Gabriel Martins, André Novais Oliveira, Maurilio Martins e Thiago Macedo Correa na sede da produtora filmes de plástico, no Bairro Floresta. Empresa nunca funcionou em Contagem -  (crédito: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)

Gabriel Martins, André Novais Oliveira, Maurilio Martins e Thiago Macedo Correa na sede da produtora Filmes de Plástico, no Bairro Floresta. Empresa nunca funcionou em Contagem

crédito: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press

 

Malute. O nome cala fundo ao cineasta André Novais Oliveira, de 39 anos. Era desta maneira que seu pai, Norberto, chamava sua mãe, Maria José. No longa “Ela volta na quinta” (2014) é possível perceber, na sequência em que o casal, tornado ator na maturidade por meio dos filmes do filho, dança ao som de Roberto Carlos: Malute sai da boca de Norberto.

 


Pois foi esta a homenagem que a Filmes de Plástico fez a sua atriz mais querida. Morta em 2018, Dona Zezé nomeia a distribuidora que está sendo lançada nos 15 anos da produtora mineira. Ontem (1/4), data do aniversário da empresa criada em 2009 por André, Gabriel Martins, de 36, Maurilio Martins, de 46, e Thiago Macêdo Correia, de 40, foi anunciada a criação da distribuidora Malute. Os três primeiros são diretores e roteiristas; o último, produtor.

 

Dona Zezé

Dona Zezé, que morreu em 2018, inspira "Se eu fosse vivo... vivia", o novo longa do filho, André Novais Oliveira, que começa a ser rodado no dia 1º de maio, no bairro Amazonas

Túlio Santos/EM/D.A Press/23/7/13

 


A partir de agora, os curtas e longas da Filmes de Plástico serão distribuídos por ela (eventualmente, com a participação de outras distribuidoras). O primeiro, que chega ao circuito comercial neste ano, é “O dia que te conheci”. Terceiro longa de André, é uma comédia romântica com Grace Passô e Renato Novaes.


Dia da Mentira

 

O aniversário no 1º de abril parece brincadeira, mas é sério. Foi no famigerado Dia da Mentira de 2009 que Gabriel e Maurilio Martins finalizaram o curta “Filme de sábado”, o “paciente zero” da Filmes de Plástico.

 

Decidiram, a partir dali, que aquele seria o dia da criação da empresa – o CNPJ que oficializou a empresa só viria três anos mais tarde, como o quarteto conta em encontro com o Estado de Minas, na sede da empresa na Floresta, Zona Leste de BH.

 

 


Com 25 curtas e longas, a Filmes de Plástico, que soma mais de 50 prêmios em festivais no Brasil e no mundo, é conhecida, tanto aqui quanto fora, como a “produtora dos filmes de Contagem”. Com população de 621 mil pessoas, segundo o censo de 2022, Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, é a cidade em que Gabriel, André e Maurilio cresceram – Thiago é de Teófilo Otoni.

 


Mas eles só vieram a se conhecer em Belo Horizonte, por meio do audiovisual – estudaram na Escola Livre de Cinema e na Universidade UNA. Ser produtora de Contagem, onde nunca tiveram sede, é outra questão, conforme explica Gabriel.

 


“O fato de não sermos de BH foi o ponto de união. Fui saber que o André era de Contagem, por exemplo, bem depois que a gente já tinha feito algumas coisas juntos. Brincávamos com a coincidência de sermos os três de lá, termos havaianas azuis, torcermos para o Cruzeiro e gostarmos do Radiohead”, conta Gabriel, diretor de “Marte Um”, o filme mais popular da produtora, representação do Brasil no Oscar de 2023.

 


A Contagem de André é a do Bairro Amazonas, que fica distante da Contagem de Gabriel e Maurilio (que são do Laguna e Milanez, vizinhos naquela cidade).

 

“A grande maioria dos nossos filmes é feita nos nossos bairros porque eles vêm desse olhar, que é muito carinhoso e respeitoso para os lugares de onde vivemos. Assim, as histórias são contadas por quem é destes lugares, pessoas que (até então) não eram muito retratadas”, comenta André, que sempre colocou a família em seus curtas e longas.

 


Gabriel acrescenta: “Contagem são vários bairros diferentes, e a gente só filmou o que equivale a uma porcentagem até pequena da cidade. Acho que se trata de um espírito de vivência, de mostrar um lugar meio periférico, uma ideia de cidade-dormitório. Quando a gente (a família dele) foi para Laguna, eu era criança, o bairro estava em formação, com estrutura meio de roça. Então, carrego um sentimento de construção, que vem de nossos pais irem para construir suas casas. Era o bairro onde era possível morar. A ideia de retratar a classe trabalhadora remete a esse espaço. Carregamos isto como identidade, como um desejo do tipo de histórias que queremos contar.”

 

Cena do filme Marte Um

"Marte Um", filme de Gabriel Martins, foi escolhido para representar o Brasil no Oscar 2023

Filmes de Plástico/divulgação


Intimidade

 

Para Maurilio, a relação entre as pessoas também faz muita diferença. “Você acaba sendo mais íntimo dos vizinhos. No início, foi fundamental para nós, porque era fácil produzir dentro de casa, chamar o seu vizinho. Os filmes já nascem provocativos com a ideia de cooptar o próximo. O Alcides, do curta 'Dona Sônia pediu uma arma para seu vizinho Alcides' (2011, de Gabriel), é literalmente meu vizinho de frente. Nunca foi obrigação (rodar um filme em Contagem), mas sempre foi um facilitador.”

