Eric Nepomuceno -  (crédito: PAULA JOHAS/RECORD)

Eric Nepomuceno

crédito: PAULA JOHAS/RECORD

 

Nesta edição especial do Pensar, leia a entrevista com Eric Nepomuceno, amigo de Gabriel García Márquez e tradutor da obra inédita 'Em agosto nos vemos'.

 

Na apresentação de “Gabo & Mercedes” – Uma despedida, você diz que o livro de Rodrigo García “teria sido uma tradução relativamente fácil”, mas quando terminou estava “completamente destroçado”. Ao traduzir “Em agosto nos vemos”, qual foi o seu sentimento? Considerando que é a última obra que traduz de García Márquez, a não ser que existam outras inéditas.


Pois foi um sentimento parecido. García Márquez sempre escrevia sem parar, mas não contava aos amigos o que estava escrevendo. Lembro, por exemplo, que ele me contou – e ao grande poeta e escritor colombiano Álvaro Mutis, seu melhor amigo – quinhentas versões de seu livro de memórias, e nenhuma delas apareceu na edição. Meu sentimento foi de vazio. Eu não ia poder ligar para ele e dizer que tinha entregue a tradução.

 

Rodrigo García conta também que o pai disse: “Trabalho com a minha memória. A memória é minha ferramenta e minha matéria-prima. Não consigo trabalhar sem ela, me ajudem”. E ainda: “Estou perdendo a memória, mas por sorte esqueço que estou perdendo a memória”. Você foi amigo de Gabo por 34 anos. Deve ter sido angustiante ter visto de perto o sofrimento dele. Esteve com ele nestes anos finais de perda de memória?


Sim, estive. E ouvi uma frase inesquecível: “Eu não cuido de nada, não pago contas, não faço nada, nem me preocupo com coisa alguma. E isso é o que me preocupa.” Até o fim, ou quase, ele manteve seu humor. E sua sabedoria certeira.

 

 

É possível dizer que “Em agosto nos vemos”é uma obra feminista diante da liberdade sexual de Ana Magdalena? Seria uma inovação de García Márquez no fim da vida? Aliás, “Em agosto nos vemos” há inúmeras referências a músicas clássicas, inclusive Anna Magdalena Bach é o nome da segunda esposa de Johann Sebastian Bach.


Acho que sim. De verdade. Uma obra libertadora: a mulher que casa virgem, tem dois filhos, é fiel a vida inteira e de repente cai na farra. Ah, sim: ele ouvia música clássica o tempo todo, misturando com canções extremamente populares – e medíocres – colombianas.

 

Qual autor latino-americano você gostaria de ter traduzido ou de ainda traduzir, além dos grandes nomes como Rulfo, Galeano, Cortázar, García Márquez...


Augusto Roa Bastos, mestre paraguaio absoluto, e Héctor Tizón, mestre argentino e meu fraterno amigo que cometeu a indelicada imprudência de partir para sempre.

 

Capa do livro

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