Integrantes do coletivo Floresta de Cristal ocuparam as ruas paulistanas vestidos como animais e plantas do Brasil -  (crédito: Cobogó/Reprodução)

Integrantes do coletivo Floresta de Cristal ocuparam as ruas paulistanas vestidos como animais e plantas do Brasil

crédito: Cobogó/Reprodução

Nas manifestações políticas paulistanas de 2021 e 2022, chamava a atenção um grupo de pessoas fantasiadas de fauna e flora, defendendo os direitos da natureza. A performance partiu do coletivo Floresta de Cristal, concebido pela artista visual Rivane Neuenschwander e a cineasta Mariana Lacerda.

 

O livro “Reviravolta de Gaia” (Cobogó) traz 132 imagens fotográficas daqueles momentos, além de entrevistas e ensaios sobre arte, performance e a disputa política vivida no Brasil antes das eleições de 2022.

 

Verbetes assinados pela pesquisadora e professora Sabrina Sedlmayer explicam os temas em pauta e os dizeres dos cartazes levados às ruas. É como um guia para a compreensão daquele momento.

 

 

Faltando pouco para as eleições de 2022, Rivane Neuenschwander e Mariana Lacerda sentiram o risco da ruptura democrática se aproximando. Decidiram agir. O coletivo ocupou as ruas e se posicionou contra o governo Bolsonaro, cuja pauta principal, na visão dos integrantes, era a destruição do meio ambiente, das conquistas sociais e da cultura.

 

“A ideia da Reviravolta de Gaia vem de uma confluência de leituras, conversas, encontros, mas, sobretudo, da necessidade de interromper a ideia comum e por tantos anos cara à antropologia de que são apenas os seres humanos que produzem cultura”, explicam Mariana e Rivane, que responderam conjuntamente, por e-mail, às perguntas da reportagem.

 

“Hoje, até mesmo a ciência mais ocidentalizada reconhece que a natureza, também ela, produz cognição e subjetividade. Nos perguntávamos então: como seria caso esses seres 'se levantassem', no sentido de levante, revolta, reviravolta?”, diz a dupla.


Marco Temporal

 

No ateliê de Rivane, em São Paulo, colaboradores se reuniam para criar e repensar a estética dos movimentos políticos. “Nossa primeira tentativa foi a de povoar as ruas com a pauta ecológica e a situação dos povos indígenas, chamando a atenção para a aberração constitucional que é a tese do Marco Temporal, que ainda sofre toda sorte de sequestro, maracutaia e brecha jurídica”, afirmam as autoras.

 

“Nossa Floresta, ciente de seu encantamento formal e emanando a força de um coletivo, se posicionava claramente em relação à demarcação das terras indígenas e à preservação ambiental, ao mesmo tempo que denunciava as funestas margens de lucro das grandes corporações, nacionais e internacionais”, continuam.

 

Depois do sucesso da primeira intervenção, o coletivo participou de mais oito manifestações públicas em São Paulo, denunciando o risco da ruptura democrática.

 

“Acreditávamos que o projeto como um todo pudesse agregar às discussões mais refinadas sobre a reinvenção estética dos atos convocados pela esquerda. E isso passa pela dinâmica dos grupos, a transmissão das mensagens, a amplitude dos gestos, a forma mesmo de como se movimentam os corpos nas ruas: em marcha? Em círculos? Infiltrados? Juntos?”


União e afeto

 

Além de buscar organizar um pensamento político, o coletivo ofereceu acolhimento para aqueles que se sentiam ameaçados pelas incertezas sobre o futuro do país. “Nos reuníamos periodicamente no ateliê para nos apoiarmos mutuamente, para somarmos as diferentes lutas, para nos nutrirmos de afeto, pintar os enunciados e, efetivamente, tentar virar votos. Como posteriormente vimos, cada voto virado foi de extrema importância”, comenta a dupla.

 

O livro “Reviravolta de Gaia” registra um momento importante da história do país. “Esse foi o nosso modo de experimentar uma linguagem outra, aumentando a fricção semântica e simbólica das ruas, durante o tenso ano que antecedeu as cruciais eleições de 2022 no Brasil”, concluem Rivane e Mariana.

 

“REVIRAVOLTA DE GAIA”


• De Mariana Lacerda e Rivane Neuenschwander
• Editora Cobogó
• 240 páginas
• Preço sugerido: R$ 168