A convivência em condomínios costuma gerar conflitos quando um morador realiza obras em sua unidade e isso afeta a configuração do edifício ou o uso das áreas comuns. A decisão do Tribunal Provincial de Málaga, em 2 de julho de 2025, ilustra bem esse cenário ao reforçar que, em comunidades condominiais, a liberdade individual para reformar encontra limites claros nas regras coletivas previamente estabelecidas.
Por que o muro na vaga de garagem resultou em ordem de demolição
No caso julgado em Málaga, uma moradora construiu um muro entre sua vaga de garagem e o depósito, sem pedir autorização prévia à associação de proprietários. Em assembleia extraordinária de janeiro de 2020, a maioria dos condôminos decidiu exigir a remoção da obra em uma semana, sob pena de medidas judiciais.
O companheiro da proprietária, que a representava, reconheceu na reunião que não havia pedido autorização e chegou a concordar com a demolição. Mesmo assim, a condômina ajuizou ação para anular a decisão assemblear, mas o Tribunal de Primeira Instância nº 4 de Torremolinos rejeitou o pedido, tratando essa admissão como verdadeira confissão da irregularidade.

Como a Lei de Propriedade Horizontal foi aplicada ao caso espanhol
Ao confirmar a sentença, o Tribunal Provincial de Málaga ressaltou que o muro fechou o espaço entre garagem e arrecadação, ampliando a área útil da unidade e alterando, na prática, a planta do edifício. Isso foi enquadrado como modificação da configuração geral do prédio, o que exige autorização unânime ou, ao menos, aprovação expressa da comunidade, conforme o artigo 7.1 da Lei de Propriedade Horizontal.
A proprietária alegou tratamento desigual, apontando obras de outros vizinhos como exemplos de suposta tolerância seletiva. O Tribunal, porém, destacou que as intervenções citadas haviam sido previamente autorizadas pela diretoria da comunidade, afastando a comparação e reforçando a necessidade de seguir os procedimentos coletivos antes de qualquer alteração relevante.
De que forma o abuso de direito foi discutido na decisão espanhola
O Tribunal também analisou a acusação de abuso de direito, remetendo ao artigo 7.2 do Código Civil espanhol e à jurisprudência do Tribunal Supremo. Ficou claro que, para configurar abuso, é necessário demonstrar desvio de finalidade, dano injustificado e exercício anormal do direito pelos demais condôminos.
Para explicar esses requisitos, a decisão destacou que o abuso de direito pressupõe, em linhas gerais:
- existência de dano injustificado ao titular do direito;
- intenção de causar prejuízo ou uso anormal do direito conferido pela lei;
- exercício do direito em desacordo com sua função social e com a boa-fé.

Como casos semelhantes são tratados em condomínios no Brasil
No Brasil, situações de fechamento de vagas, anexação de depósitos e ampliação de áreas privativas também são comuns. A matéria é regulada principalmente pela Lei nº 4.591/1964 e pelo Código Civil, que exigem autorização em assembleia para intervenções que alterem fachada, estrutura ou partes comuns, respeitando o quórum previsto na convenção condominial.
Os tribunais brasileiros costumam reconhecer que obras que ampliam, na prática, a unidade em detrimento de área comum configuram violação aos direitos dos demais condôminos. Nesses casos, é frequente o ajuizamento de ação de obrigação de fazer para exigir a demolição da obra irregular, amparado em convenção, regulamento interno e, muitas vezes, em laudos técnicos que comprovam a alteração indevida.
Por que respeitar as regras do condomínio evita prejuízos e litígios
Na realidade brasileira, alegações de tratamento desigual e abuso de direito também aparecem com frequência, mas os tribunais exigem prova concreta de situações idênticas e não autorizadas para acolher tais argumentos. Quando o condomínio demonstra que obras anteriores foram aprovadas formalmente, prevalece o entendimento de que a exigência de demolição é exercício legítimo do poder de gestão, e não retaliação.
Em contextos coletivos como edifícios residenciais, seguir à risca a convenção, o regulamento interno e a legislação condominial é a melhor forma de evitar conflitos caros e longos. Se você pretende fazer qualquer obra em vaga de garagem, depósito ou área privativa que possa alterar estrutura ou uso comum, busque autorização formal em assembleia imediatamente, antes de construir: agir sem esse cuidado pode resultar em ordem judicial de demolição, custos elevados e forte desgaste com toda a vizinhança.




