilidade de reunir-se com Lula durante a viagem para a Malásia.

Ao conversar com repórteres, quando o presidente americano foi perguntado se estaria aberto a rever e reduzir as tarifas sobre o Brasil, Trump respondeu: "Sim, diante das circunstâncias certas."

O principal objetivo do encontro era tentar destravar o impasse comercial e reduzir as tensões criadas pelas sobretaxas impostas por Washington.

Em setembro, Lula disse que esperava que a conversa fosse entre "dois seres humanos civilizados", quando perguntado se temia constrangimentos como o que ocorreu no tenso encontro em Washington de Trump com o presidente da Ucrânia Volodymyr Zelensky, em fevereiro.

Nesta segunda (27/10), Lula completa 80 anos, mesma idade de Trump. A semelhança foi usada pelo brasileiro para quebrar gelo no encontro.

A viagem de Lula para o Sudeste Asiático, com passagem pela Indonésia e Malásia, faz parte de uma estratégia brasileira de diversificação de rotas comerciais, em busca de caminhos alternativos diante da deterioração nas relações com Washington.

A delegação brasileira inclui ministros de áreas estratégicas, como Alexandre Silveira (Minas e Energia), Carlos Fávaro (Agricultura), Luciana Santos (Ciência e Tecnologia) e Mauro Vieira (Relações Exteriores).

Também acompanham Lula o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, e o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues.

Lula cumprimenta o secretário-geral da Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), Kao Kim Hourn
MAST IRHAM/EPA/Shutterstock
No Sudeste Asiático, Lula quer diversificar rotas comerciais diante da deterioração nas relações com EUA

Do tarifaço ao encontro na Malásia

Trump chega na Malásia
HASNOOR HUSSAIN/REUTERS/POOL/EPA/Shutterstock
Malásia foi considerada território neutro para encontro entre Trump e Lula

Em julho, os Estados Unidos anunciaram tarifas de até 50% sobre produtos brasileiros, atingindo especialmente exportações agrícolas e de carne bovina.

Na época, o governo Trump deixou claro diversas vezes que essas punições tinham natureza política.

Além das tarifas, o Escritório do Representante de Comércio dos Estados Unidos (USTR) abriu uma investigação contra o Brasil, acusando o país de adotar "práticas comerciais desleais".

A Casa Branca também impôs restrições de visto a autoridades brasileiras e sanções financeiras ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, e à mulher dele, Viviane Barci de Moraes.

As medidas foram tomadas em meio julgamento que condenou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por incitar ataques às instituições brasileiras.

O governo brasileiro classificou as sanções como um ataque à soberania nacional e uma tentativa de interferir na independência do Judiciário.

As sanções tiveram como pano de fundo a atuação do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente brasileiro.

O deputado se mudou para os Estados Unidos no início do ano e iniciou articulações junto à Casa Branca para buscar medidas contra o Brasil que pudessem pressionar pela absolvição e pela anistia do pai.

Em setembro, no entanto, Lula e Trump se cruzaram brevemente durante a Assembleia Geral da ONU, em Nova York, mantendo contato próximo desde então.

No dia 6 de outubro, os líderes fizeram uma videoconferência de aproximadamente 30 minutos.

Na conversa, Lula pediu a Trump a retirada da tarifa imposta aos produtos brasileiros e das medidas restritivas aplicadas contra autoridades brasileiras.

Na ocasião, Trump não teria respondido diretamente ao pedido de Lula para a retirada das tarifas e das sanções econômicas e de vistos. O presidente americano teria se limitado a dizer que o tema seria conduzido pelas equipes técnicas dos dois países.

Já em 16 de outubro, o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, e o secretário de Estado americano, Marco Rubio, se reuniram por uma hora na Casa Branca, em Washington.

Em uma breve declaração à imprensa, o chanceler brasileiro disse que encontro foi "muito produtivo, num clima excelente de descontração e de troca de ideias e posições de uma forma muito clara e muito objetiva".

Segundo Vieira, houve "muita disposição para trabalhar em conjunto para traçar uma agenda bilateral de encontros para tratar de temas específicos de comércio".

