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Cinquenta anos após a morte de Herzog, relatórios da Comissão da Verdade e do projeto Tortura Nunca Mais revelam que o caso não foi isolado, mas parte de uma política de Estado que institucionalizou a tortura no Brasil

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Cinco décadas depois da morte do jornalista Vladimir Herzog, torturado até a morte nas dependências do DOI-Codi, em São Paulo, em outubro de 1975, o Brasil ainda busca respostas sobre as marcas deixadas pela repressão. O caso, que chocou o país e expôs o sistema de violência do regime militar, não foi um fato isolado — mas o retrato de uma engrenagem de Estado voltada à perseguição, à censura e à eliminação de opositores políticos.

Relatórios oficiais da Comissão Nacional da Verdade (CNV) e do projeto Brasil: Nunca Mais/Tortura Nunca Mais comprovam que a tortura foi prática sistemática e generalizada entre 1964 e 1985. Criado por juristas e religiosos ligados à Arquidiocese de São Paulo, o Brasil: Nunca Mais analisou mais de um milhão de páginas de processos militares, identificando 1.843 casos de tortura e mais de 350 mortos e desaparecidos políticos.

Já a CNV, instituída em 2012, mapeou 377 agentes do Estado diretamente envolvidos em violações de direitos humanos. O relatório final, publicado em 2014, destacou que a tortura foi praticada em centenas de centros oficiais, entre eles o DOI-Codi, o DOPS e unidades militares em todo o território nacional.

Criméia Alice Schmidt de Almeida, militante da resistência armada, foi torturada grávida de sete meses no DOI-Codi de São Paulo, em 1972.

“Fui pendurada no pau-de-arara, levei choques elétricos, apanhei e ouvi outros sendo torturados. Quando perceberam que eu estava grávida, começaram a me ameaçar dizendo que fariam o bebê nascer ali, de qualquer jeito.”

O filho de Criméia nasceu prematuro, e ela só o conheceu meses depois, já em liberdade. O caso tornou-se símbolo da crueldade institucionalizada do regime.

De acordo com os levantamentos da CNV, os métodos mais utilizados incluíam choques elétricos, pau-de-arara, afogamento, espancamentos e violência sexual. O relatório também registrou o uso da tortura contra mulheres grávidas, crianças e religiosos, evidenciando o caráter desumano e abrangente da repressão.

Maria Amélia de Almeida Teles, presa em 1972, relatou à Comissão da Verdade: “Eles me bateram tanto que eu desmaiei várias vezes. Amarraram minhas mãos e pés, aplicaram choques nos seios e na vagina. Quando meus filhos chegaram, um agente os colocou na minha frente e disse: ‘Olha como está sua mãe’. Essa cena me persegue até hoje.”

O caso, amplamente documentado pela CNV, tornou-se um dos símbolos da violência de gênero durante a ditadura.

Mesmo após o fim do regime, a CNV concluiu que a tortura não desapareceu das instituições brasileiras. Persistem práticas abusivas em delegacias e presídios, especialmente contra pobres, negros e periféricos — consequência da impunidade e da Lei da Anistia de 1979, que ainda impede a punição de crimes de lesa-humanidade.

Para o movimento Tortura Nunca Mais, que há mais de quatro décadas luta por memória e justiça, reconhecer o passado é essencial para que ele não se epita.

“Enquanto o país não enfrentar suas feridas, continuará condenado a conviver com a violência institucional”, afirma o manifesto da entidade.

Cinquenta anos após Herzog, o país ainda enfrenta o desafio de transformar lembrança em aprendizado. Cada testemunho resgatado e cada número revelado reafirmam que a democracia se fortalece não com o esquecimento, mas com memória, verdade e justiça.


“Eles me bateram tanto que eu desmaiei várias vezes Quando meus filhos chegaram, um agente os colocou na minha frente e disse: ‘Olha como está sua mãe’ ’’

Maria Amélia de Almeida Teles, presa em 1972, relatou à Comissão da Verdade:

“Fui pendurada no pau-de-arara, levei choques elétricos, apanhei e ouvi outros sendo torturados’’

Criméia Alice Schmidt de Almeida, militante da resistência armada, foi torturada grávida de sete meses no DOI-CODI de São Paulo


Tipos de torturas praticadas nos porões da ditadura

Reprodução


Pau-de-arara

Os presos eram pendurados de cabeça para baixo em uma barra de ferro atravessada entre os joelhos e os braços, amarrados juntos. Foi um dos métodos mais usados no DOI-CODI de São Paulo, inclusive no caso de Vladimir Herzog.

Reprodução

Choques elétricos

Eletrodos eram aplicados em partes sensíveis do corpo, língua, genitais, orelhas, mamilos e pés, conectados a uma manivela ou bateria.


Afogamento (técnica do submarino)

A cabeça da vítima era mergulhada em água suja, urina ou esgoto, impedindo a respiração. Havia também o “submarino seco” (com saco plástico na cabeça).


Surras e queimaduras Socos,

pontapés e golpes com cassetetes, cabos de vassoura e fios elétricos eram rotina. Em alguns casos, cigarros ou ferros aquecidos eram usados para marcar o corpo.


Violência sexual

Tanto homens quanto mulheres eram despidos, humilhados e violentados durante os interrogatórios. Muitas mulheres relataram estupros cometidos na frente de outros presos ou de familiares.


Tortura psicológica
Incluía privação de sono, isolamento prolongado, ameaças de morte, gritos de outros presos sendo torturados e exibição de familiares feridos.


Números da repressão

377

agentes do Estado identificados como responsáveis diretos ou indiretos por tortura, assassinatos e desaparecimentos


434

mortos e desaparecidos políticos reconhecidos oficialmente


1.843

casos de tortura documentados em processos militares analisados pelo Brasil: Nunca Mais.

Centros de tortura

DOI-CODI de São Paulo Rua Tutóia: epicentro da repressão; centenas de presos políticos passaram por suas celas.

Casa da Morte (Petrópolis, RJ) centro clandestino usado pelo Exército para tortura e execução de militantes desaparecidos.

Base Aérea do Galeão e Ilha das Flores (RJ) locais de interrogatórios e prisões ilegais.

OBAN (Operação Bandeirante) – núcleo inicial da repressão paulista, que inspirou a criação do DOI-CODI.

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