Perigo, ladrões na pista: quadrilhas traçam rotas para roubar caminhões
Grupos especializados no ataque a carregamentos têm territórios preferenciais de ação, tanto em rodovias federais quanto nas estaduais
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Brumadinho, Florestal, Francisco Sá, Grão Mogol, Itatiaiuçu, Montes Claros, Sabará e São Gonçalo do Rio Abaixo – Um cruzamento de dados da Secretaria de Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais (Sejusp) com os da Polícia Rodoviária Federal (PRF) mostra que os braços das quadrilhas de roubo de cargas e veículos pesados são regionalizados. Os municípios com mais ataques em rodovias estaduais são os mesmos que se destacam nas federais.
Betim (Grande BH), Cachoeira de Pajeú (Vale do Jequitinhonha), Salinas (Norte) e Extrema (Sul de Minas) lideram os roubos em vias estaduais. Isso sugere que as quadrilhas dominam esses territórios, usando as vias municipais e estaduais para ataques e fuga após crimes nas BRs.
Para a Confederação Nacional do Transporte, a solução passa por maior investimento em segurança pública, inteligência e coordenação. A consultoria internacional de gerenciamento de riscos e segurança logística ICTS Security recomenda rastreamento em tempo real e bloqueio remoto de veículos, além de treinamentos e verificação de antecedentes de trabalhadores e cooperação entre os setores público e privado para combater os ataques a cargas.
Outro dado alarmante no que diz respeito à segurança no setor de cargas é a alta incidência de saques a cargas tombadas, muitas vezes registrados como crime. Nada menos que 31,8% dos furtos (1.962 ocorrências) e 17% dos roubos (733 ocorrências) foram associados a saques, ligando diretamente o risco de acidentes ao risco criminal.
Crime tecnológico
Drones, rádios criptografados e comunicações via aplicativos estão mais presentes nas ações de quadrilhas de furtos de cargas, invasões a empresas e assaltos a estabelecimentos comerciais. Para o diplomata Renato Werner, especialista em tecnologia aplicada à segurança pública e defesa, a adoção de tecnologias de bloqueio e interceptação de sinais pode representar avanços na prevenção e combate à criminalidade no setor produtivo.
“Criminosos têm utilizado drones para vigiar rotas de transporte, acompanhar deslocamentos de cargas e até mapear a rotina de empresas antes de ataques. O bloqueio inteligente desses sinais devolve o controle da operação às equipes de segurança, reduzindo drasticamente o risco de perdas e prejuízos”, afirma Werner, fundador da Polsec, empresa referência em bloqueio de sinais e guerra eletrônica nas Américas.
“O investimento em tecnologia de bloqueio não é apenas uma questão de segurança pública — é também um instrumento de proteção econômica. Um caminhão interceptado ou uma loja invadida representam prejuízos diretos, comprometem empregos, abastecimento e credibilidade da marca”, salienta Werner.
O diretor de Operações da PRF, Marcus Vinícius de Almeida, destaca que em termos de efetivo, apesar de a malha brasileira ser ampla e ramificada, com 75 mil quilômetros, a corporação consegue atuar por meio de inteligência. “Fazemos um trabalho muito forte e há corredores principais de maior atuação, como nas rodovias de Minas Gerais, São Paulo e Paraná, nas vias de escoamento de cargas para os portos. Desde 2023, pontualmente temos baixando os índices de roubos de carga”, afirma.
O agente destaca que um fator que atrapalha a atuação policial é a subnotificação. “Às vezes o roubo acontece nas rodovias federais, é repassado para a Polícia Civil nos municípios e a gente acaba perdendo essa informação. Fica mais difícil o trabalho da inteligência e combate se não soubermos onde ocorrem os crimes”, avalia o diretor.
Concessionária do segmento de BH a São Paulo da BR-381 – a que mais registra crimes –, a Arteris Fernão Dias informa que, nas ocorrências relacionadas às ações criminosas ocorridas na rodovia que administra, por se tratarem de assunto afeto à segurança pública, “as ações são de responsabilidade da Polícia Rodoviária Federal”.
A Autopista Régis Bittencourt (BR-116 de SP a Curitiba) e a Autopista Litoral (BR-101/SC, BR-116/PR e BR-376/PR) destacam não possuir atribuição relacionada à segurança pública e informam que em situações dessa natureza fazem o acionamento da PRF.
A Via Cristais, que opera a BR-040 entre BH e Brasília, informa que até o terceiro ano da concessão (2028) terá mais de 300 câmeras ao longo do trecho para ampliar a capacidade de gestão da segurança pública e contribuir com as polícias. A EPR Via Mineira, concessionária da mesma rodovia no segmento de BH a Juiz de Fora, informou manter cooperação com os órgãos de segurança, colaborando em operações e disponibilizando imagens do sistema de monitoramento. “O novo Centro de Inteligência em Segurança Viária para a PRF tem acesso a 267 câmeras da rodovia e uso de inteligência artificial para identificação de comportamentos de risco. Até 2027, todo o trecho estará coberto pelo sistema”, informa.
A Nova Rota Oeste (BR-364 e BR-163) informa que “embora não tenha poder de polícia, a concessionária atua em parceria com a PRF e a Secretaria de Segurança e Justiça de Mato Grosso (Sejus), disponibilizando imagens do sistema de segurança e apoiando os órgãos de segurança sempre que necessário”. As demais concessionárias de trechos citados na reportagem foram procuradas e não se manifestaram.