Prefeita de Contagem, Marília Campos, nega racha no Partido dos Trabalhadores, mas demonstra descontentamento com a sigla -  (crédito: Guilherme Bergamini/ALMG)

Prefeita de Contagem, Marília Campos, nega racha no Partido dos Trabalhadores, mas demonstra descontentamento com a sigla

crédito: Guilherme Bergamini/ALMG

O tempo fechou no Partido dos Trabalhadores (PT). Discordâncias sobre o direcionamento do partido têm colocado correligionários de lados opostos. De um lado, a representante da terceira maior cidade do estado de Minas Gerais, a prefeita de Contagem, Marília Campos, também um dos nomes mais proeminentes do PT no estado, diz estar chateada com o afastamento do partido da população, dos movimentos sociais e das prefeituras. Do outro, o presidente da sigla em Minas Gerais, o deputado estadual Cristiano Silveira defende as ações do partido e diz que nunca foi procurado pela prefeita para discutir a relação dela com o PT. 

 

Marília não atribui o seu descontentamento a um "racha" na sigla e adianta não ter pretensão de deixar o partido, apesar de ter recebido diversos convites, segundo ela. “Eu luto para fortalecer o PT”, afirma. Para a representante de Contagem, o PT se distanciou de suas origens. Há mais de 40 anos no partido, ela diz que se vê no direito de criticar as mudanças de curso da sigla.

 

“Como uma militante histórica e com as convicções que eu tenho, eu não só tenho o direito, mas o dever de estabelecer as críticas de acordo com as convicções que eu tenho e que foram educadas, inclusive, nessa relação que eu tenho histórica com o PT. O que eu tenho com o PT é um distanciamento da estratégia política, da relação que o partido tem com os governos municipais de não dialogar, de não estabelecer essa relação. Talvez porque o perfil das direções e o perfil das representações políticas são muito pouco universais, são muitas representações de segmentos”, disse Marília à reportagem do Estado de Minas.

 

Na opinião da prefeita de Contagem, o PT tem se distanciado das lutas dos movimentos sociais e dos sindicatos, mas a sua principal crítica é em relação ao distanciamento municipal. “O PT já teve o número de prefeituras muito grande. Quantas prefeituras tem o PT hoje? Em Minas Gerais o PT tem duas grandes prefeituras, Contagem e Juiz de Fora. Nós já governamos Belo Horizonte, Ipatinga, várias cidades grandes e médias, não só em Minas. Isso é um sinal de enfraquecimento”, pontuou.

 

 

Ao Estado de Minas, o presidente do PT disse que discorda do posicionamento de Marília em relação ao afastamento do partido. Cristiano Silveira faz críticas às declarações da prefeita e ainda afirma que ela está distante do partido. De acordo com o parlamentar, ele não foi procurado em nenhum momento para discutir a relação dela com a sigla.

 

“Eu acho que a prefeita Marília está muito distante do partido porque ela tá sem informação. Nós temos feito vários eventos com os nossos prefeitos, sou procurado por eles permanentemente para conversar sobre estratégia, eleição. Há um movimento de uma vinda de importantes atores, de consolidação dos nossos atuais prefeitos que vão estar aí em torno desse processo. Então, acho que Marília está falando somente por ela e tenta criar aí uma situação de generalidade”, disse o presidente do PT.

 

“Outra coisa são as agendas que a gente sempre tem feito, com os movimentos sociais, movimentos populares, as lutas sociais, especialmente aqui na Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Então acho que, a Marília, se for o desejo dela, está precisando voltar a militar mais no partido”, completou.

 

Ao afirmar que há certo distanciamento de Marília com o PT, Cristiano ainda questiona o interesse das críticas da prefeita ao partido. “Eu duvido muito das intenções dela em realmente querer discutir a relação dela com o partido. Até porque eu, como presidente do partido, nunca fui procurado por ela, por interlocutor, no sentido de solicitar, por exemplo, uma agenda com a direção do PT de Minas. Então, ela quer fazer uma discussão de relação com o partido e imprensa, e eu duvido muito dessas intenções e o partido está curioso, para saber qual a intenção dela com esse jogo. Não está claro para nós o que ela quer”, continuou.