 


Tampouco houve verba pública de Contagem nas produções da Filmes de Plástico, Thiago lembra. A história começou a mudar em janeiro, com o média-metragem “Quando aqui”, de André (que abriu a Mostra de Tiradentes, onde o cineasta foi homenageado), patrocinado pela prefeitura municipal.

 


“Governos anteriores não observaram que tinha uma produtora levando o nome da cidade para outros lugares. A gente retrata a cidade, e não existe nenhuma obrigação disso, mas se fazemos isto, por que ela não nos ajuda? Falo por nós, pelo Affonso (Uchoa, outro realizador local) e vários artistas que estão fazendo com que Contagem seja reconhecida como um lugar que é sinônimo de cinema”, afirma o produtor.

 

Cena do filme "O dia que te conheci"

"O dia que te conheci", filme de André Novais Oliveira, vai estrear em breve no circuito comercial

Filmes de Plástico/divulgação

 

 

GRANDE BH, ETERNO CENÁRIO DOS FILMES DA PRODUTORA

 


Em 1º de maio, a Filmes de Plástico começa a rodar seu novo filme, “Se eu fosse vivo... vivia”, quarto longa de André Novais Oliveira. Será uma história influenciada pela morte de sua mãe, a Dona Zezé. Mais uma vez, o pai do diretor, Norberto, fará o protagonista masculino. A atriz que viverá sua parceira de cena é mantida em segredo.

 


“Traz uma mistura de gêneros, desde a ficção científica com um pouco de realismo fantástico. Parte da história pessoal, do luto pela minha mãe”, conta ele.

 


Desta vez, André não quis filmar na casa dos pais, em Contagem. Havia casas em toda a Grande BH para locação da história, mas o local escolhido foi também uma residência no Bairro Amazonas, onde vive a família Novais Oliveira. O longa anterior de André, “O dia que te conheci”, chega aos cinemas nos próximos meses.

 


Outro projeto em curso é o de “O último episódio”, primeiro longa solo de Maurilio Martins. Em fase de finalização, com previsão de lançamento para 2025 (com distribuição pela recém-criada Malute com a Embaúba, outra distribuidora mineira), será a “Sessão da tarde” da Filmes de Plástico.

 

“Caverna do dragão”

 

Foi também rodado em Contagem, no Bairro Laguna, e remete muito ao início da adolescência do próprio diretor e roteirista.

 


A narrativa é ambientada em 1991, e acompanha três amigos. O protagonista, Erick, para tentar se aproximar da menina de quem gosta, fala para ela que tem o último episódio da “Caverna do dragão” (série de animação lançada em 1983 com três temporadas; no Brasil, ficou popularíssima quando se tornou uma das atrações do “Xou da Xuxa”, na Globo).

 


“Esse filme acompanha quase dois meses em que os três tentam fazer esse episódio”, conta Maurilio, acrescentando que o longa é sobre os “sabores e dissabores” de ser adolescente naquele cenário e no Brasil da hiperinflação. “Acho que é o meu modo de emular uma adolescência na periferia”, comenta ele.

 


Outras referências são os longas-metragens “Conta comigo” (1986), “Meu primeiro amor” (1991) e a série “Anos incríveis” (1988-1993).

 


Já Gabriel Martins está às voltas com seu primeiro longa desde “Marte Um”. Projeto acalentado há uma década, “Vicentina pede desculpas” é também história que parte da perda. “A personagem se envolve com um acidente de ônibus em Belo Horizonte. Vamos acompanhá-la vivendo de alguma forma esse luto”, conta ele, que deve começar a filmar em setembro.

 


Ainda neste ano, a Filmes de Plástico dá início à produção da série “Natal do Silva”, criada para o Canal Brasil, que deve ser lançada no Natal de 2025. Gabriel é o criador e seus parceiros na produtora vão dirigir alguns episódios.

 

 


FILMES DE PLÁSTICO NO STREAMING

LONGAS

 

• “Marte Um” (2022), de Gabriel Martins (Globoplay)


• “A felicidade das coisas” (2021), de Thais Fujinaga (Embaúba Play)


• “No coração do mundo” (2019), de Gabriel Martins e Maurilio Martins (Embaúba Play)


• “Temporada” (2018), de André Novais Oliveira (Netflix)


CURTAS*

 

• “Nossa mãe era atriz” (2023)


• “Rua Ataléia” (2021)


• “Nada” (2017)


• “Constelações” (2016)


• “Rapsódia para o homem negro” (2015)


• “Quintal” (2015)


• “Quinze” (2014)


• “Mundo incrível remix” (2014)


• “Pouco mais de um mês” (2013)


• “Dona Sônia pediu uma arma para seu vizinho Alcides” (2011)


• “Domingo” (2011)


• “Contagem” (2010)


• “Fantasmas” (2010)


• “Pelos de Cachorro” (2010)


• “Gabriel Shaolin Mordock” (2009)


• “No final do mundo” (2009)


• “Filme de sábado” (2009)

 

* Disponíveis no canal Filmes de Plástico, do YouTube