editorial

Violência contra a mulher requer multidisciplinaridade

É comum que a misoginia abarque jovens que fazem parte de uma minoria mas escolhem o caminho da opressão como defesa, numa lógica com potencial destruidor

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O Brasil assiste, nos últimos dias, a diversas ocorrências de violência contra a mulher que tiveram ampla repercussão midiática. Só em São Paulo, Tainara Souza Santos, de 31 anos, teve as pernas amputadas e está internada em estado grave após ser atropelada e arrastada por Douglas Alves da Silva; enquanto Evelin de Souza Saraiva, de 38, levou seis tiros do ex-companheiro, Bruno Lopes Fernandes Barreto, enquanto trabalhava em uma pastelaria.

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Em cada notícia como essa, os veículos de imprensa ressaltam dados como os do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, que apontam para recorde de feminicídios ano após ano no país. São números que fragmentam o tamanho do problema, um dos mais graves do Brasil. Um assunto que, sem dúvida, precisa ser tema do debate eleitoral do ano que vem, mas que merece, desde já, a elaboração e prática de políticas públicas eficientes.


Em primeiro lugar, vale destacar que a misoginia ligada a esses episódios de extrema violência tem explicações diversas e merece um tratamento multidisciplinar. Em entrevista ao podcast Café da Manhã, da Folha de S. Paulo, a promotora Silvia Chakian, do Ministério Público de São Paulo, abordou o tema em três frentes diversas, que precisam coexistir para darmos um primeiro passo rumo ao direito das mulheres de existirem com direitos iguais aos dos homens.


O primeiro passo, na visão dela, é o combate à desigualdade de gênero. Mesmo mais escolarizadas, as mulheres têm menor participação no mercado de trabalho e recebem 21% menos do que os homens, em média, informa pesquisa do IBGE divulgada no ano passado. Essa assimetria cria distorções que se mantêm, sobretudo, da porta para dentro. É principalmente no ambiente domiciliar que eles reafirmam posições de dominação e asseguram a submissão das parceiras – que depois não conseguem, sequer, denunciar a violência sofrida.


Além disso, a promotora ressalta a necessidade de ampliação de políticas públicas já existentes. Principal aposta para proteger a vítima de violência, a medida protetiva é pouquíssimo fiscalizada pelo poder público. Vidas são perdidas por pessoas que tiveram acesso ao mecanismo, mas ainda assim foram mortas por criminosos. Isso se faz com mais investimento e com combate ao sucateamento dessas iniciativas.


Ao mesmo tempo, outro problema que merece atenção é o crescimento de um perfil de vítimas como a dentista Denise Tizo de Oliveira, 27, morta pelo marido, Vinícius Franco de Farias, a facadas, mesmo grávida de oito meses. São crimes cruéis contra vítimas cada vez mais jovens.


Esse recorte merece uma atenção especial por parte do poder público. O feminicídio e as demais agressões contra a mulher são crimes de manifestação de poder. O autor se vê proprietário daquele corpo feminino. O fato de os mais jovens estarem tão envolvidos nos milhares de registros ocorridos por ano aponta para a necessidade de discutir a questão dentro das escolas.


É na adolescência, momento no qual nos reconhecemos em relações amorosas de maneira inédita, que os jovens precisam debater sobre o consentimento e o direito de negação de ambas partes do contrato social. Sem essa abordagem multidisciplinar, que precisa começar até mesmo na primeira infância, os jovens são iscas fáceis para discursos misóginos presentes, por exemplo, na internet, que transformam essas pessoas, muitas vezes decepcionadas após algum episódio de frustração, em potenciais agressores.


Aqui, cabe o papel dos pais na vigilância sobre aquilo que o filho consome, principalmente no celular. É preciso monitorar de perto, pois adolescente não deve ter sua privacidade 100% assegurada neste momento da vida, afinal ainda está num período de formação intelectual e social.


Neste sentido, a prevenção é o melhor remédio. No podcast citado, a promotora Silvia Chakian relata a dificuldade de "virar a mesa", após o adolescente ser capturado pelo discurso misógino. Em suma, a comunidade red pill – pessoas que deslegitimam experiências femininas e promovem rivalidade entre os sexos na internet – se baseia em uma ideologia totalmente incoerente, o que dificulta a abordagem de especialistas, como psicólogos.


É comum que a misoginia abarque jovens que fazem parte de uma minoria, por exemplo, mas ainda assim escolhem o caminho da opressão como defesa, numa lógica com potencial destruidor.

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