 

Para a prefeita, as suas discordâncias e críticas ao partido não simbolizam um racha, mas sim uma tentativa de fortalecer a sigla. Marília também acredita que faltam vozes no legislativo comprometidas com o municipalismo, que, na avaliação dela é quem tem a relação direta com o povo e com a população. ”O PT erra na sua estratégia para fazer o debate de qual é a melhor política”.

 

“Não tem racha. Eu sou uma pessoa que tem convicções e estou numa fase da minha vida que eu estou disposta a segurar as minhas convicções doa a quem doer. Eu tenho uma obrigação com a minha cidade, se alguém penalizar minha cidade eu vou gritar, porque é com ela que eu tenho compromisso”, disse.

 

ICMS da Educação 


Outra pauta recorrente levantada pela prefeita é o imbróglio envolvendo as regras de repasse do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) da Educação para municípios mineiros. Em setembro do ano passado, a ALMG aprovou um Projeto de Lei (PL) que alterava a distribuição do ICMS no estado e o adequou às regras vigentes de distribuição do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).

 

A proposta aumentou o total do repasse dos municípios atrelados ao sistema de ensino de 2% para 10% do valor e estabeleceu maior peso para critérios de desempenho escolar do que para o número de alunos matriculados. Esta última medida é alvo de críticas por administrações de municípios mais populosos, inclusive de Marília Campos, que reclamam de um desequilíbrio no repasse do ICMS entre cidades grandes e pequenas. Para a prefeita, parlamentares do PT não têm demonstrado forças para ajudar os municípios que travam essa trabalha.

 

"O que me deixa entristecida é o silêncio do PT e a indisposição para não corrigir um erro que significa uma tragédia para educação em Minas Gerais. Quem fala que defende a educação, como a Beatriz Cerqueira, que é inclusive a presidente da Comissão de Educação, a própria Macaé Evaristo, que também defende educação, concordar ou se omitir na correção desse erro para mim é um descompromisso total. E não é descompromisso com a prefeitura, é com 70% dos alunos de Minas Gerais, que estão perdendo”, disse.

 

A reportagem procurou a deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT) para comentar as declarações, mas não obteve retorno.


“Minha crítica central não é nem o erro de antes, é porque quando a gente denunciou, não teve disposição para reverter. Eu tenho uma grande admiração pela Beatriz, pela Macaé, mas olha, eu já estabeleço o meu distanciamento, porque não se pode fazer e votar uma lei dessa e não se dispor a corrigir isso, ficando com essa missão”, completou.

 

Segundo o presidente do PT, Cristiano Silveira, o partido nunca negou dialogar sobre o assunto. "A bancada nunca negou diálogo sobre isso e tem disposição de continuar dialogando, mas me surpreende de novo que o problema dela é com o bloco da oposição [que inclui o PT] e não com o governo, que editou a resolução conjunta 12 de 2023, regulamentando e ali sim definindo os percentuais”, rebateu. 

 

Regime de Recuperação Fiscal

 

À reportagem, Marília também comentou sobre as críticas feitas a ela em relação ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF). À época das discussões do projeto na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), a prefeita afirmou que a não aprovação de um regime poderia ser prejudicial ao estado. No entanto, o PT mineiro sempre se opôs ao Regime de Recuperação Fiscal.

 

A prefeita de Contagem esclarece que a sua preocupação era com os impactos que a não aprovação de um regime poderia trazer para os repasses, como da saúde e educação. Ela ainda ressalta que sempre defendeu um novo RRF, e não o modelo proposto pelo governador Romeu Zema (Novo).

 

 

"Eu fui muito criticada pela direção do PT, mas eu não estava defendendo esse regime (do governador Romeu Zema), eu defendia um regime com novas diretrizes. Qual que é a minha preocupação que o PT nunca toca no assunto, é que é se não aprovasse um Regime de Recuperação Fiscal e o estado tivesse que voltar a pagar as parcelas da dívida, o estado estaria de novo colocando os municípios em uma situação grave, porque iria começar a atrasar repasses da saúde, da educação, como ocorreu no passado", disse.

 

"Parece até que o PT e outros partidos torciam para que voltasse aquela situação anterior porque era uma forma de desgastar o governo do estado (governo Zema). Só que nós não podemos colocar o desgaste do governo do estado em primeiro lugar em detrimento da situação dos municípios. Esse tipo de estratégia eu acho muito condenável", completou.