editorial

Tentativa de golpe na Bolívia serve de alerta

O fracasso do golpe é uma demonstração de que as instituições democráticas têm resiliência na América do Sul. O episódio também serve de lição política

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A Bolívia, seu nome já diz, deve sua independência às tropas do líder político e chefe militar Simón Bolívar, um dos libertadores das ex-colônias espanholas das Américas, ao lado de José de San Martín e Bernardo O’Higgins, principalmente. Seu primeiro presidente foi o marechal Antônio José de Sucre, eleito em 1825. Não por acaso, os militares bolivianos sempre tiveram protagonismo na vida política do país – porém, a maioria das vezes, por meio de golpes de Estado que resultaram em algumas das ditaduras mais sanguinárias do continente. Foram quase 200 sublevações armadas; dos 37 governos republicanos, 23 resultaram de golpes de Estado. A Bolívia é o país mais instável da América do Sul.


Felizmente, a última tentativa de golpe militar, na quarta-feira, fracassou. Foi contida pela firme atuação do presidente Luis Arce, após soldados e veículos militares assumirem o controle da Praça Murillo, na capital administrativa boliviana, La Paz, e invadirem o Palácio Quemado, antiga sede do governo. O general Juan José Zúñiga, recentemente destituído do cargo de chefe do Exército, após fazer declarações contra o ex-presidente Evo Morales, liderou a tentativa de golpe. Foi contido devido à firmeza de Arce, que o enfrentou pessoalmente, à reação popular e à não adesão da maioria do Exército boliviano. Zuñiga foi preso.


Houve grande reação internacional à tentativa de golpe, inclusive do Brasil, que se articulou com os demais países do continente para manter o atual governo. Diante da onda de extrema direita que varre o mundo, o fracasso do golpe é uma demonstração de que as instituições democráticas têm resiliência na América do Sul, inclusive na Bolívia. Infelizmente, aqui no Brasil, alguns parlamentares de extrema direita chegaram a comemorar o golpe, que acabou fracassando. O episódio também serve de lição política.


Um dos fatores que estimularam a tentativa de golpe é a divisão do Movimento ao Socialismo (MAS), o principal partido da base do governo. Essa cisão começou em setembro passado, quando o ex-presidente Evo Morales anunciou sua candidatura às eleições de 2025 e desafiou Arce, que tentará a reeleição. O ex-presidente chegou a dizer que o governo tenta barrar sua candidatura e que haveria uma “convulsão”no país se isso ocorresse. Morales foi presidente por 14 anos.


Por causa da disputa com Morales, Arce perdeu a maioria no Congresso, enquanto Morales acusava o governo de tolerar a corrupção. A crise política ajudou a deteriorar o ambiente econômico. Houve redução na produção de gás, após a reestatização das empresas de hidrocarboneto. As reservas passaram de US$ 15,12 milhões em 2014 para US$ 1,79 milhão em abril de 2024, segundo o Banco Central boliviano. Isso afeta as empresas que fazem comércio exterior.


O desequilíbrio econômico e a bagunça no câmbio provocaram inflação e afetaram o abastecimento. Não há somente aumento dos preços. Por escassez de dólares, muitos produtos sumiram do supermercado. Os combustíveis são subsidiados, o que sobrecarrega o orçamento público, e estão com a distribuição prejudicada. A Bolívia importa 56% da gasolina e 86% do diesel que consome.


Resultado: comerciantes e caminhoneiros realizaram manifestações e 200 dias de bloqueios desde 2023, em várias cidades do país; vendedores ambulantes marcharam para La Paz; imensas filas se formam nos postos de combustíveis. Nada disso, entretanto, legitima um golpe de Estado. O próprio Evo Morales, em parte responsável pela desestabilização do governo, condenou a tentativa de golpe. Todos os governos vizinhos foram pegos de surpresa, inclusive o brasileiro, o que é muito preocupante. 

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