Renato Valentim e o outro lado da moeda de um imigrante vencedor nos EUA
O empresário saiu de Manhuaçu, em 1998, com o projeto de crescer profissionalmente nos Estados Unidos, e virou dono de rede de restaurantes e de time de futebol
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Siga noAs histórias de imigrantes brasileiros que vieram para os Estados Unidos são cheias de dramas, perrengues e muita humilhação. Alguns resistiram a tudo e a todos e conseguiram vencer. Outros desistiram no meio do caminho e voltaram ao Brasil, ou foram deportados por não terem conseguido o documento para viver legalmente no país, ou mesmo por ter se desiludido com o “sonho americano”. Mas existem casos de imigrantes bem sucedidos, que fizeram fortuna por essas bandas e que sentem o orgulho do que conseguiram. É o caso de Renato Valentim, que saiu de Manhuaçu, interior mineiro, não com o sonho, mas, sim, com a certeza de que tudo daria certo aqui.
“Sempre fui um aluno acima da média, e resolvi que iria para Boston, pois havia um amigo da minha cidade lá. Fui com visto de turista, mas assim que cheguei nos EUA, troquei para visto de trabalho e comecei a trabalhar em restaurantes. Fiquei um bom tempo para custear meus estudos e resolvi passar a trabalhar no setor imobiliário, alugando casas e apartamentos. Fui guardando o dinheiro que ganhava – gastava pouco –, pois tinha a ideia de ter meu próprio negócio”, revelou o empresário.
“Em 1998, quando cheguei, eu não falava inglês. Lavei muito prato nos restaurantes em que trabalhava. Como estava na área de restaurantes, resolvi fazer um curso de culinária, pois comecei a vislumbrar a possibilidade de ter meu próprio negócio. Após o curso e depois de estudar bastante o inglês, em 2004, conquistei uma estabilidade financeira e abri meu primeiro restaurante, o Tavern in The Square, em parceria com dois amigos. Aquela realidade que sonhei, quando saí de Manhuaçú, começava a se concretizar. Nosso empreendimento foi crescendo, caiu no gosto dos americanos, e começamos a abrir mais restaurantes. Atualmente, temos 23 unidades, espalhadas por Massachusetts, Connecticut e Rhode Island, onde vivem milhares de brasileiros”, revelou Renato.
O restaurante é daqueles que os americanos amam. Várias televisões espalhadas, com os canais de esportes daqui, cerveja gelada e comida de primeira. Todos vivem lotados e Renato e seus dois sócios controlam tudo do escritório em um prédio de três andares no centro de Boston. “As vezes eu chego no restaurante e sou barrado pelos seguranças. Quando eles ficam sabendo que sou um dos donos, vão me pedir desculpas e eu digo: de jeito nenhum, vocês apenas fizeram seu trabalho corretamente. Parabéns. Com tudo informatizado, a gente tem mais de 4 mil funcionários, e nossos gerentes nos fazem o relatório diário. Tudo funciona maravilhosamente bem, mas a gente trabalha todos os dias. Não largamos nosso empreendimento nas mãos de ninguém. Confiamos, mas exigimos o relatório diário”, afirmou o empresário.
Com todo o sucesso do empreendimento, a vida de Renato Valentim e seus sócios mudou radicalmente. Conforto, boa moradia e dinheiro no banco. O jovem que chegou aqui com a certeza de que seria bem sucedido, foi mesmo, e hoje é reconhecido no país como um homem de muito sucesso, que emprega imigrantes legais e americanos também.
O detalhe é que quando ele chegou, um garçon ganhava US$ 2,50 por hora. Atualmente, está na casa dos US$ 13, pois as gorjetas complementam o salário. Aqui, as gorjetas, que vão de 18% à 25%, já vêm incluídas nas contas. Renato se casou com a também brasileira Erilka, e é pai de Benjamim e Noah. Com os lucros dos restaurantes, o empresário expandiu seus investimentos para setores de construção e educação, mas como apaixonado pelo futebol, em 2014, resolveu se aventurar nos negócios esportivos.
Investindo no futebol
“Cheguei aqui há 27 anos e estou com 54 anos. Sei que o trabalho que fiz aqui no começo, a maioria dos americanos não faz. Nunca vi um americano lavando pratos em restaurantes. Como fiz curso de culinária e estudei administração de empresas, eu me preparei para a vida e tudo foi dando certo. Sempre fui um apaixonado pelo futebol, e, em 2014, resolvi, junto com o Palhinha, ex-jogador do Cruzeiro, fundar um clube em Boston, que não tinha uma equipe.
O Boston City FC se tornou realidade, mesmo sabendo que o futebol aqui não era tão popular. A paixão aqui é pelo futebol americano, basquete, beisebol e hóquei no gelo. O Palhinha foi meu sócio até 2018, e, além disso, ídolo”. Como o sócio foi investir em Portugal, Renato optou por abrir a filial de seu time na sua cidade natal. “Eu queria investir aqui, mas temos dificuldades de encontrar terreno em Boston. Então, resolvi investir primeiro na minha cidade, e dar oportunidades aos jovens da região. Temos uma estrutura fantástica lá em Manhuaçú e centenas de garotos jogando lá, treinando, tendo alimentação e estrutura física. Centro de treinamento moderno. Este ano, teremos o nosso time disputando o Módulo 2 do Mineiro, mas vamos chegar às séries B e A do Brasileiro num prazo de 10 anos”.
É sabido que nem todos têm a mesma “sorte” que Renato Valentim teve. Ele foi obstinado, dedicado, encarou frio, neve, mas não desistiu do projeto de vida que tinha. Como afirmou, ele não teve o sonho, mas, sim, a ideia de vir para cá e transformar em sucesso aquilo que havia planejado.
“Eu digo que o sonho americano é dos americanos. Eu vim pra cá disposto a vencer e realizar aquilo que planejei. Nunca falei em sonho americano e, sim, em realidade de um imigrante vencedor”. Amigo do presidente e dono do Cruzeiro, Pedro Lourenço, Renato está aqui para acompanhar o clássico, assim como esteve em Assunção, na final da Sul-Americana. Sua família chegou na noite de sexta-feira, pois segunda-feira é feriado aqui: Martin Luther King Day, e eles vão aproveitar os parques de Orlando. “Meus filhos têm 12 e 14 anos, e vou curtir alguns dias com eles e minha esposa aqui”, revelou.
Renato faz questão de contar sua história para incentivar brasileiros a virem pra cá, de forma legal, e conquistarem seu espaço também. “Já participei de outras reportagens, não por vaidade, mas sim para dizer aos jovens brasileiros que quando a gente quer e é determinado, a gente consegue. Só digo para virem para cá de forma legal, pois assim você terá oportunidades para crescer e se tornar um empreendedor. A dedicação diária e saber 'sofrer' fazem parte do processo”, conta o empresário.
“Depois de 27 anos, me sinto realizado, mas com muitos projetos para desenvolver. O futebol me encanta e quero dar oportunidades aos garotos da minha Manhuaçú e da região, para que possam se tornar jogadores profissionais, ganhar seu dinheiro e terem uma vida tranquila. O futebol proporciona isso de forma mais rápida e menos sofrida. Mas eu quero ser um exemplo de imigrante vencedor, pois a maioria das histórias contadas mostra sempre o lado sofredor e triste dos nossos imigrantes brasileiros. Se eu venci, todos podem vencer. Porém, foco diário, muito trabalho e visão de mundo e mercado”, acrescenta.