O escritor baiano Itamar Vieira Junior, autor do consagrado romance “Torto Arado”, esteve em Belo Horizonte nesta terça-feira (9/4) como convidado da edição especial do projeto Letra em Cena, no Teatro do Centro Cultural Unimed-BH Minas. “O que mudou do Itamar de cinco anos atrás para o Itamar de agora é que meus horizontes se alargaram. Tive oportunidade de encontrar leitores, viajar pelo Brasil e por outros países. Lembro que, há alguns anos, eu tinha muito pouco contato com pessoas da literatura e que levavam a sério o gosto pela leitura, e, hoje, me sinto em casa em todo lugar que vou para falar de livros”.

 

Com ingressos esgotados em dois dias de divulgação, o encontro foi conduzido pelo curador do projeto que tem como objetivo a promoção da literatura em língua portuguesa, José Eduardo Gonçalves, e também a participação da doutora em literatura em língua portuguesa e atriz Soraya Martins, que fez uma leitura artística de trechos da obra do romancista.

 



 

Convidado para falar sobre seu processo criativo e suas obras, Itamar explicou a relação carinhosa que tem com os leitores. “Nós costumamos reverenciar muito o escritor, claro! Os autores deram histórias fabulosas pra gente sonhar e ler. Porém não existem escritores se não existissem leitores. Quem dá vida ao livro e as histórias são os leitores e eu sinto que compartilho com cada um deles uma certa intimidade, sabe?”. Ele ainda complementou dizendo que, em muitas das vezes, são os leitores e tradutores que clareiam alguns aspectos da história.

 

O início de Torto Arado


O livro publicado em 2019 e que já vendeu mais de 800 mil exemplares começou a ser escrito bem antes de Itamar Vieira Junior se reconhecer como escritor. “Eu já tinha feito umas 80 páginas há alguns anos. Claro que bem diferente do livro que temos hoje. Mas era com o mesmo enredo e a história de duas irmãs”, revela.

 

A literatura brasileira do século 20 de nomes como Jorge Amado, Rachel de Queiroz, Graciliano Ramos e João Cabral de Melo Neto influenciou a forma de Itamar de desenvolver a sua história. “Inclusive, o título saiu dessa época de referências, eu li Marília de Dirceu, do Tomás António Gonzaga, e um trecho do livro me chamou muito a atenção e foi de onde veio “Torto Arado"".

 

“A devorante mão da negra Morte
Acaba de roubar o bem, que temos;
Até na triste campa não podemos
Zombar do braço da inconstante sorte.
Qual fica no sepulcro,
Que seus avós ergueram, descansado;
Qual no campo, e lhe arranca os brancos ossos
Ferro do torto arado.”

 

A história se perdeu e o encontrou muitas vezes, entre as inspirações para a escrita do romance, Itamar Vieira começou a trabalhar pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), onde foi de fato conhecer o Brasil mais profundamente e desenvolver o repertório social e cultural que utilizou como pano de fundo para a história..

 

 

'Letra em Cena' especial recebe o escritor Itamar Vieira Jr.

Marcos Vieira /EM/DA. Press

 

O impacto internacional


A obra que conta a história de duas irmãs numa fazenda no sertão da Chapada Diamantina despertou a atenção no mundo inteiro, ganhou o Prémio Leya na categoria Romance (2019), Prêmio Jabuti na categoria Romance (2020), Prêmio Oceanos na categoria Romance (2020), Montluc Résistance et Liberté (2024) e a tradução está entre os finalistas do Prêmio The Booker Prize (2024).

 

 

“Acredito que cada leitor se identifica com a obra por um motivo particular. Os leitores brasileiros por um motivo e quem está do outro lado do mundo por outros. A literatura tem essa capacidade de nos restituir à alteridade, né? Uma coisa que eu encontrei no álbum de Malcom Ferdinand, um pensador caribenho que pensa a colonização, é que os pilares da colonização, foi a morte a alteridade. A colonização nos tirou a capacidade de conviver com o diferente e com o outro, e a literatura vai no caminho contrário, ela nos restitui a alteridade, a gente está na vida do outro e vive a vida do outro”.

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