Adaptação climática do SUS exige eficiência
O governo federal acerta ao anunciar um investimento de quase R$ 10 bilhões para a adaptação das unidades do Sistema Único de Saúde em projeto que inclui a cons
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Uma das manifestações mais incontestáveis da crise climática, o calor extremo tem efeito pandêmico: mata anualmente mais de 540 mil pessoas – quase 1.500 por dia, segundo relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS). O mesmo estudo, divulgado em meio às negociações da COP30, indica que um em cada 12 hospitais no planeta precisa interromper o funcionamento em razão de estragos provocados por tempestades, alagamentos e outros fenômenos do tipo. Maior vulnerabilidade psíquica, aumento de doenças infecciosas, queda na qualidade nutricional dos alimentos e baixa oferta da água também fazem parte da lista de impactos na saúde humana causados pelos extremos climáticos. É suicida, portanto, não considerá-los na gestão atual de qualquer comunidade.
Nesse sentido, o governo federal acerta ao anunciar um investimento de quase R$ 10 bilhões para a adaptação climática das unidades do Sistema Único de Saúde (SUS). O projeto inclui a construção de novos edifícios e a aquisição de equipamentos resilientes às intempéries, entre 27 metas e 93 ações a serem implementadas até 2035. Trata-se do plano de rotas do AdaptaSUS, lançado na conferência de Belém como uma iniciativa vanguardista para mitigar os efeitos da crise ambiental na saúde da população brasileira.
Há medidas de curto, médio e longo prazo a serem implementadas em um sistema de efetiva capilaridade com o objetivo de fortalecer a vigilância, capacitar profissionais e adaptar instalações. Também estão previstos investimentos em pesquisa e criação de plataformas integradas de dados. Nas palavras do ministro da pasta, Alexandre Padilha, as iniciativas vão convergir em um sistema que “se antecipe, responda e se adapte às mudanças climáticas para garantir atendimento a todos”.
Será preciso correr contra o tempo para chegar a importante estrutura. A projeção da ONU é de que o mundo deve superar 1,5oC de aquecimento até 2035, e dados oficiais revelam que apenas 54% dos planos nacionais de adaptação em saúde avaliam riscos às unidades de saúde, um dos pontos do AdaptaSUS. Cenário parecido repete-se na seara estadual, evidenciando que essa precisa ser uma pauta prioritária nas eleições daqueles que assumirão postos no Executivo e no Legislativo até ao menos 2030.
Para além de ajustes nas instalações, há de se considerar uma possível cronicidade no manejo de doenças já complexas no país, como as renais e as cardiovasculares. O AVC, por exemplo, mata um brasileiro a cada seis minutos e é a complicação que sofreu a principal carga global em saúde associada a altas temperaturas nas últimas três décadas – um aumento de 72%. Para ser eficiente, o hospital do SUS resistente a alagamentos, portanto, também precisará ter condições de atender a um paciente com derrame em até quatro horas e meia, a janela de intervenção que garante menor risco de morte e sequelas graves.
Há de se reconhecer que a preocupação do governo brasileiro com a interseção entre crise climática e saúde merece destaque. É, inclusive, apontada como um dos avanços da COP30. Pela primeira vez, a pauta saiu das discussões paralelas da conferência do clima e figurou entre as prioritárias. Anunciada pelo ministro Padilha durante o 14º Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva, no último domingo, em Brasília, a adaptação do SUS engrossa o entendimento de que se trata de prioridade. Não há de ser diferente. A crise climática impõe urgências, mas espera-se a condução das propostas também com embasamento técnico, responsabilidade fiscal e eficiência.