Está embutido no regime de repartição simples a tendência inexorável ao descasamento entre o ritmo de crescimento do número de contribuintes e do de beneficiários -  (crédito: Leandro Couri/EM/D.A Press – 18/9/20)

Está embutido no regime de repartição simples a tendência inexorável ao descasamento entre o ritmo de crescimento do número de contribuintes e do de beneficiários

crédito: Leandro Couri/EM/D.A Press – 18/9/20

Demorou a surgir no radar a adoção de regimes previdenciários públicos de capitalização, solução ideal do problema previdenciário que deveria há muito ter sido usada pelos gestores, em que contribuições de servidores e dos entes públicos são recolhidas e aplicadas em fundos, para serem retiradas como aposentadorias e pensões vários anos e por um certo tempo à frente, e sem haver, em condições normais, qualquer impacto líquido adicional desfavorável sobre as contas públicas.

Já as contribuições convencionais de servidores públicos ao grande número de regimes próprios de “repartição simples” que ainda hoje prevalecem majoritariamente no país, se iniciaram como se fossem meras receitas correntes a engrossar os caixas dos entes e, portanto, um tributo qualquer. Nesse último caso, o valor dos benefícios não decorre do resultado de uma aplicação, mas tem seu cálculo especificado em uma regra legal. Daí a déficits previdenciários anuais sistemáticos é só um passo. Paralelamente, acumulam-se passivos atuariais que, em nosso caso, tendem a ser expressivos, e se definem pelo valor presente dos déficits financeiros anuais com base em uma taxa de juros adequada.

Nos regimes próprios de repartição simples, cabe aos patrocinadores cobrir as necessidades crescentes de caixa decorrentes da gestão previdenciária a partir de quando elas começam a surgir, o que nos leva ao grande drama dessa estória. Aqui, cabe lembrar que está embutido no regime de repartição simples a tendência inexorável ao descasamento entre o ritmo de crescimento do número de contribuintes e do de beneficiários, este último sempre mais intenso, daí surgirem déficits crescentes. Isso se dá por conta de vários fatores, entre eles transformações demográficas como a de que as pessoas estejam vivendo cada vez mais e, assim, recebendo benefícios por mais tempo, algo não previsto à época da definição da fórmula de cálculo daqueles.

Penso que, ao governo Lula, falta o correto entendimento da dinâmica previdenciária e sua ligação com o problema macroeconômico brasileiro, daí a falta de disposição para enfrentar desequilíbrios previdenciários de elevada magnitude como os que existem em nosso setor público, conforme venho indicando neste espaço, o que exigiria a zeragem de altíssimos déficits atuariais, enfrentamento esse que sempre enfrenta muita resistência, não importando que tal exigência tenha inclusive virado matéria constitucional (Emenda 103/19), cuja aprovação Lula herdou de gestões anteriores. Dito de outra forma, passado o primeiro ano do atual governo, vê-se que a principal causa da derrocada dos investimentos públicos em infraestrutura e da resultante desabada da taxa de crescimento do PIB, ou seja, o desequilíbrio previdenciário, continua por aí firme e forte a exigir solução rápida e decisiva.

É nesse mesmo contexto que carrego nas minhas andanças vários gráficos que Lula precisaria ver. O primeiro traz a evidência da alta correlação entre investimento em infraestrutura e crescimento do PIB desde o início dos anos 70. Ou seja, sem um, o outro não acontece. (Isso, aliás, para quem, como ele, vive criando PACs, não deveria haver muitas dúvidas).

Com base em variáveis medidas em percentual do PIB, o segundo gráfico mostra a desabada chocante do investimento de origem pública em infraestrutura no mesmo período, que caiu não menos que 8 vezes mesmo medido em % do PIB, enquanto a razão investimento privado/PIB oscilava levemente em torno da média de 1%. Ou seja, o problema está no âmbito público e cabe, portanto, a ele resolvê-lo. E, assim, é de se esperar que, para onde o público for, o privado irá junto.

O terceiro gráfico, na verdade, é um conjunto de gráficos da despesa pública que mostra a maior disparada ocorrendo no item previdência municipal, depois na estadual e, finalmente, na federal. O gráfico fecha com a desabada dos investimentos, já citada. Ou seja, explodem uns e desabam o outro, e, na sequência, o PIB. Tão simples quanto isso, lembrando que o problema extrapola o âmbito federal. O que fazer? Zerar os déficits atuariais de todos, e ponto final.

Sendo piauiense, tenho sempre em mente o ajustamento do problema previdenciário que ajudei a implementar, em uma primeira fase, na recente gestão do Ministro Wellington Dias, à época como governador estadual. Neste momento, dedica-se à segunda parte da tarefa o novo governador, Rafael Fonteles. Diante da gigantesca dimensão (e, portanto, importância) do problema dos entes subnacionais, torna-se necessário criar uma linha de frente pró-ajuste, que deveria ser coordenada, em nome de Lula, pelo Ministro Wellington, alguém que acaba de adquirir a experiência necessária para dar cabo dessa difícil tarefa.