Pelo lado americano, Rubio e o representante de comércio dos EUA, Jamieson Greer, disseram em um comunicado conjunto que tiveram com o ministro brasileiro "conversas muito positivas sobre comércio e as questões bilaterais em curso".

Segundo a nota, os três "concordaram em colaborar e conduzir discussões em múltiplas frentes no futuro imediato e estabelecer um plano de ação".

O ministro Mauro Vieira participa de reunião com o Secretário de Estado dos Estados Unidos da América, Marco Rubio
Freddie Everett/US. Department of State
O ministro Mauro Vieira participa de reunião com o Secretário de Estado dos Estados Unidos da América, Marco Rubio

Mesmo com os esforços do encontro para tentar selar a paz, os dois líderes também deram sinais de que não pretendiam recuar de suas posições durante a semana que antecedeu o encontro.

Na quarta-feira (22/10), Trump afirmou que os pecuaristas americanos "estão indo bem" graças à tarifa imposta sobre o gado de outros países, como o Brasil.

"Os pecuaristas, que eu adoro, não percebem que a única razão pela qual estão indo tão bem — pela primeira vez em décadas — é porque impus tarifas sobre o gado que entra nos Estados Unidos, incluindo uma tarifa de 50% sobre o Brasil", escreveu em sua rede social.

O republicano acrescentou que, se não fosse por ele, os criadores de gado americanos "estariam na mesma situação dos últimos 20 anos", que classificou como "péssima".

Já Lula, na quinta (23/10), voltou a defender alternativas ao dólar no comércio global. Durante a visita que faz à Indonésia, o presidente afirmou que tanto o Pix quanto o sistema de pagamentos indonésio têm potencial para facilitar o intercâmbio entre os dois países e entre os membros do Brics.

"O século 21 exige que tenhamos a coragem que não tivemos no século 20", disse Lula, ao defender "uma nova forma de agir comercialmente, para não ficarmos dependentes de ninguém", sem citar diretamente os Estados Unidos.

A defesa de moedas alternativas à americana, reforçada pelo Brasil durante a cúpula dos Brics em julho, foi apontada por Trump como um dos motivos para a imposição das tarifas às exportações brasileiras.

Por que reunião entre líderes importa

Lula escuta fala de Trump durante Assembleia Geral da ONU
REUTERS/Al Drago
Em setembro, Lula e Trump se cruzaram brevemente durante a Assembleia Geral da ONU, em Nova York

Do ponto de vista brasileiro, as tarifas foram percebidas como arbitrariedade, já que os EUA acumulam superávit em sua balança comercial com o Brasil.

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Em diversas declarações, Lula questionou a lógica das medidas, alegando que "a tese pela qual se taxou o Brasil não tem sustentação em nenhuma verdade", e prometeu apresentar argumentos nessa linha durante o encontro.

As tarifas, que entraram em vigor em 6 de agosto, afetam diretamente setores estratégicos — especialmente exportadores agrícolas e pecuaristas.

A Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham Brasil) reforçou que, mesmo com a isenção a uma série de produtos, ainda há um impacto expressivo sobre setores estratégicos da economia brasileira.

Em agosto, o governo Lula anunciou um pacote de medidas para mitigar o impacto econômico do tarifaço. As ações incluem linhas de crédito subsidiadas, adiamento da cobrança de impostos e compras governamentais de alimentos dos setores impactados.

Do lado americano, a taxação pode inibir a importação de produtos do Brasil, levando os EUA a tentar aumentar a produção interna, a buscar mercados substitutos ou, caso essas duas alternativas não sejam bem-sucedidas, a reduzir a oferta interna desses itens.

Nesse último cenário, se não houver redução da demanda, a menor oferta pode ter como consequência aumento de preços.

Além do comércio e sanções, a regulação das big techs e da mineração de terras raras, são dois pontos centrais para os americanos. O acesso ao mercado de etanol no Brasil é outra prioridade.

*Com reportagem de Julia Braun, da BBC News Brasil em Londres, e Mariana Schreiber, da BBC News Brasil em Brasília

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