Folia

Folia "raíz" é colocada em xeque por Liga Belorizontina de Blocos Carnavalescos. Preocupação é valor dado à cultura local

crédito: Ramon Lisboa /EM/D.A Press

A Liga Belorizontina de Blocos Carnavalescos divulgou uma nota em que expressa preocupação com o que define como “a crescente invasão de artistas de fora no Carnaval de Belo Horizonte”. A entidade cita como exemplo o desfile do bloco Beagá na Folia, que tem como atrações o cantor sertanejo Michel Teló e a dupla Clayton e Romário. O bloco é gratuito e vai desfilar nos dias 11 e 12 de fevereiro, nas ruas do entorno do Mineirão, na Pampulha. O organizador do Beagá na Folia, por sua vez, alega que a intenção é fortalecer o Carnaval de BH.

Geo Ozado, diretor de relações institucionais da liga e fundador do bloco Baianas Ozadas, diz que é preciso valorizar e reconhecer quem criou o cenário do Carnaval na capital. O diretor da liga ressalta que a questão é uma proteção cultural para um conceito e modo de Carnaval. “Infelizmente, não vemos esse cuidado da prefeitura aqui. Se esse bloco está acontecendo, ele tem a conivência do poder público”.

O organizador reclama que, atualmente, os artistas locais já não têm quase nenhum espaço e reconhecimento. “Aí que vai ter menos ainda. É uma falta de responsabilidade do poder público e de cuidado com os agentes culturais da cidade.” Ele ressalta ainda que os sertanejos atraem muito mais patrocínio privado que os blocos daqui jamais conseguiram. “Já é difícil patrocínio e vai dificultar mais ainda”.

Mas mesmo com essa dificuldade, o diretor da liga alega que os blocos conseguem fazer o Carnaval da capital ser um sucesso. “Se a prefeitura anuncia no balanço anual que teve 4,5 milhões de turistas e mais de um bilhão (de reais) de movimentação financeira, isso se deve a quem atrai o público”. O presidente da Liga das Escolas de Samba de BH, Márcio Eustáquio, tem um posicionamento semelhante. “A gente não consegue compreender como os investimentos locais são direcionados a artistas de fora em um momento em que a gente precisa tanto valorizar a prata da casa”.

Valorizar e somar

O fundador e mestre de bateria do Samba Queixinho, Gustavo Caetano, não vê problema em artistas de fora desfilarem em blocos no Carnaval da capital. Porém, para ele, primeiro é preciso valorizar o que é feito aqui. “É complementar, não é dividir nem excluir. Tem que ter equilíbrio e, antes de qualquer coisa, os blocos, escolas de samba e blocos caricatos têm que ser valorizados. Tem que haver uma responsabilidade tanto do poder público quanto das empresas privadas. Senão, se começa a desvalorizar o que é feito aqui. Tem blocos aqui com qualidade, que não devem nada para quem vem de fora”.

Outro ponto levantado por ele é que ainda existem várias necessidades no evento que precisam ser resolvidas. “Por exemplo, vários blocos não têm lugar para ensaiar. Isso é um absurdo, uma festa que atrai tanto dinheiro, em que as empresas privadas são beneficiadas. Essa falta de estrutura para os blocos que, realmente, fazem a festa ao longo do ano todo, é uma das questões que têm que ser discutidas”.

Caetano questiona também que nos eventos fechados que acontecem durante o Carnaval na capital não há participação dos blocos daqui. “Isso eu acho uma vergonha, uma afronta. Tem que ter eventos privados. Mas quando se fala em Carnaval, tem que haver um equilíbrio. Essas empresas não estão interessadas em fomentar a cultura do Carnaval de rua de BH?”.

Trabalhar lado a lado


Em entrevista ao Estado de Minas, o organizador do Bloco Beagá na Folia, Bernardo Gregório, afirma que a intenção nunca foi atrapalhar o Carnaval de BH. “A gente agradece a preocupação da liga, acreditamos que é uma preocupação genuína. Mas, em momento nenhum a gente quer atrapalhar o Carnaval de Belo Horizonte. Viemos para somar.”

Gregório ressalta que é belo-horizontino. “Sou nascido e criado aqui, enraizado no Carnaval, desde o início trabalhando em prol desse acontecimento. Jamais passou perto da nossa cabeça, de qualquer forma, atrapalhar o Carnaval de BH”. Ele enfatiza que um dos pilares da folia belo-horizontina é a autenticidade e pluralidade. “Achamos que artistas nacionais só vêm para somar. Vai trazer mais público, mais patrocinadores, colaboradores, mais gente querendo investir e ajudar no Carnaval de BH. É um movimento, inclusive, muito bom para a cidade. Esse movimento é bom para todo mundo. Vai trazer visibilidade, aumentar o turismo, a quantidade de pessoas hospedadas em hotéis e trabalhando nas ruas da cidade”.

Gregório reforça que o bloco atendeu a todas as exigências para se cadastrar na Prefeitura de Belo Horizonte como qualquer outro. “Inclusive foi uma preocupação nossa trazer o Clayton & Romário que são artistas da cidade”. Ele acredita que os blocos podem trabalhar juntos para conseguirem patrocínios. “Somos todos de Belo Horizonte. Podemos ajudar a Liga, a Liga pode nos ajudar muito. Queremos trazê-los para perto e nos aproximarmos deles. Esse ano, isso só não foi possível porque foi uma correria muito grande. Como este foi nosso primeiro ano, a gente pode ter ficado um pouco distante, mas nosso interesse é trabalhar lado a lado com os blocos. Temos interesse de fortalecer o Carnaval”.