Na última década, as taxas médias reais de crescimento dos gastos previdenciários foram nos municípios, estados, INSS e União, de 12,5%, 5,9% 5,1% e 3,1%, respectivamente -  (crédito: MARCELLO CASAL JUNIOR/AGÊNCIA BRASIL)

Na última década, as taxas médias reais de crescimento dos gastos previdenciários foram nos municípios, estados, INSS e União, de 12,5%, 5,9% 5,1% e 3,1%, respectivamente

crédito: MARCELLO CASAL JUNIOR/AGÊNCIA BRASIL

 

Jogando luzes sobre o que tem ocorrido com os municípios, a dramática constatação que se faz hoje é de que a grande maioria desses entes está literalmente quebrada, por terem as despesas correntes respectivas navegado em uma trilha de crescimento muito mais elevado do que o das receitas, destacando-se o que ocorre com o item “previdência”. O principal vilão dessa história toda se chama, assim, déficits previdenciários públicos explosivos, e, assim, “destruidores” do espaço para investir e, por consequência, de fazer o país crescer economicamente...

 

Cabe ressaltar que, na última década, as taxas médias reais de crescimento dos gastos previdenciários foram nos municípios, estados, INSS e União, de 12,5%, 5,9% 5,1% e 3,1%, respectivamente, enquanto o PIB crescia apenas algo entre 1% e 2%. Essa é uma situação obviamente muito difícil de administrar. Ou seja, o forte crescimento desses gastos forçou os gestores públicos a direcionar apenas recursos residuais para investimento (ou seja, para gastos em infraestrutura) e “outras despesas correntes (custeio)”, após a cobertura dos super rígidos novos gastos relacionados com previdência e com as tradicionais “vinculações” de receita (como em saúde e educação), e outras formas de rigidez impossíveis de evitar a curto prazo (como no caso de gastos com o pessoal “ativo”, com assistência social e com os demais gastos obrigatórios por lei). Entre 2010 e 2022, a taxa média de crescimento da taxa de investimento em infraestrutura (razão investimento/PIB) de todos os entes públicos situou-se em -6,8% a.a. Enquanto isso, a taxa média móvel de 12 anos de crescimento do PIB caía 0,1% nesse mesmo período.

Quando esse tipo de conta não fecha bem, o que se faz é deixar de pagar o que não tem outro jeito de administrrar, e “vamos em frente...” Nessas condições, os municípios estão hoje com uma enorme dívida com precatórios, de cerca de R$ 200 bilhões, e uma dívida ainda maior com o RGPS (250 bilhões), pois todos os municípios contribuem para o regime geral. Quando a conta não fecha, deixa-se de pagar o que se pode jogar para a frente, acumulando dívida com o regime próprio (algo hoje ao redor de R$ 48 bilhões), menos do que se faz em relação ao regime geral, pois nem todos têm regime próprio, mas todos têm o regime geral.

Os compromissos junto ao regime próprio são os últimos que se deixam de pagar, pois estão ali do lado, sabe-se que vai haver reclamação pesada junto ao prefeito ou ao tribunal de contas, e só em ultimo caso se deixa de pagar essa conta. São essas, assim, as três despesas que empurram “a nave” para a frente: precatórios, RGPS e RPPS. A última instância é atrasar os pagamentos aos prestadores de serviços – ou seja, fazer mais “restos a pagar,” com o cuidado de não atrasar muito, pois há o risco de a outra parte parar de prestar o serviço, como no caso de não mais fazer limpeza urbana, fornecer equipamentos, medicamentos etc. Somando aquelas três dívidas e arredondando, dá algo ao redor de R$ 500 bilhões, algo obviamente nada desprezível.

Essa discussão começou a surgir a partir de uma iniciativa do Congresso Nacional motivada, por previsíveis pressões de prefeitos em busca de desonerar a folha do regime geral nos municípios, aproveitando o projeto que prorrogava a desoneração da folha de diversos setores econômicos. Foi no final de 2023, então, que os municípios se mobilizaram, em vista da dificílima situação que viviam, já que não conseguiam cobrir seus déficits fiscais via emissão de títulos e acabavam ficando a descoberto.

Com estados, essa história não é muito diferente, pois eles também têm problemas com precatórios, embora em menor escala, o mesmo acontecendo com o regime geral, porque, ali, só há os comissionados e os temporários. Por último, há os regimes próprios, em relação aos quais o problema dos estados pode até ser mais sério que o dos municípios, por conta de uma situação previdenciária explosiva (como no caso de Minas Gerais), mas em outros, não (porque têm mais receitas próprias que os municípios, ou seja, eles dependem menos de transferências da União).

Os municípios são responsáveis principais e em maior escala pelo financiamento de políticas nas áreas de saúde, educação e assistência social, políticas essas protegidas por vinculações de receitas públicas (em que percentuais fixos sobre as principais receitas de natureza tributária são destinados obrigatoriamente a tais segmentos). Em adição, pagam 22% de contribuição sobre a folha de pagamento de contribuição patronal. (Na próxima coluna voltarei ao tema, onde mostrarei várias incongruências e as principais saídas para livrar os entes da enrascada em que estão metidos ).