Em "A Máquina do Golpe - 1964: Como Foi Desmontada a Democracia no Brasil", Heloisa Starling disseca dias chave para a tomada do poder que iniciou a Ditadura Militar -  (crédito: Danilo Marques)

Em "A Máquina do Golpe - 1964: Como Foi Desmontada a Democracia no Brasil", Heloisa Starling disseca dias chave para a tomada do poder que iniciou a Ditadura Militar

crédito: Danilo Marques

Há exatos 60 anos, na noite de um dia 31 de março, o general Olympio Mourão Filho partiu de Juiz de Fora com tanques e blindados rumo ao Rio de Janeiro em um movimento que deu início ao golpe que submeteu o Brasil à Ditadura Militar pelos 21 anos seguintes. Aquela não foi a única intervenção dos militares na república brasileira, proclamada, inclusive, por um marechal. Também está longe de ter sido a última tentativa de rompimento democrático vivida no país. Em entrevista ao Estado de Minas, Heloisa Starling, historiadora e professora titular da UFMG, falou sobre seu mais novo livro, que detalha os dias chave para o Golpe de Estado que completa seis décadas neste mês, e trata sobre os detalhes que o tornaram bem sucedido não apenas na deposição de um presidente democraticamente eleito, como na tomada e manutenção do poder.

 

Em "A Máquina do Golpe - 1964: Como Foi Desmontada a Democracia no Brasil" (Companhia das Letras, 2024), Starling conta a história do movimento de ruptura democrática do país em seis dias cruciais para entender o evento. A obra não se furta em tratar de outras tentativas golpistas ocorridas no Brasil, mas que não tiveram sucesso. Perguntada sobre os elementos que podem explicar o porquê da investida militar ocorrida há 60 anos ter sido bem sucedida, a professora começa tratando sobre o conspiracionismo e o apoio de empresários e parte da sociedade ao movimento.

 

 

“Você monta uma rede de conspiração com alguns atores muito importantes. Um são os empresários que vou tratar em um capítulo também sobre como os grandes empresários e banqueiros vão se articular junto com a Escola Superior de Guerra e como esse nó da rede vai permitir recursos financeiros, montagem de projeto político e consideração. Esse é um elo. Outro elemento importante de apoios que permite a sustentação do golpe é o fato de que uma fatia da sociedade vai para a rua fazer a Marcha da Família apoiando o golpe, então tem uma fatia larga da sociedade”, disse.

 

 

A historiadora prossegue tratando sobre o planejamento que possibilitou que os golpistas permanecessem no poder. Ela destaca que a máquina de propaganda teve um papel importante para que os movimentos de derrubada do governo democrático, a instalação de uma ditadura e sua perpetuação por décadas fossem bem executados.

 

“O terceiro elemento foi a criação de uma propaganda ao mesmo tempo capaz de desmoralizar o governo de Goulart e criar o pânico do comunismo, de que o Brasil estava correndo perigo. Essa propaganda passa tanto pela imprensa como pela criação de revistas, panfletos… eles também fazem algo interessantíssimo que são filmes curtos de propaganda e passam isso em cidades do interior. Pensa só: se reuniam todos na praça para ver um filme e ali você faz propaganda ideológica. Além disso, houve apoio internacional. Se você junta esse quebra-cabeça, a gente consegue começar a entender que os militares não estavam sozinhos e esse foi um projeto muito grande”, conclui.

 

"A Máquina do Golpe - 1964: Como Foi Desmontada a Democracia no Brasil" será lançado em fascículos digitais pela Companhia das Letras. Os dois primeiros capítulos foram publicados em março e estão disponíveis para download na biblioteca digital de plataformas como o Google, Apple e Amazon por R$ 9,90. Mais dois capítulos serão lançados em abril e os dois últimos em maio. Ainda no primeiro semestre, a editora publicará a versão física reunindo o conteúdo completo da obra.

 

A entrevista com a professora Heloisa Starling foi publicada na íntegra no caderno Pensar do último sábado (30/3), em edição especial sobre os 60 anos do golpe. À reportagem, a historiadora falou mais sobre o contexto que permitiu o sucesso dos golpistas em 1964, tratou sobre a importância de se recordar o passado para a construção de um repertório de defesa da democracia e comentou eventos atuais que ainda ecoam os anos de chumbo, como as declarações recentes do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e os atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023.