HOMICÍDIO

Caso Thainara: promotor que acusou médicos é denunciado na Corregedoria

Reclamação enviada à Corregedoria Nacional do Ministério Público afirma que promotor agiu com "parcialidade" e "blindou" militares apontados como responsáveis

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Os promotores responsáveis pelo pedido de arquivamento do processo contra os policiais militares envolvidos da operação que, segundo laudo de necropsia, resultou na morte de Thainara Vitória Francisco Santos, de 18 anos, em novembro de 2024, foram denunciados à Corregedoria Nacional do Ministério Público.

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De acordo com o documento, Guilherme Heringer de Carvalho Rocha e Samira Rezende Trindade Roldão, atuantes na 2ª Vara Criminal da Comarca de Governador Valadares, agiram com “parcialidade” e “blindaram” os policiais que, segundo as investigações, seriam responsáveis pela morte da jovem. 

O ofício foi enviado pelo presidente do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG), Durval Ângelo Andrade, e pela presidente da Comissão de Direitos Humanos, da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), Bella Gonçalves (Psol).

Conforme o Estado de Minas noticiou no início de outubro, além do arquivamento das investigações contra os militares, o MPMG também denunciou duas enfermeiras, um médico e duas técnicas de enfermagem que teriam atendido Thainara na Unidade de Pronto Atendimento de Governador Valadares. Os profissionais foram acusados por homicídio simples, por omissão de socorro.

Na reclamação disciplinar, a parlamentar e o conselheiro afirmaram que a atuação dos promotores evidencia que a denúncia enviada à Justiça “confronta elementos essenciais dos autos”. “Embora reconheçam que a vitima deu entrada ‘desfalecida’ na UPA - conforme consta desde as primeiras páginas da denúncia - e que há vídeos, testemunhos e laudos que registram agressões e contenção física realizadas pelos policiais durante a abordagem, os membros do Ministério Público deixam de enfrentar tecnicamente esse acervo probatório”.

À imprensa, Bella Gonçalves afirmou que a atuação dos promotores foi “atípica”, “duvidosa” e de “blindagem”. Na denúncia, a deputada reforçou que, além da acusação desconsiderar o laudo pericial que constatou que Thainara foi vítima de asfixia por estrangulamento, o documento apresenta trechos que “extrapolam a análise técnica” esperada de membros do MP. “Incluindo especulações sobre o comportamento da família e interpretações subjetivas que não encontram lastros objetivo nas provas dos autos”.

O Estado de Minas procurou o MPMG para comentar sobre a denúncia contra os promotores, mas até o fechamento desta edição não houve resposta.

Qual foi a denúncia do MPMG?

Cinco meses depois da conclusão do inquérito policial, o promotor Guilherme Heringer de Carvalho Rocha foi na contramão do entendimento do delegado responsável pelas investigações e decidiu denunciar à Justiça os profissionais de saúde que atenderam a vítima.

No documento, o promotor afirma que laudos complementares apresentados por representantes dos militares e verificados pela Central de Apoio Técnico do MPMG, indicam que Thainara teve uma parada cardiorrespiratória e não foi socorrida pelos profissionais.

“O que se verificou nos prontuários da UPA foi que a paciente Thainara teria dado entrada na unidade em parada cardiorrespiratória por volta das 21h e que, sem que tivesse sido buscada sua reanimação por nenhum dos denunciados, apenas foi administrado Eletrocardiograma, às 22:14h, mais de 1 h depois de sua chegada, limitando-se os acusados a 'declarar o óbito' por meio de tal exame, omitindo-se, portanto, de prestar socorro que podia ter salvado a vida da jovem. Em síntese, os denunciados não fizeram absolutamente nada”, afirmou Rocha.

Em 27 de setembro, o juiz da 2ª Vara Criminal da Comarca de Governador Valadares recebeu parcialmente a denúncia do MPMG. Na decisão, o magistrado afirmou que as técnicas de enfermagem não tinham poder para decidir, ou não, atender Thainara e, por isso, tornou réus o médico e a enfermeira da unidade de saúde. Em relação ao pedido de arquivamento do processo contra os militares, o juiz indeferiu o pedido e encaminhou os autos para análise do Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

O que disseram os advogados da família de Thainara?

Na época, ao EM, Márcio Santos e Matheus Lopes, advogados da família de Thainara, afirmaram que, além da demora, o resultado do inquérito não foi satisfatório por não apontar, de fato, os culpados por sua morte. Para Lopes, o delegado responsável pelas investigações agiu com corporativismo.

“Demorou-se mais de seis meses e o inquérito foi concluído. Teve um relatório final, para o pai dela principalmente, totalmente vergonhoso [...] O delegado não atribui a ninguém a autoria de crime. Ele simplesmente disse que eles cometeram fraude processual, mas não fala qual o militar, não atribui autoria de ninguém. O que deixa o trabalho dele incompleto. O outro resultado dessa investigação ele concluiu que houve um crime militar de homicídio culposo, qualificado em omissão de socorro. E aí ele faz a mesma coisa. Simplesmente deixa em branco. E aí como é que você vai processar? A operação teve 23 militares. O Ministério Público vai processar os 23 militares por omissão de socorro? Não vai”, critica Márcio.

Além disso, o advogado afirma que o delegado não levou em conta o laudo de necropsia, que apontou que o corpo da jovem tinha diversos hematomas. “A causa morte do laudo pericial do IML é asfixia por constrição extrínseca do pescoço, que por si só é um crime doloso. Ninguém asfixia uma pessoa com um mata leão sem a intenção de matar. Ele [ o delegado] não indiciou os militares nem por lesão corporal. Nem por uma tortura seguida de morte. Ele simplesmente fala que teve um homicídio culposo. E aí, fala que como foi um homicídio culposo, os autos têm que ser remetidos para a Justiça Militar apurar”, afirma Santos.

Como foi a ocorrência?

O caso aconteceu no Residencial Ibituruna II, no Bairro Vila dos Montes, em Governador Valadares (MG), no Vale do Rio Doce. Na época, Vitória foi presa por supostamente agredir policiais ao tentar proteger o irmão, diagnosticado com retardo mental moderado. Uma gravação, feita por vizinhos da família, registrou a jovem do lado de fora do apartamento sendo contida pelos militares enquanto populares alertam que "o menino é doente da cabeça" e que ele "não é envolvido [com o crime]".

Nas imagens, ao menos oito agentes seguem usando a força para imobilizar os irmãos. "É só ele parar de resistir", diz um dos oficiais. Thainara foi presa, mas, por ter se sentido mal, foi levada de viatura a um hospital. Ao chegar à porta da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Vila Isa, a menos de dez minutos da casa, foi encontrada inconsciente. Um médico constatou o óbito ainda no local.

O exame de corpo de delito de Thainara, feito no Instituto Médico Legal (IML) de Governador Valadares, apontou que a jovem morreu devido a uma asfixia por constrição extrínseca do pescoço por objeto contundente.

O documento aponta que a jovem tinha vários hematomas e escoriações pelo corpo, incluindo na região do pescoço. Entre os ferimentos descritos pelo laudo pericial, que o Estado de Minas teve acesso, estão: edemas na parte inferior e lateral do olho direito; escoriações abaixo da mandíbula; hematomas na região do colo, pescoço e queixo.

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Além disso, o legista que assina o documento aponta que os “achados necroscópicos” apontados pelo exame são compatíveis com estrangulamento. Outro ponto apresentado no laudo final é que os edemas encontrados no corpo de Thainara não indicam que a possibilidade de esganadura, ou seja, enforcamento com as mãos, mas sim com “estrangulamento antebraquial”, quando a laringe é comprimida pelo braço e antebraço, popularmente conhecido como “mata-leão”.

“Não há evidências, no exame necroscópico descrito no laudo referência, de que tenha havido constrição cervical pelas mãos (esganadura). A análise dos achados necroscópicos permite a conclusão de que o meio utilizado na constrição cervical foi contundente, devendo ser considerada a possibilidade de estrangulamento antibraquial como principal hipótese, sem prejuízo à eventual utilização de outro objeto”, indicou o legista.

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